Moção aprovada por dezenas de associações pede legalização dos cidadãos em situação irregular
Brancos, mulatos, negros, muçulmanos, católicos e ateus, caucasianos e africanos juntaram-se ontem em Lisboa pela regularização e integração dos imigrantes em Portugal. Largas centenas de pessoas responderam ao apelo de uma plataforma constituída por dezenas de associações de imigrantes, anti-racistas, de direitos humanos, sindicais e religiosas.
Pela Avenida Almirante Reis acima gritou-se por "direitos iguais" e "documentos para todos". "Não há nenhum imigrante que esteja a viver em Portugal e que seja feliz", resumia Madia Mane, um senegalês em Portugal desde 1991, com autorização de residência, mas que desespera por conseguir a nacionalidade portuguesa. Madia tem a mulher e os dois filhos no Senegal, está desempregado e vê-se aflito para pagar uma renda de 660 euros, "a dividir por quatro e que está sempre a aumentar".
Mais desesperado está o guineense Abdullah, que diz não conseguir renovar o seu visto de trabalho depois de se ter ausentado do país durante "dois meses e três dias". "Falam em PALOP [Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa], em CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa] mas isso são tudo tretas."
Perante a situação, garante que iniciará hoje uma greve de fome à porta do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. "Tenho um visto de trabalho, mas não me deixam abrir uma conta no banco", atirava outro dos manifestantes.
Num instante, juntavam-se em círculo outro e outro imigrante, relatando histórias de "exploração" e de direitos que dizem que lhes são vedados.
Entretanto, o desfile seguia, ruidoso, desde o Martim Moniz até ao Centro de Nacional de Apoio ao Imigrante, nos Anjos. Ao som de pandeiros, tambores e de palavras de ordem que convergiam numa única reivindicação: direitos iguais para todos os "que aqui vivem, aqui trabalham, aqui contribuem". "Não é muito o que pedimos", constatava a presidente da Associação Cabo-Verdeana, Alcestina Tolentino.
"Ao fim de três décadas de acolhimento, continuamos a falar nos mesmos números: existem milhares de cidadãos indocumentados, milhares de imigrantes irregulares, que ficam anos à espera da renovação de um documento. Há crianças que nascem sem terra", lamentava uma dirigente da Associação Olho Vivo.
A alteração da actual lei da nacionalidade, "substituindo os actuais critérios de aquisição" e pondo fim à "exclusão social de muitos jovens da segunda geração, negando-lhes um sentido de pertença a Portugal", é, aliás, um dos quatro pontos da moção lida ontem, em português e ucraniano, no final da manifestação.
O documento pugna ainda pela regularização de todos os imigrantes em situação irregular. Ou seja, "permitir que todos aqueles que hoje trabalham e vivem em Portugal excluídos dos benefícios sociais se possam regularizar como cidadãos com direitos". A promoção de "políticas reais de integração social", como a facilitação do reagrupamento familiar e o acesso à educação, à formação profissional, ao Serviço Nacional de Saúde ou à Segurança Social, é outros dos pontos defendidos.
PÚBLICO - 21.03.2005