Por ANA DIAS CORDEIRO
PÚBLICO - 14 de Janeiro de 2005
As Finanças em Portugal lançaram uma ordem de penhora de bens do Presidente de São Tomé e Príncipe, Fradique de Menezes, enquanto sócio-gerente de uma empresa portuguesa com dívidas ao fisco que totalizam mais de 250 mil euros. Trata-se da sociedade Lurrica, criada em 1998, proprietária de dois estabelecimentos comerciais, no Parque das Nações em Lisboa, e que já antes tinha sido referida, na imprensa são-tomense, como tendo acumulado um passivo de milhões de euros, por "má gestão".
As acções de penhora desencadeadas pela administração fiscal portuguesa dizem respeito a 15 processos na Direcção-Geral dos Impostos. Não sendo o valor de bens já penhorados (mais de 96 mil euros) suficiente para cobrir a totalidade das dívidas da sociedade, a administração fiscal portuguesa accionou mecanismos para penhorar os bens dos sócios, a título individual. Uma certidão a que o PÚBLICO teve acesso refere que entre os quatro sócios-gerentes notificados pelo 14º Bairro Fiscal de Lisboa, está Fradique de Menezes e Lúcia Esteves Dias, cunhada do Presidente. Da mesma empresa, já antes tinha sido sócio o músico e cantor português, Luís Represas.
O gabinete da Presidência da República em São Tomé não comenta "por enquanto" a notificação. Igualmente contactados, os gabinetes do ministros das Finanças de São Tomé e dos Negócios Estrangeiros de São Tomé e de Portugal afirmaram não ter conhecimento oficial de qualquer pedido de pagamento de dívidas ou de penhora de bens no arquipélago, pertencentes a Fradique de Menezes.
Não havendo uma convenção entre Portugal e São Tomé e Príncipe, a administração fiscal portuguesa não pode desencadear uma acção de cobrança junto da administração fiscal de São Tomé, como poderia eventualmente acontecer entre países da União Europeia, explicou ao PÚBLICO um especialista em direito fiscal; significa que o mandado de penhora apenas pode ser desencadeado relativamente a bens que os sócios notificados tenham em Portugal.
Fradique de Menezes (filho de pai português e mãe são-tomense) tinha dupla cidadania antes de prescindir da nacionalidade portuguesa para se candidatar à Presidência da República, em 2001.
Para a constituição de empresas portuguesas, a nacionalidade não é relevante mas sim o estatuto de residência. Se Fradique de Menezes está registado como sócio não residente, no processo de criação da referida empresa portuguesa, o procedimento obriga a que nomeie um representante fiscal em Portugal sobre o qual recairá a responsabilidade perante as Finanças.
"Empresário-Presidente" ou o "homem do cacau"
Conhecido como o "empresário-Presidente" ou o "homem do cacau", por ser o principal accionista da maior empresa exportadora de cacau do arquipélago e por ter interesses em vários sectores, como o da construção civil, Fradique de Menezes prometeu combater a corrupção administrativa, quando chegou à Presidência em Setembro de 2001.
Desde então, o seu nome apareceu em dois casos de apropriação indevida de fundos, anteriores à sua tomada de posse como chefe de Estado. No primeiro, Fradique de Menezes reconheceu ter recebido em Fevereiro 2001, na conta da sua empresa CGI, uma transferência de cem mil dólares da empresa ERHC Chrome Oil, de capitais nigerianos, que já então tinha acordos preferenciais para garantir parcerias de exploração do petróleo na zona conjunta entre São Tomé e a Nigéria.
Fradique de Menezes foi também uma das personalidades são-tomenses citadas como tendo utilizado fundos do Gabinete de Gestão das Ajudas (GGA), num relatório de 1996, tornado público no ano passado. Fradique de Menezes que já em 1996 assumia cargos públicos, como o de deputado ou embaixador, é uma das várias destacadas figuras são-tomenses referidas nesse documento; no seu caso aparece como tendo utilizado cerca de 5 mil dólares dos fundos provenientes da cooperação estrangeira para projectos em áreas sociais. com J.R.A.