João Craveirinha
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CONCLUSÃO – Duas Fontes não paradigmáticas
Em relação ao livro de Barnabé Ncomo e sem pretender fazermos um juízo que possa ser mal interpretado deixaríamos no entanto reparos sobre duas das fontes apesar do merecido mérito de “relatos” da época, pecando no entanto, pela intenção óbvia subjacente: Tratam-se das referências à participação do intitulado grupo Português dos DEMOCRATAS de Moçambique, citado na página 209 do Livro Moçambique – Sete de Setembro – Memórias da Revolução, escrito em Dezembro de 1976, no Rio de Janeiro – Brasil, por Clotilde Mesquitela. A autora, esposa do deputado Gonçalo Mesquitela da A.N. (de Oliveira Salazar) é Mãe dos irmãos Mesquitelas, fundadores em 1974, de uma organização para-militar portuguesa, ultra nacionalista e colonial –, Dragões da Morte. Segundo seu Boletim Informativo nº 1 esta “organização clandestina” no preâmbulo, 1º, visava -…”pôr termo às conversações com a FRELIMO, nem que tenhamos que começar a fazer TERROSISMO URBANO, para fazer calar os inconscientes que dão vivas à FRELIMO.”…Este grupo “dizia” ter …”20. 500 homens armados de todas as raças e credos espalhados por todo o Moçambique”…in Moçambique 7 de Setembro, página 246, Mesquitela, Clotilde.
O referido livro, faz uma referência incorrecta (entre outras), mencionando na página 104, linha 5 e 6, imputando ao cronista desta coluna, actos nunca praticados pelo mesmo. Refere-se a eventos pouco antes da ocupação da RCM – Rádio Clube de Moçambique que passamos a citar: - …”Recebemos a indicação de que Stélio e Zito Craveirinha e Isaías Tembe, agitadores da Frelimo, andam a distribuir G-3 no «caniço». E, em consequência disso, já tinham dado entrada na morgue do Hospital Miguel Bombarda três corpos de negros. Ao obtermos a confirmação do Hospital, soubemos mais, através de um enfermeiro que, perfeitamente desorientado, nos disse: «Entraram três mortos, mas dois não passavam de brancos com a cabeça rapada e pintados de preto». Identificados um pouco depois, viemos a saber serem de dois universitários que se tinham infiltrado, para tentar provocações, na intenção de levantar a zona do «caniço» contra a população branca, e que os próprios pretos tinham liquidado!”…e mais adiante: …”As buzinas não paravam, o hino era cantado com a mesma fé e desejo de um Moçambique Livre e Português”… Na altura destes eventos o cronista desta coluna aguardava “julgamento” em Tanzânia na FRELIMO. E só teria havido uma G-3 nas mãos do Isaías (dos pesos e halteres). Nem a sabia manejá-la devidamente. Tinha “capturado” a um elemento anti – Frelimo madeirense de um grupo vindo da África do SUL (?!), que se havia introduzido na Mafalala – “ 1ª zona libertada” de LM. Mas isso é outro assunto. Era este cenário que Uria Simango iria encontrar em Lourenço Marques e ingenuamente acreditaria poder fazer “manobras de pressão” à FRELIMO numa partilha de Poder com elementos portugueses anti – Independência. À partida tudo se conjugaria para um fracasso político do COREMO a que aderira. Os portugueses coloniais não estavam interessados em o apoiar rumo a uma Independência mas utilizando-o a um estilo UDI – Independência unilateral à Ian Smith da Rodésia (na altura), mas vinculados a Portugal. Uria Simango ao se aperceber do beco sem saída em que se envolvera recua para Malauí(Malawi), onde o inguaze – Presidente Hasting Kamuzu Banda sela seu destino entregando-o à Frelimo.
Outro “pequeno” reparo ao livro de Ncomo é o da incorrecção da importância havida no papel do dito grupo de DEMOCRATAS Portugueses (MDM), nas conversações com o MFA versus FRELIMO, conducentes à Independência. In página 288 nota 431em rodapé. O processo inicial directo de contactos com o MFA e a FRELIMO, foi efectuado pelo grupo dos antigos presos políticos da FRELIMO tendo por porta-voz o Poeta José Craveirinha. Não é somente por ser um Poeta de renome que se encontra no Panteão dos Heróis mas este detalhe terá pesado muito. O Marechal Costa Gomes e o MFA não tinham autoridade política sobre José Craveirinha e seus camaradas da FRELIMO, antigos companheiros de prisão.
À posterior surgiria o “Movimento dos Democratas de Moçambique”, mas de Portugueses, a que Mário da Graça Fernandes fez parte. Aliás, Mário da Graça Machungo (Mahlungo?). Um dia contamos o resto.
Ao que nos levou o livro – URIA SIMANGO – Um homem, uma causa. Em boa hora, graças ao empenho e pesquisa de Barnabé Ncomo. Só quem trabalha se expõe. Que estas linhas sejam um pequeno contributo e estímulo para mais trabalhos seus neste campo difícil e “perigoso” da investigação da História recente, numa busca incessante de aperfeiçoamento do rigor da verdade. Um muito obrigado pelo privilégio de termos relido este livro polémico, mas necessário aos estudiosos e ao cidadão Moçambicano “cego” e carente de suas Raízes e Identidade. (in Jornal O AUTARCA da Beira) – FIM. 29.03.2005