Após a morte de Zumbire
- Estranhamente a casa de Zumbire esteve desguarnecida e este teve que se socorrer da família para chegar ao hospital
L. Nhachote e F. Carmona
Mais subsídios na posse do SAVANA dão conta da existência de sérias fricções nas hierarquias dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE) desde a morte do seu director geral, José Castiano de Zumbire.
Estas agitações resumem-se em desconfianças e descontentamento de muitos operacionais em relação aos mais directos subordinados do finado, por não terem, aparentemente, prestado o apoio necessário nas horas críticas daquele antes do anúncio oficial de que este sucumbira a um enfarte de miocárdio.
Estes operacionais, segundo soubemos de fontes inside do SISE, desde a morte de Zumbire que preferem manter sob sua guarda os dossiers que estavam a seguir, até que Armando Guebuza nomeie o mais rápido possível um novo director.
O adensar do mistério
Segundo detalhes que paulatinamente vão transpirando para a Redacção do SAVANA, estranhamente a casa de José Zumbire não teve a habitual segurança que prestava serviços na residência deste.
Ao que sabemos, quando Zumbire começou a sentir o degradar da sua saúde terá telefonado para um dos seus familiares pedindo socorro.
Chegados à casa de Zumbire, os familiares deste terão encontrado a casa desguarnecida, tendo optado por telefonar para este lhes abrir a porta.
O desconfiar dos agentes que controlam os "monos"
Os agentes operacionais do SISE dividem-se em várias categorias, sendo a destacar, de acordo com a fonte daqueles serviços, os agentes chamados "monos" que fazem o levantamento de informações primárias e secundárias no teatro das operações.
Estes trabalham sob codificação — muitas vezes funcionários de outras instituições — e a maioria dos quais raramente tem acesso à liderança da hierarquia da secreta.
"Se eles estiverem a desempenhar um trabalho excelente, a direcção chama o agente encarregado da supervisão directa dos seus trabalhos", sustentou a fonte.
"Eles poderão ascender para cargos de maior confiança."
Soubemos ainda que é no sector dos supervisores destes agentes que reina a desconfiança e o desânimo até que Guebuza ponha os pontos nos ii no SISE. "Muitos deles têm dossiers quentes em curso e depositavam confiança no Zumbire" .
Com a morte do chefe da secreta, aliado às informações segundo as quais os subordinados directos de Zumbire confiavam em Manhenje, alguns não vêem segurança em depositar as informações que têm em seu poder. "Os imbuídos de patriotismo depositam confiança no Presidente da República", sublinham.
Quem ganha com a morte de Zumbire?
Por Manuel de Araújo*
Três acontecimentos sem precedentes na história moçambicana tiveram lugar semana passada. O histórico afastamento de Joaquim Alberto Chissano da liderança da Frelimo, a acumulação dos postos de secretario-geral, presidente da Frelimo e Presidente da Republica por Armando Guebuza e a morte do director geral do Serviço de Informação e Segurança do Estado, José Zumbire. Em qualquer parte do mundo a morte natural ou não do chefe da "secreta" é notícia de primeira página! Em Moçambique, com excepção do Savana, não vimos mais nenhuma página dedicada ao assunto! Coincidência? Imaginem quantas páginas ocuparia a morte do director da CIA, da BOSS, KGB, MOSSAD ou do MI5/6!
Se está claro que o segundo acontecimento foi consequência do primeiro, podendo deste modo se estabelecer uma relação de causa e efeito, o terceiro apesar de aparentemente estar intrinsicamente ligado àqueles dois, não pode ser estabelecida tal relação, pelo menos a priori! Contudo há pelo menos duas hipóteses a considerar. A primeira que Zumbire tenha morrido de morte natural, e a segunda de que tenha sido enviado desta para a melhor por alguém que considerava a sua permanência no mundo dos vivos uma permanente dor de cabeça! Porque a primeira hipótese cabe aos médicos examina-la, concentrar--nos-emos didacticamente (como diria Máximo Dias) na segunda hipótese.
O ponto de partida desta tentativa de análise parte da constatação feita há algum tempo (há pelo menos mais de 45 dias), quando Joaquim Alberto Chissano estava a caminho do Porto onde ia receber mais um doutoramento honoris causa. Na altura o então presidente da Frelimo disse, em resposta à pergunta de um jornalista, que continuaria presidente da Frelimo, pelo menos até ao próximo Congresso da Frelimo, o que feitas as contas significaria que Chissano continuaria timoneiro da Frelimo até pelo menos 2007 (se nossas contas não estiverem erradas). Isto parece fazer sentido uma vez que em partidos democráticos ou que se pretendem democráticos só os Congressos é que têm a prerrogativa de eleger o presidente do partido. Como é que neste caso o Comité Central se substitui ao Congresso não cabe lá muito bem nesta minha pobre cabeça! Cheira a batota e levanta uma questão de fundo: será que os estatutos da Frelimo foram violados neste golpezinho palaciano? Não deveria o Comité Central colocar Guebuza como Presidente interino até a convocação do Congresso ou então não se deveria ter convocado um Congresso Extraordinário para tal efeito?
Contudo, apesar da tentativa ridícula do fidelíssimo Edson Macuácua de ‘tapar o vento com as mãos’, afirmando que o assunto sucessão não seria discutido porque não constava da agenda, o ponto quente da sessão do CC foi de facto o acantonamento definitivo (?) de Joaquim Chissano da liderança do tambor e da maçaroca!
A pergunta óbvia nestas circunstâncias é: o que é que terá obrigado Chissano a dar o dito pelo não dito? O que é que estará por detrás deste volte-face chissanista? Terá Chissano saído voluntariamente ou alguém o terá empurrado? Terá Chissano se antecipado a algo inevitável?
Estas perguntas têm a razão de ser, pois não se explica pelo menos racionalmente como é que um cidadão aceita ser Secretário-Geral e Presidente do mesmo partido? Será que Guebuza não teve tempo para encontrar um delfim no posto de Secretário-Geral pelo menos para inglês ver? Ou o partido já não tem quadros de confiança? É que como as coisas estão fica demasiado caricata a situação actual em que Guebuza se encontra! Secretario-Geral do partido, presidente do partido, Chefe de estado, chefe de Governo, Comandante em Chefe das Forcas Armadas! Com este andar não me surpreenderia se Guebuza assumisse as funções de Presidente da Assembleia da Republica, ou de Presidente da OMM! Para quê tanto poder concentrado numa pessoa? Será que nos esquecemos que o poder absoluto corrompe absolutamente?
É lógico que sé Chissano, Guebuza e alguns membros da Comissão Política da Frelimo estarão ao corrente do que realmente se passou naquele fatídico dia! Mas porque a nós não nos resta outra saída senão o da especulação cá estamos tentando juntar os cacos e usando a dedução para que possamos pôr alguma luz na história recente do nosso País.
A segunda questão a ser colocada tem a ver com o alegado atraso de duas ou mais horas do início da reunião do Comité Central na Matola, aparentemente porque a Comissão Política estaria a forçar Chissano a dar o dito pelo não dito! Terá sido o segundo golpe palaciano que Chissano sofre em menos de dois anos? O que estaria por detrás de tal atraso?
A terceira pergunta tem a ver com o facto de fofoqueiros seniores da praça garantirem que recentemente Zumbire conferenciara tanto com Chissano como com Guebuza como era seu dever. O que terão discutido nesses encontros só Deus sabe, e provavelmente o que ele discutiu com cada um deles só ele sabia! Com o seu desaparecimento físico ninguém mais ficará a saber!
Para pôr alguns pontos nos ii, decidimos optar pela lógica de alguns detectives, que se baseia em perguntar ou tentar saber quem lucraria com a morte da vitima, ou seja quem ganharia com a morte de Zumbire?
Ponto Um: Com a morte de Zumbire, Guebuza passa a ter a mão livre para montar a sua equipa de segurança, mas em contrapartida perde um acervo substancial de informação que deve ter acompanhado Zumbire ao Cemitério de Lhanguene. Será que a necessidade de montar uma equipa fiel ao novo timoneiro do tambor e da maçaroca levaria a tanto? Guebuza ganharia mais ou menos com Zumbire em vida?
Ponto Dois: Com a morte de Zumbire, Chissano fica seguro que para além dele ninguém mais saberá dos segredos que ele não queria que mais ninguém soubesse! Aliás, em plena, entrevista em resposta a uma pergunta de um jornalista da TVM, em que este queria saber se Chissano já começara a passar os segredos da casa a Guebuza, Chissano afirmara sem papas na língua (o que nos surpreendeu bastante na altura) que passará já uma parte dos segredos da casa, que passaria alguns mais mas que haveria certos segredos que jamais seriam passados a Guebuza! Será que tal necessidade de preservar uma parte dos segredos o levaria a tanto?
Para terminar aproveitar o ensejo para rogar aos leitores para que não me acusem de ter acusado a alguém! Apenas juntei os pedaços que os fofoqueiros da praça distribuíram gratuitamente, e dei-me ao deleite de fazer algumas conjecturas, em surdina, fazendo uso das prerrogativas que a constituição me oferece!!
E nao disse mais nada, tanto mais que se diz algures que Hitler mandava desta para a melhor os arquitectos e engenheiros que construíam os seus bunkeres secretos! Será o caso?
Ate porque a conclusão é sua, caro leitor!
* Deputado na Assembleia da República pela Renamo-UE
SAVANA - 18.03.2005