A FORÇA DA RAZÃO
Quem tem medo de Dom Jaime P. Gonçalves?
João Baptista André Castande
Aquilo que nos diferencia é parte da diversidade que caracteriza o povo moçambicano do Rovuma ao Maputo.
Diversidade, em si, não significa divisão.
Só é causa de divisão quando perdemos de vista o que é principal. Neste caso, o que é principal é a unidade nacional, é a consciência e o orgulho de sermos moçambicanos, é o nosso amor à pátria, é a nossa vontade comum de servirmos o povo a que pertencemos. - Samora Moisés Machel, Dezembro de
1982, no discurso de encerramento da reunião com representantes das várias confissões religiosas
então existentes em Moçambique.
1. O Arcebispo da Beira, Dom Jaime Pedro Gonçalves, parece possuir um domínio invejável do Estado de Direito que nós concebemos e defendemos, cuja interpretação descarta de argumentos credíveis a todos os que o queiram atacar ou contrariar, obrigando-os assim a recorrerem à simples falácia.
2. Para justificar esta minha percepção, aqui deixo ficar as minhas quatro dúvidas de cujos esclarecimentos aguardo com muita ansiedade:
a) - Porquê pedir, insistentemente, que Dom Jaime divulgue o nome da formação política em que vota (vide página 16 do semanário SAVANA de 03/09/O4), quando o artigo 107 da Constituição da República de Moçambique estabelece expressamente que o voto é secreto e pessoal?
b) - Se nos termos do artigo 9 da Constituição da República de Moçambique o Estado é que se declara laico, enquanto que em nenhuma parte do texto da citada constituição as confissões religiosas ou o prelado declaram-se apolíticos, perguntase: porquê diabolizar (passe o termo) a pessoa do governador da província de Sofala, Felício Pedro Zacarias - vide página 32 do semanário Domingo de 05/09/04 -, a ponto de imaginá-lo a entrar na igreja contra a consagração constitucional em referência?
c) - Ora, estabelecendo os números 2 e 3 do artigo 9 da constituição da República de Moçambique
que a acção das instituições religiosas conforma-se com as leis do Estado e que o Estado valoriza as actividades das confissões religiosas visando promover um clima de entendimento e tolerância social e o reforço da unidade nacional, questiona-se: que mal faz Dom Jaime Pedro Gonçalves ao recordar-nos que a resolução dos nossos problemas tem que ser na base do diálogo comunicativo, da tolerância social e das leis vigentes, via esta que é igualmente defendida no ponto número 2.3. do programa do partido
FRELIMO? Infelizmente não conheço os programas das demais formações políticas.
d) - “As igrejas desempenham um papel importante na formação ética dos seus crentes. Em particular, cabe-lhes o papel de promover o reforço da unidade nacional, o desenvolvimento do amor pela pátria, a
elevação do espírito patriótico, o combate ao racismo, ao tribalismo e ao regionalismo” , dizia ainda Samora Machel no discurso supracitado.
Ora, porquê pretender hoje que o prelado fique confinado às quatro paredes do templo, perante os problemas sociais aqui referidos por Samora Machel?
3. Todavia, e salvo o devido respeito, julgo que o fanatismo político-partidário não é sinónimo do patriotismo que Samora Machel sempre procurou ensinar-nos.
4. “Por errados que sejam os caminhos que por vezes se tenham seguido, qual o homem e sobretudo qual cristão e qual sacerdote poderá ficar surdo ao grito que sobe das profundezas e que no meio de um Deus justo invoca justiça e espírito de fraternidade? Claro está que um sacerdote, pelo seu carácter e
pelas suas convicções, deverá agir como elemento moderador e esclarecedor. Mas isto não significa nem alheamento nem indiferença.
É Pio XII quem disse que é preciso lutar e destruir esta mentalidade, hoje tanto em voga, que quer confiar a presença e a acção da igreja às quatro paredes frias de uma sacristia” - Padre Joaquim da Rocha Pinto de Andrade, Junho de 1970.
5. Contra a doutrina segundo a qual as leis não perdem o valor obrigatório pelo seu desuso, chegam ao ridículo de citar textos constitucionais inexistentes sei lá para justificar o quê...
Julgo que os nossos dirigentes merecem assessoria jurídica competente e honesta!
6- Afinal quem é que tem medo de Dom Jaime Pedro Gonçalves?
P.S:
1 – Sempre estive contra o mau hábito de acumulação de dois, três e mais cargos pelas mesmas pessoas, num país em que muitos cidadãos navegam no desemprego.
Por isso, felicito a decisão do magnífico reitor da UEM, Professor Doutor Brazão Mazula.
2- Aliás, julgo que desta feita o Doutor Eduardo Namburete irá dispor de mais tempo para o exercício
pleno das funções dos três cargos que ainda detém.
3- Por outro lado, a cessação do exercício de determinadas funções no aparelho de Estado é um acto que
devemos encarar com normalidade!...
CM(Maputo) - 13.09.2004