Morte do chefe da secreta envolta em mistério
— Gabinete de Zumbire está fechado a sete chaves e com forte aparato de segurança
— “Corpo de Zumbire não foi autopsiado porque não nos foi solicitado, nem pela família, nem pelos médicos, tendo em conta que as razões da morte estavam claras”, Eliseu Siueia, do HCM
Por Francisco Carmona e Luís Nhachote
A morte do director geral dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE), na manhã do último domingo, numa clínica da maior unidade hospitalar do País, está a suscitar, pelo menos em ambientes restritos, das mais variadas especulações, havendo suspeitas de que as principais razões ultrapassem uma repentina paragem cardíaca.
Segundo informações na posse do SAVANA, Zumbire (que completaria 48 anos de idade no dia 15 de Julho) terá dado entrada em estado crítico na clínica especial do Hospital Central de Maputo (HCM), na noite de sábado por volta das 20.30 horas, acometido de vómitos e convulsões, tendo encontrado a morte por volta das 08.15 horas da manhã seguinte. Oficialmente, a morte deveu-se a um ataque cardíaco — enfarte agudo de miocárdio.
O SAVANA apurou, de fontes fidedignas, que Zumbire começou a sentir-se mal, com febres, na manhã da quarta-feira, tendo-se deslocado ao HCM para cuidados médicos.
Sabe-se também que, na sexta-feira da mesma semana, Zumbire tinha agendado um encontro com o Presidente da República, Armando Guebuza, encontro a que ele teria sido aconselhado a pedir o adiamento devido ao seu estado de saúde.
Supõe-se que, no referido encontro, Guebuza pretendia reiterar a sua confiança em Zumbire para que este continuasse a encarregar-se dos assuntos da segurança estatal.
Sabe-se igualmente que já pela manhã de sábado, Zumbire terá tomado um copo de sumo, tendo desde então começado a deteriorar o seu estado de saúde. Quem deu e onde foi tomado o sumo ainda carece de esclarecimento.
Um sério aviso a Guebuza
Há quem vê na estranha morte do chefe da segurança do Estado como um sério aviso a Guebuza para que não toque em certos assuntos sensíveis do passado.
Revelações foram feitas segundo as quais já há anos que a acção de Zumbire como chefe da segurança do Estado estava a ser dificultada pelo então ministro do Interior, Almerino Manhenje, que acumulava a pasta com a de ministro na Presidência para os Assuntos de Defesa e Segurança.
Aparentemente, a cadeia de comando no seio da organização estava quebrada, com alguns quadros destacados do SISE a prestarem contas directamente a Manhenje, para a tutela de quem também havia passado a chefia da Casa Militar, que tradicionalmente esteve sempre sob comando dos serviços de segurança.
No alegado encontro de sexta-feira, Zumbire, dizem as fontes do SAVANA, receberia ordens de Guebuza para pôr em marcha alguns dossiers complicados que tinha em seu poder. Supostamente, no mesmo encontro Guebuza iria anunciar a decisão de devolver a chefia da Casa Militar para a supervisão do SISE.
Ao tomar conhecimento do estado crítico em que se encontrava Zumbire, Guebuza terá abandonado temporariamente os trabalhos da IV sessão do Comité Central (CC) da FRELIMO, dirigindo-se à clínica para o visitar. Infelizmente, já era tarde.
Guebuza terá supostamente dado ordens imediatas para que o gabinete de Zumbire se mantivesse fechado e guarnecido por elementos da Força de Intervenção Rápida (FIR) e de outros ramos das forças de defesa e segurança.
“Todos os números de telefone que ele usava foram confiscados para investigações”, disse uma fonte.
E porquê não foi feita a autópsia?
Em declarações ao SAVANA, Eliseu Siueia, assessor para área de comunicação e imagem do HCM, confirmou ao SAVANA que o corpo de Zumbire nunca chegou a ser sujeito a uma autópsia.
Siueia explicou que há dois tipos de autópsia. A primeira que é feita na Medicina Legal, quando a morte resulte de violência ou se registe no domicílio.
A segunda, a Anatomia Patológica, resulta quando para as autoridades médicas não há elementos claros sobre as causas da morte.
“Ela (a autópsia) não nos foi pedida, nem pelos familiares, muitos menos pelos médicos que cuidaram dele, porque as razões da morte estavam claras”, sublinhou Siueia.
Entretanto fontes médicos contactadas pelo SAVANA consideram estranha a explicação oficial de que a morte tenha sido causada por uma súbita parangem cardíaca.
Notam, as mesmas fontes, que uma situação dessas a paragem não é antecedida de dores, e que muito menos se administraria morfina, como aconteceu com o malogrado. Zumbire teria recebido duas doses de morfina, segundo apurou o SAVANA.
Estava para fazer mestrado na UEM Zumbire, graduado em Direito pela maior e mais antiga instituição de ensino superior em Moçambique, leccionou a cadeira de Direito Constitucional na UEM de 1991 a 1996, altura em que, devido às responsabilidades que tinha no Estado, foi obrigado a desligar-se daquela universidade. A título de exemplo, Zumbire estava ligado à famosa Locomotivas Económicas, SARL, uma sociedade de exploração e comercialização de recursos naturais entre outras actividades, com Octávio Muthemba, Nyimpine Chissano, Nyeleti Mondlane, Manuesse Mocumbi, Casimiro Huate, Samito Machel, Roberto William Kachamila, entre outros. Zumbire estava ainda na INTERFACE — uma sociedade de gestão — com um capital social de cerca de 100 milhões de meticais. O número um do SISE estava igualmente ligado a ACAUTO, uma firma de importação e comercialização de acessórios de automóveis e à CORAL Moçambique, Limitada. Na Lafinanciere Moçambique, SARL, uma firma de promoção de desenvolvimento empresarial, onde Zumbire era também sócio, estava com nomes como o de Pascoal Mocumbi, Adriano Sumbana e o falecido Rafael Maguni. Zumbire estava também na Two Fullis Mining Company, Limitada, uma firma de prospecção e pesquisa geológica, bem como processamento e comercialização de minérios ou seus derivados.
SAVANA - 11.03.2005