As confrarias em Moçambique deixaram de receber as ajudas da Arábia Saudita. Este reino passou a privilegiar os xeques e as mesquitas do Conselho Islâmico, que conseguem atrair cada vez mais jovens para as suas madrassas, diz Hafiz Adburrazaque Jamú
A comunidade islâmica tem ganho influência na Ilha de Moçambique?
A comunidade muçulmana tem aumentado por diversas vias. Primeiro, a taxa de natalidade, entre os muçulmanos, é muito alta. Não há planeamento familiar e a religião permite a poligamia, o que eu discordo, pois considero ser um problema de interpretação. Permitiu-se que o homem casasse com mais de duas mulheres para segurar o tecido social feminino no tempo do profeta Maomé quando havia uma guerra santa. Depois, a comunidade muçulmana também aumentou porque o facto da Ilha não ter sofrido directamente da guerra, fez com que muitas pessoas se refugiassem aqui.
Os apoios têm permitido um maior peso dos muçulmanos?
Desde sempre, as confrarias tiveram apoios da Arábia Saudita, e dos vários cantos do mundo islâmico. Mas recentemente não. Com a proliferação do fundamentalismo, as pessoas que defendem essa doutrina começaram a receber esse apoio, deixando as confrarias marginalizadas. Da parte do Governo, muitas das vezes, não vêm apoios, mas consideração. Mas a nível mundial, as confrarias estão muito fracas.
A visão fundamentalista tem conquistado novos membros?
Têm muitas mesquitas mas poucos membros. Mas têm ganho influência, também pelo facto de em Moçambique existir muita gente que até há pouco tempo não tinha nível académico. As pessoas quando vão para as escolas começam a aprender o que é a lógica.
E o fundamentalismo começa por se aproveitar desse factor, por interpretar o Corão de uma forma lógica. Todo o jovem aposta neste raciocínio. Eles semeiam o fruto nos jovens. Estas centenas de novos membros aderiram nos últimos sete a dez anos. Mas os líderes não conseguem alterar a visão das mulheres ou dos mais velhos.
As confrarias têm receio dessa tendência?
Temos um grande receio. Temos que nos proteger, abrir escolas para dar aulas às crianças sobre as confrarias. Quando falecerem os mais velhos, esta maneira de ser das confrarias deixa de existir. Eu sou o único jovem que declaro em público que pertenço às confrarias.
Se nós tivermos uma mesquita de palha e ao lado houver uma mesquita com energia e melhores condições, as pessoas escolhem a que tem melhores condições. A maioria da população ainda não aderiu. Mas há um risco. Os próprios lideres das confrarias não têm trabalho, e são fáceis de vergar, enquanto as pessoas do Conselho Islâmico recebem salários, e têm apoios.
PÚBLICO - 28.11.2004