O sócio n.º 311 da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra que anteontem e ontem encheu os ecrãs das televisões e várias páginas de jornais diz que não agrediu nem quis agredir Mário Soares e assegura que apenas aproveitou a oportunidade que nunca tinha tido para lhe dizer o que lhe fazia “rebentar a alma”, numa alusão à acusação de que Soares “é um vigarista”, como disse no domingo.
“Isto já andava aqui encravado na garganta desde 1975, de modo que, mal o apanhei pela frente, desabafei”, disse ao Correio da Manhã Augusto Rodrigues da Silva, carpinteiro, de 63 anos de idade. Mostrando-se “tranquilo” e consciente de que “disse aquilo que muitos milhares de portugueses gostavam de ter dito”, Augusto Silva lembrou as agruras que passou enquanto combatente e o facto de, em 1975, ter sido “expulso” de Angola e obrigado a deixar tudo o que lhe pertencia.
“Eu lutei pelo meu País, não fui para a Bósnia ou para o Afeganistão ganhar 500 contos por mês e depois fui, como tantos outros, votado ao esquecimento por todos os governos, mas muito especialmente por esse senhor que deu o que nos pertencia como quem dá uma camisa”, afirmou este antigo combatente.
Lembrando que foi metido num avião, em 1975, com a mulher e dois filhos, um de três anos e outro de seis meses, com apenas dois mil escudos no bolso, disse que nunca há-de perdoar a quem permitiu que estas coisas acontecessem.
“Eu lutei três anos, entre 1963 e 1966, no Norte de Angola e, após o cumprimento do serviço militar, arranjei um emprego e trabalhei nove anos numa empresa na mesma região. Ao fim de tudo isto, deram-me um pontapé e mandaram-me desenrascar”, referiu Augusto Silva.
STRESS DE GUERRA
O homem que no domingo chamou “vigarista” a Mário Soares diz que não tem medo e que apenas disse a verdade. Quanto às ameaças de que poderá ser alvo de um processo-crime, afirma-se “de consciência plenamente tranquila”.
“Eu não agredi ninguém e apenas manifestei o meu repúdio pelo mal que esse senhor fez a mim e a muitos milhares de portugueses que estiveram na guerra e trabalharam nas ex-colónias”, explicou.
Fonte da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra (APVG) disse ao Correio da Manhã que Augusto Rodrigues da Silva sofre de stress pós-traumático e, “como muitos outros, devia ser alvo de acompanhamento psíquico”.
Quanto ao incidente de anteontem, Gabriel Rodrigues, da APVG lamentou o ocorrido, sublinhando que “é com muito custo que instauramos um inquérito, que pode levar à expulsão, a um associado activo, que raramente faltava a uma manifestação em Lisboa”.
DETALHES
COMBATENTE
Augusto Rodrigues da Silva esteve na linha da frente, no Norte de Angola, entre 1963 e 1966. Era militar de Infantaria, especialidade de atirador.
STRESS
Os três anos de guerra e os nove que trabalhou em zona de conflito não perdoaram. É um dos que sofrem de stress pós-traumático de guerra.
TRANQUILO
“Quem esteve três anos na guerra não tem medo dos tribunais. Estou tranquilo.” É o que diz Augusto Silva perante a ameaça de um processo-crime.
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