(Aos soldados, marinheiros, classe operária e povo trabalhador)
1. O processo iniciado em 25 de Abril de 1974 chegou ao momento da verdade, ao momento do avanço decisivo para o socialismo. É certo que até agora foram vibrados duros golpes no poder da burguesia e foram dados passos importantes no sentido da organização autónoma da classe operária e do povo trabalhador. As nacionalizações, o começo da reforma agrária, as experiências de controlo operário e o avanço do poder popular constituem as principais conquistas das massas trabalhadoras nesta fase do processo. Tudo isto, no entanto, não representou a destruição do capitalismo, nem a criação do poder dos trabalhadores.
É assim que a burguesia pode tomar conta do Conselho da Revolução, do VI Governo e do MFA. (...)
2. A partir do momento em que o desenvolvimento do processo português tornou claro o falhanço das sucessivas tentativas da burguesia para recuperar o controlo da sociedade portuguesa, através de soluções conciliatórias falsamente favoráveis às classes trabalhadoras, tornou-se obsessiva, para o poder instituído, a construção de um aparelho repressivo capaz de substituir, pela força, a falta de apoio das massas populares.(...)
3. A alternativa revolucionária para a crise é a que assenta no papel determinante das massas populares, da classe operária e dos soldados, é a que ultrapassa a direcção conciliatória existente até agora, pela afirmação duma direcção política revolucionária, expressão da capacidade das massas em construírem o socialismo, isto é, o seu poder e a sua sociedade, e em construírem o braço armado, que os levar à vitória final, o exército revolucionário.
A saída para a crise está pois na construção dum poder revolucionário assente num programa de unidade revolucionária, que se baseie nas ideias expressas no Documento do COPCON.
A natureza revolucionária do poder só se demonstra na prática, pelo que tornar a Assembleia Popular Nacional uma realidade, exige:
- O rápido reforço dos órgãos de Poder Popular de base já existentes: Comissões de Moradores, Comissões de Trabalhadores, Conselhos de Aldeia e Comissões de Soldados e Marinheiros; (2)
- A pronta constituição destes órgãos onde não existam.
- A coordenação dos órgãos de Poder Popular de base através de Assembleias Locais e Regionais.
Este conjunto de acções terá de ser obra dos próprios trabalhadores, competindo ao Poder do Estado abrir o espaço para o seu desenvolvimento, apoiando inequivocamente os trabalhadores e proporcionando-lhes as condições necessárias.
Para além disto o poder só será legitimamente revolucionário desde que assuma o objectivo imediato de colocar a economia ao serviço do povo trabalhador, liquidando o desemprego e a subida do custo de vida, o que exige:
- Criar condições para a construção do controlo operário sobre a produção, o que significa que toda a economia (fábricas, oficinas, bancos, comércio, etc.) terá de ser controlada directamente pelos trabalhadores através dos órgãos do Poder Popular;
- Criar condições para que a reforma agrária seja estendida a todo o país, baseando-se nos seguintes princípios: (...)
- Assegurar uma política de independência nacional através de: (...)
Perante o Governo e as forças de direita em geral, que recorrem a actos de desespero e de pirataria, que podem conduzir o país à guerra civil ou à intervenção estrangeira feita pelo Imperialismo, os trabalhadores, os soldados e os militantes revolucionários têm que encontrar o seu próprio caminho para a tomada do poder.
E esse caminho tem de ser o da organização autónoma dos trabalhadores das fábricas e dos campos para a construção e o fortalecimento do Poder Popular. Mas o Poder Popular nunca será verdadeiramente poder se não for armado. Os trabalhadores só serão capazes de conquistar o poder e de o aguentarem nas mãos se estiverem armados, se tiverem a força organizada do seu lado.
E é da conjugação dos trabalhadores armados com os soldados que estão nos quartéis, que nascer o largo movimento e a vanguarda que pode fazer frente à burguesia e ao Imperialismo.
Só o armamento dos trabalhadores e a sua organização com os soldados, formando um exército revolucionário, pode impedir a organização da burguesia e o perigo de intervenção estrangeira.
É neste movimento e nesta vanguarda que tem de basear-se o novo poder. Para nós oficiais, que procuramos ser coerentes com um projecto revolucionário, a única garantia de revolução socialista autêntica é a de que efectivamente o poder estar nas mãos dos trabalhadores, não nas mãos de qualquer partido ou força política.
É da base e para a base dos trabalhadores, que o poder tem de vir e tem que ir.
Para nós, oficiais que procuramos ser coerentes com um projecto revolucionário, a vanguarda está nos trabalhadores e nos soldados. Não admitimos mais golpes de Estado, venham eles de onde vierem, fabricados pelos oficiais nas costas dos trabalhadores. Não admitimos mais conspirações de gabinete, alheias à organização dos trabalhadores e dos soldados. Não admitimos mais as manobras dos políticos, que fazem dos trabalhadores, das suas manifestações e movimentações, a força com que argumentam à mesa das negociações, à mesa dos pactos.
Nós estamos com o Poder Popular Armado, com os Soldados, com os militantes revolucionários, até à vitória final, até à tomada do poder.
- VIVA A REVOLUÇÃO SOCIALISTA
- VIVA O PODER POPULAR ARMADO
- OFICIAIS REVOLUCIONÁRIOS, COM OS SOLDADOS, OS OPERÁRIOS E OS CAMPONESES
- UNIDOS VENCEREMOS
Os subscritores (3)
Ten-Cor. Cav.ª João Bilstein Sequeira (DAC); Maj. Adm. Mil. Queirós de Azevedo (EPAM); Major Cav.ª Mário Tomé (RPM); Major F.A. Barroso; Maj. Art.ª Manuel Borrega (RAC) Cap. Art.ª Rosado da Luz (DMF Almada); Cap. Cav.ª Carlos Matos Gomes (DAC); Cap. Adm. Mil. Mendonça da Luz (DSA); Cap. Mil.º/F.A. Moreira da Luz (A. M.); Cap. Eng.ª Cabral e Silva (RE n.º1); Cap. Adm. Mil. Durand Clemente (EPAM); Cap. Eng.ª/FA Jorge Alves; Cap. Eng.ª /F.A. Nuno Ferreira; Cap. Mil.º Cav.ª Mendonça de Carvalho; Cap./F. A. Sobral Costa (GDACI); Cap. Santos Silva (SDCI); Ten. Mil.º Matos Pereira (GNR); Ten. Cav.ª Mário Rodrigues (RPM).
Notas:
(1) Texto datado de 20-11-1975 e publicado no “Diário Popular” no dia seguinte. Este vespertino era dirigido por Jacinto Batista e na sua redacção, chefiada por Abel Pereira encontravam-se além de outros, Adelino Cardoso, José Eduardo Moniz, João Alves da Costa, Nuno Vasco, Pacheco de Andrade e Urbano Carrasco.(...)
O manifesto foi lido por um dos subscritores, na manifestação promovida, em 20-11-1975, pela União dos Sindicatos da Cintura Industrial de Lisboa, num varandim dos jardins do Palácio de Belém (Praça Afonso de Albuquerque) e na presença do Presidente da República, então General Costa Gomes.
(2) Propunham fazer uma aproximação ao sistema revolucionário montado por Fidel de Castro, em Cuba, em 1960. (Ver: “Os Comités de Defesa da Revolução”. Lisboa, Iniciativas Editoriais, 1975, pp 14 e 15). Estas Comissões pretendiam ser uma cópia dos “Comités de Defesa da Revolução” cubanos, montados nos bairros, empresas e aldeias. Só que estes revolucionários portugueses não terão percebido que já lá existia um Exército da confiança do líder da Revolução e, em Portugal, as Forças Armadas estavam completamente divididas e tinham sofrido um processo de desgaste e degradação, desde o 28 de Setembro de 1974.
(3)Curiosamente nenhum dos subscritores era de Infantaria (QP), a Arma do Exército com maiores efectivos. Destaques no texto feitos pelo autor.
In "Memórias da Revolução" de autoria do Coronel Manuel Amaro Bernardo. Se desejar adquirir : 00351.213.143.378
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NOTA:
Reparem nos nomes que aqui aparecem.
Fernando Gil
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