Por ANA DIAS CORDEIRO
PÚBLICO, 03 de Dezembro de 2004
A fraca afluência registada nos dois dias de votação (1 e 2 de Dezembro) fez crescer a imprevisibilidade relativamente a resultados e a possibilidade de uma segunda volta das eleições presidenciais.
"Nunca houve uma incerteza tão grande relativamente a vencedores como a que estamos a ter agora. Isso começou a ser claro logo às primeiras horas de ontem [segundo e último dia da votação]", disse ao PÚBLICO por telefone, Adriano Nuvunga, observador moçambicano da Associação dos Parlamentares Europeus (AWEPA).
Uma leitura feita por analistas é a de que uma fraca participação diminui também a probabilidade de que um dos dois candidatos favoritos às presidenciais reúna os 50 por cento de votos necessários para passar à primeira volta. Além de Armando Guebuza (Frelimo) e Afonso Dhlakama (Renamo), concorreram também às presidenciais Raul Domingos, Carlos Reis e Yá-cub Sibindy.
A realização de uma segunda volta seria um sério revés para a Frelimo, que nunca teve que passar esse teste, podendo por isso criar na Renamo a sensação de estar em vantagem. Nas reacções de ontem, o partido de Dhlakama aproveitou logo para interpretar esta forte abstenção como um sinal do "repúdio" do eleitorado aos 30 anos de "governação desastrada da Frelimo", enquanto a Frelimo se limitou a dizer que era "prematuro avançar com as causas" para o que aconteceu nesta votação.
Em declarações à agência Lusa, o responsável eleitoral da Renamo, Eduardo Namburete, afirmou que a abstenção tinha sido mais acentuada nas cidades, onde o eleitorado é geralmente pró-Frelimo, o que traduzia "a profunda frustração do povo" relativamente ao partido no poder. António Hama Thai, da Frelimo, considerou essa leitura "sem fundamento".
Embora não haja dados oficiais observadores e órgãos eleitorais já manifestaram a preocupação relativamente ao que poderá ser uma taxa de abstenção recorde em legislativas e presidenciais em Moçambique.
Nas primeiras eleições, em 1994, a abstenção foi de 12 por cento, aumentando para 32 por cento, em 1999. Desta vez, estimativas não oficiais, com base em dados recolhidos junto das mesas de voto, apontam para 70 por cento.
"A fraca afluência é reveladora do cansaço das pessoas", acrescenta Nuvunga. "Em 1994, as pessoas pensavam que com as eleições, o Estado estaria em condições de criar instituições que resolvessem problemas concretos, e isso não aconteceu."