"Projecto da UNITA é melhor. Aliciemos, também, os do MPLA"
O Folha 8 apresentou, na edição nº 733, a primeira parte da entrevista, com Lukamba Paulo Gato. Havia ficado combinado a sua continuação na 734, mas razões de ordem técnica, impediram o seu cumprimento. Pelo facto, pedimos as nossas sinceras desculpas. Mas como prometido é devido e depois de normalizada a situação eis a visão de um homem, que após a morte de Jonas Savimbi, teve, na qualidade de secretário-geral do partido, o leme do Galo Negro. Perdeu-o, quando ousou democratizar, um projecto conservador, sem saber, ele mesmo, com que lianas se iria coser. Mas, igual a si mesmo e sempre pronto aos riscos do desafio, ousou lançar a toalha ao ringue. O resultado é por demais conhecido e aqui não é chamado. Mas, reconheçamos, Lukamba Paulo Gato continua a ousar caminhar na primeira pessoa do singular.
Folha 8 - O que pensa das denúncias recentes do secretário geral da UNITA, Mário Vatuva, sobre as tácticas de corrupção em-preendidas pelo MPLA, aliciando a adesão de membros da UNITA, em situação de fome e outras fragilidades sociais?
Lukamba Paulo Gato- Não é fácil aceitar se não houver o mínimo de sentido de ética, mas escuta: numa competição de boxe, de futebol, não basta dizer que os outros ganharam porque o golo foi marcado de fora de jogo ou com a mão... Façamos o mesmo e já, no campo do adversário. A UNITA deve mobilizar-se e "destroçar" também o eleitorado do MPLA, no sentido de os convencer de que o nosso programa, o projecto de sociedade que propomos é melhor do que o do seu partido, que só plantou fome, miséria desunião, entre os angolanos. Logicamente, cabe a nós jogar. Não basta sentarmo-nos no gabinete e dizer: o MPLA está a mobilizar as nossas fileiras. Não! Devemos fazer a mesma coisa. Creio que é a boa guerra. Não é grave! É isto a política finalmente e a disputa eleitoral passa necessariamente, por estes caminhos, porquanto cada partido político tem o seu eleitorado cativo e se quiser mais deve ir piscar no campo do outro.
F8 - Então não importa os meios, a forma, para se aliciar o voto dos eleitores, mesmo os mais escroques, valem?
LPG - Não! Não foi o que eu disse e penso que tudo deve ser feito dentro das regras do multipartidarismo, da convivência democrática, das leis e da urbanidade. Não se pode colocar legiões de pessoas a fome e depois condicionar a sua alimentação a adesão ao partido no poder. Isso não é leal!
F8 - Agora explique-se melhor...
LPG - Em democracia há alternância, porque não há eleitorado cativo ou permanente, tirando os incondicionais. É por isso que nas grandes democracias, os partidos políticos alternam-se no poder. Hoje é a Direita amanhã é a Esquerda. Na França, por exemplo, a alternância funciona invariávelmente desde há cerca de 30 anos. Os maiores partidos revezam-se no poder, sozinhos ou de acordo com a correlação de forças saída das eleições. Teremos nós também de evoluir para para o voto consciente.
F8 - Na sua opinião, o que é isso de voto consciente?
LPG - Os eleitores naturais votam de acordo com a sua consciência, com o pragmatismo da orientação do partido e também do seu interesse sócio-económico. Eles farão confiança na-queles que lhes propor-cionarem melhores con-dições de vida e nada mais. Eles querem viver cada vez melhor fazendo ao mesmo tempo grandes poupanças. Ainda não estamos nesse nível mas é essa a filosofia. O dia em que os angolanos ganharem a consciência real dos seus interesses haverá uma concorrência mais leal do que hoje.
F8 - O que se deve fazer?
LPG - É importante que a direcção do partido se preocupe com esse estado de coisas. Em véspera das eleições, os dirigentes devem ir mais ao encontro dos eleitores e não podem dizer que a hemorragia não nos preocupa. Eu queria dizer aos militantes da UNITA que do meu ponto de vista, sincero e honesto, a direccção tem a obrigação de estar preocupada com esta situação desagradável. Deve por isso, decidir como tentar pôr cobro a mesma.
F8 - Tem alguma receita ou forma para se con-tornar essa situação?
LPG - Vivemos num País difícil com carências de toda a ordem principalmente para os desmobilizados, deslocados e outras vítimas do conflito que procuram por todos os meios satisfazer as necessidades básicas da sua existência material. Gostaria também de dizer, que no quadro dos Entendimentos do Luena, ficou claro que haveria uma reinserção social digna para todos os ex-combatentes. Ninguém devia por isso, aproveitar-se de uma situação de carência para tirar dividendos políticos. Mas estamos em política em que muitas vezes não basta justificar como é que você "perdeu bem". Essas situações fazem parte do jogo político. Gritemos menos e trabalhemos mais, pois estamos a tratar com pessoas adultas e politizadas o suficiente para enten-derem de que lado se encontra o seu interesse. A política é também isso…
F8 - Como avalia o desempenho da actual direcção da UNITA?
LPG – O congresso teve lugar há 16 meses e sempre me remeti a um silêncio, sobre a estratégia da direcção do meu partido, cujo balanço parece muito mitigado, mas não me cabe a mim, como indivíduo julgar o desempenho da direcção do Partido no seu lado.
F8 – Mas não deixa de ter uma opinião?
LPG – Sim. Teremos brevemente uma reunião ordinária da Comissão Política, que é o orgão legislativo e fiscalizador da acção do executivo do nosso partido. Só ela tem o poder de fazer um juízo daquilo que é o balanço de actividades. Pessoalmente penso que há faltas ao nível da concepção estratégica para a nova fase. Não se fizeram escolhas racionais e judiciosas para o momento. Muitos na nossa praça política habituaram-se a ver a UNITA sempre na lógica da confrontação sistemática contra o MPLA.
F 8 – Considera que com a morte de Savimbi se deveria enterrar, a forma anterior de luta?
L P G - Hoje mesmo para matérias de interesse na-cional não se tem conse-guido, ganhar altura capaz de guindar a UNITA ao nível das suas respon-sabilidades nacionais.Não excluo que haja no MPLA igualmente aqueles que gostariam de ver uns e outros sempre de costas viradas.
Não faltam saudosistas de um e de outro lado, mas o importante é sabermos fazer a distinção correcta entre o interesse partidário e o interesse de todos os angolanos.
Como eu disse atrás, teremos este mês uma reunião da direcção do partido que poderá pronun-ciar-se com propriedade sobre aquilo que foi o balanço de 16 meses de actividade do novo executivo da UNITA, bem como os próximos passos que teremos de empreender de forma a podermos dar aos angolanos uma perspectiva diferente, de maior confiança na UNITA e no futuro de Angola.
(continua)