A existência de irregularidades nas eleições presidenciais de 1999 não é oficial, mas nos círculos políticos e intelectuais de Maputo, é uma verdade praticamente indesmentível. Nesse ano, os observadores internacionais acataram as condições impostas pela Comissão Nacional de Eleições (CNE). Resultado: deixaram o país imediatamente a seguir à votação e não assistiram à fase da contagem dos votos. Apesar disso, na declaração final declararam as eleições livres, justas e transparentes.
Analistas moçambicanos acreditam que a intransigência agora manifestada pelas organizações internacionais é um reflexo da tomada de consciência de que a sua credibilidade enquanto observadores foi posta em causa com os acontecimentos de há cinco anos.
Nesse escrutínio, a vitória de Chissano sobre o candidato da Renamo, Afonso Dhlakama, nas segundas eleições presidenciais de Moçambique, foi confirmada por uma vantagem muito reduzida de 224 mil votos, inferior ao conjunto de 377 mil boletins considerados "nulos", perdidos, ou não contabilizados.
A CNE recusou recontar os votos, como exigia a oposição. Depois de analisar a questão, o Tribunal Supremo concluiu que não era possível fazer uma recontagem dos votos a partir dos editais (que continham erros insanáveis) mas apenas a partir dos boletins, o que atrasaria muito a publicação dos resultados numa altura em que o país já estava paralisado, e acabou por validar as eleições.
A vitória de Joaquim Chissano não foi reconhecida pela Renamo-União Eleitoral. A crise atingiu o seu ponto mais alto com manifestações de protesto da oposição em várias cidades moçambicanas, a detenção de militantes da Renamo e a morte de 83 desses apoiantes, numa cela da prisão de Montepuez (província de Cabo Delgado) onde ficaram vários dias sem água e comida. A questão só viria a ser resolvida com negociações entre Joaquim Chissano e Afonso Dhlakama iniciadas pouco tempo depois. Este foi considerado o momento mais violento por que passou Moçambique desde o final da guerra em 1992. A.D.C.
PÚBLICO - 01.12.2004