Entre palmas e assobios já temos nova Constituição.
Foram 10 longos anos de avanços e recuos. Em 99 até houve tentativa de alterar substancialmente os poderes do PR. A versão final é mais modesta mas não deixa de ser obra, como reconhece o ex-deputado Hunguana.
Mulembwé, barroco como já nos habituou, citou Nicolau Maquiavel. Se calhar, não o melhor trecho, mas ele lá sabe com que linhas se coze o país que aprendeu a servir o Príncipe: os que já foram e os vindouros.
Lendo na diagonal “a mãe de todas as leis”, fico com a impressão que estamos todos no sofá-divã que acompanha invariavelmente o mobiliário do consultório de psicanalista. Como se encomendássemos a alma a Freud e aos seus seguidores.
Do Código Civil veio o reforço aos direitos, liberdades e garantias individuais dos cidadãos. Do Código Penal foram transplantadas normas tão básicas e elementares como a ausência de crime sem lei que o conforme.
Os legisladores terão as suas razões para tanto detalhe e pormenor..
As minhas vêm do sofá e da catarse.
Afinal não é este o país que aplicou pena de morte com efeitos retroactivos a um maquinista apanhado com sacos de açúcar na sua locomotiva? Que continua a apresentar “culpados” sem julgamento?
É por isso que os moçambicanos percebam que é preciso que se escreva na Constituição a inviolabilidade da correspondência e a recusa de buscas domiciliárias nocturnas como expediente corrente. É a memória do “não vamos esquecer o tempo que passou” que marca indelevelmente o novo texto constitucional.
Também, os milhares de moçambicanos que trabalham nas terras do “rand” e se protegem, entre outras coisas da xenofobia, usando passaporte sul-africano, ficaram agora a saber que não são extirpados da sua nacionalidade por usarem, por conveniência, o documento nacional do país dos “cunhados”. Eusébio pode ter dois passaportes sem necessidade de indulto presidencial.
Resta saber quanto vale a Constituição.
Para o mais ordinário dos cidadãos, para os que aplicam a lei. Para polícias e os diversos agentes da lei e ordem, magistrados e outros poderes constituídos.
Atrevo-me a um termo datado. A Constituição é uma arma.
Mas está por formar ainda o exército popular e militante que a esgrima como defesa contra o arbítrio e a injustiça. Como se de repente o povo se embainhasse de protecções balsâmicas, como se todos fôssemos como aqueles pistoleiros implacáveis que desfilavam no “Varietá”, no “Olímpia” e no “Tivoli”.
De Constituição na ponta da língua.
Savana maputo 19.11.04