In "Diálogos Lusófonos", na net:
Luís Filipe Maia (Portugal) enviou um texto muito bom sobre o Ultimatum inglês em 11 de Janeiro de 1890 a Portugal que determinou mudanças na história do país na 1 ª metade do século XX e na divisão da África entre as potências da época.
Diz o Luís que nos envia umas notazinhas, sobre a política portuguesa decorrente entre a Conferência de Berlim em 1884 e o Ultimato Inglês de 1890, que servirá para ilustrar, muito do que temos vindos a discutir ao mesmo tempo servirá para se constatar, como se pode dirigir o sinal ou as razões da auto-estima nacional de acordo com os interesses dos detentores do poder ou das oposições.
Que cada um faça o seu juizo.
Opiniões?
****************
Os factos
A conferência internacional de Berlim em 15 de Novembro de 1884, na qual estiveram representados os Países, colonizadores em Africa e na qual aparentemente se pode considerarem terem sido tomadas decisões favoráveis a Portugal, por posições já ocupadas em Angola , ver-se-á por factos que decorrerão mais tarde, que assim não sucedeu.
A conferência de Berlim contou com a presença das grande potências da época, com interesses directos ou indirectos em Africa que preferiam encetar uma via de negociação, estabelecendo regras ao seu próprio expansionismo que evitasse vir a produzir desentendimentos bélicos. Não queriam as potências europeias que as suas apetências pela partilha de Africa, pudesse vir a desencadear uma nova guerra.
A decisão extraída dessa conferência de configurar o direito de colonização com a ocupação efectiva desses territórios, anulando os direitos históricos tradicionais, que se traduziam na prioridade da descoberta, prejudicou claramente os interesses de Portugal, pequeno País mais interessado na visão histórica associada à descoberta do que ao facto concreto da ocupação.
Note-se que Portugal teria na altura pouco mais de 3,5 milhões de pessoas, naturalmente capital humano reduzido pois que o Império havia dispersado ao longo dos séculos, muita gente. Este conceito do direito á posse associado á ocupação que ali foi aprovado, não interessava em nada a Portugal que antes preferiria o velho conceito da posse histórica inerente á descoberta e depois logo se veria como seria a questão da ocupação. Marcar o chão antes de mais seria o importante.
Também não parece que a relacção com a Inglaterra fosse especialmente difícil nessa altura, dado que em Fvereiro desse mesmo ano se haviam negociado uns "terrenozitos" em Africa, em troca de facilidades de comércio e navegação no Zaire e no Zambeze.
As inúmeras dificuldades financeiras internas que se haviam reproduzido no governo de D.Luis, imensas querelas, haviam inclusivamente levado a que um deputado Ferreira de Almeida houvesse em 1877 e de novo em 1888, proposto a venda das colónias , consciênte já por certo da dificuldade em assegurar as pretensões portuguesas, e buscando ali uma forma de pelos menos resolver o problema financeiro do País.
Consciênte destas realidade havia alguns, destaca-se Andrade Corvo, que foi Ministro da Marinha e do Ultramar em 1879, cuja preocupação era delimitar as fronteiras de Moçambique e Angola de acordo com as forças reais do País, pugnando por politicas de desenvolvimento do comércio e de captação de capitais e emigrantes estrangeiros, atendendo que os recursos naturais assim o exigiam. Além de bom governo, boa administração, precisamos de boas alianças, escrevia ele na altura, pugnando pelo reforço da aliança com a Inglaterra.
Andrade Corvo é considerado hoje um dos mais lúcidos ensaistas políticos do sec. XIX, infelizmente muito ignorado ainda hoje, como o foi no seu tempo, a sua lucidez não servia os interesses de ninguém, muito menos os da oposição republicana.
Por parte do poder instalado era importante estimular a auto-estima nacional, é isto que estamos a tratar, usando os velhos chavões do Império grandioso e megalómano, que o realismo lúcido de Andrade Corvo naturalmente refreava.
O sistema politico parlamentar configurava o rotativismo governamental entre o Partido Progressista e o Regenerador, mas desde 1878 que o Partido Republicano se encontrava representado na Camara dos Deputados e até 1895 elegeria deputados em quase todas as legislaturas. Sendo contudo afastados nesta data mercê de várias habilidades ao que chamaria hoje "engenharia eleitoral".
As expedições que se seguiram de Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens e outras na ânsia de consolidar terreno nâo conseguem ocultar a realidade da incapacidade de ocupação efectiva, já difícil se se encarar apenas Angola (datam deste ano a deslocação dos primeiros colonos da Madeira para lá) e Moçambique, muito mais complexo se se englobar igualmente toda a parcela de terreno que fica entre os dois territórios.
Tudo parecia pacífico mas covenhamos que a pretensão portuguesa era excessiva, não só pelo gigantesco passo em relacção á dimensão da perna, como também pelo facto de estar em desacordo com a Conferência de Berlim que haviamos subscrito.
Alguns convénios bi-laterais assinados com a França e com a Alemanha, pareciam apontar o caminho do sucesso das nossa pretensões ao famoso território cor-de-rosa, assim chamado porque habitualmente vinha assim colorido nos Mapas.
Só que os nossos eternos aliados desta vez, não pactuaram connosco, já que tinha interesses não coincidentes com os nossos, nomeadamente um projecto de Sir Cecil Rhodes e que consistia na construção de uma linha ferrea do Cabo, no extremo Sul da Africa do Sul á cidade do Cairo no Egipto.
A isso a Conferência de Berlim teria chamado ocupação territorial efectiva, que deveria consistir segundo Berlim em manter a ordem, proteger os estrangeiros e vigiar os indigenas.
Conscientes da sua força e da importância que tinham para nós os Ingleses forçam a nota da ameaça da rotura, sob a forma de ULTIMATO, em 11 de Janeiro de 1890, obrigando a desocupação militar imediata das zonas que pretendiam eles ocupar , sob pena do pessoal diplomatico abandonar Lisboa. Isto chama-se ameaça de declaração de guerra.
Se se procurar na História Inglesa, pelo reinado da Rainha Vitória, e nos governos de Gladstone, algo que nos dê uma ideia do ponto de vista inglês sobre este incidente, nada se lê, nós não eramos suficientemente importantes para os preocuparmos, encontram-se sim alusões á sua verdadeira preocupação na altura, evitar o expansionismo alemão para essa zona que a "posse" portuguesa não daria garantias de oposição efectiva.
O Rei D.Carlos, entretanto aclamado e o governo cederam á pretensão inglesa. Talvez a cedência tentasse remeter para a Arbitragem Internacional, resultantes do Acordo de Berlim, face a uma protesto nosso e confiantes que o apoio de outras potencias pudesem levar a Inglaterra a transigir, o que realmente não aconteceu.
Se se analisar esta questão apenas sob o ponto de vista dos ganhos e perdas, naturalmente que a consumação da rotura com a Inglaterra a acontecer, teria produzido maiores perdas, já que as pretensões inglesas englobavam também Lourenço Marques e a foz do Zambeze, que não conseguiram obter por força da tal arbitragem a que a queixa de Portugal levou.
As reprecursões internas porém foram catastróficas para a monarquia, considerando-se este facto com um dos factores determinantes da sua derrocada 20 anos mais tarde. A indignação popular contra o governo, apelidados de traidores, vendidos á Inglaterra, gerou uma onda de mobilização geral e sem dúvida fonte geradora de inúmeras figuras que mais tarde haveriam de edificar a revolta republicana.
Para mais sendo que já foi referido que o afastamento em 1895 do Partido Republicano da Camara de Deputados, fez ressurgir movimentações sociais de rua a partir de 1890, instigada por uma ELITE chamada de "geração do Ultimatum" (João Chagas,Afonso Costa,Brito Camacho, Antonio José de Almeida, etc)
Este facto fermentou o ideário republicano, conduzindo a outras questões como a podridão política, o envelhecimento da monarquia e as culpas do rei, no acontecimento, que beliscava profundamente o orgulho nacional e os sentimentos anti-ingleses.
Claro que todas as outras potências a quem Portugal solicitou guarida ás suas pretensões, se escusaram diplomaticamente a advogar as nossas posições politicas, afinal quem estaria disposto a subscrever um conflito com a Inglaterra por causa de nós ? Viriamos em 28 de Maio de 1891 completamente sós a negociar então com a Inglaterra um novo mapa colonial para Africa, mais severo ainda que o original resultante do Mapa cor de rosa, e que salvaguardando pequenas correcções corresponde á configuração de hoje.
Fontes
História de Portugal-José Hermano Saraiva
Historia de Portugal em datas coordenação de Antonio Simões Rodrigues
A crise da monarquia constitucional (1890-1906) por Sergio Campos Matos Ferreira, José Dias (1837-1907)
Lente de Direito (formado desde 1859).
Deputado desde 1860 (por Arganil).
Ministro da Fazenda, no governo de Ávila, entre 4 de Janeiro e 22 de Julho de 1868; da Fazenda e da Justiça, de 26 de Maio a 29 de Agosto de 1870, no governo da saldanhada .
Funda o Partido Constituinte, em Junho de 1871.
Par do reino, desde 1876.
Presidente do Ministério, de 17 de Janeiro de 1892 a 23 de Fevereiro de 1893, num governo dito de acalmação partidária .
Durante a chefia do governo, acumula sempre a pasta do Reino.
Acumula a Instrução Pública, até 3 de Março de 1892, data em que o ministério foi mais uma vez extinto.
De 27 de Maio de 1892 até 23 de Fevereiro de 1893, acumula a pasta da Fazenda, de onde sai Oliveira Martins.
Eleito deputado independente em 25 de Novembro de 1900, sob o governo regenerador de Hintze.