Jorge Heitor
Os antigos presidentes guineenses Nino Vieira e Kumba Ialá, que se defrontaram nas urnas em 1994 e que viriam a ser derrubados por golpes militares respectivamente em 1999 e em 2003, reconciliaram-se ontem em público, perante a surpresa geral de um país de 1,3 milhões de habitantes que se prepara para ter eleições presidenciais em 19 de Junho.
Sexta-feira, no Vaticano, onde esteve para o funeral do Papa João Paulo II, o Presidente português, Jorge Sampaio, manifestou ao secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, a sua preocupação pelo que se está a passar em Bissau, aonde Nino regressara na véspera de forma ilegal e onde Ialá se afirma disposto a tomar o poder pela força, se os tribunais não o deixarem concorrer de novo à chefia do Estado.
Ambos mal vistos pelo Governo de Carlos Gomes Júnior, os dois políticos disseram que tencionam percorrer o país juntos, a fim de promoverem a paz.
Enquanto isto, a ala do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) que se mantém fiel a Nino e que é dirigida por Aristides Gomes pediu a demissão do primeiro-ministro, ainda o chefe formal desta formação política, apesar de forte contestação interna.
O homem que chefiou o Estado guineense de 1980 a 1999 disse, segundo a Associated Press, que ele e Ialá concordaram ontem em ir de terra em terra dizer aos seus compatriotas "que já não há lugar para o trabalismo e para as divisões".
Por seu turno, Ialá - cuja candidatura presidencial é apoiada pelo Partido da Renovação Social (PRS), apesar de constitucionalmente ilegal - esclareceu: "Não somos inimigos, mas sim adversários políticos".
A reunião de ontem decorreu na residência de Kumba Ialá, depois de na sexta-feira ambos se terem cruzado e falado durante cerca de cinco minutos no hotel onde Nino Vieira se encontrava instalado, desde que aparecera em Bissau num helicóptero militar da República da Guiné (Conacri).
Mais tarde, Nino disse que vai pensar no pedido que "muita gente" lhe tem feito para que se candidate à presidência, apesar de oficialmente o PAIGC - no qual combateu durante a luta pela independência - já ter um candidato: o antigo Presidente interino Malan Bacai Sanhá, que lhe sucedeu quando, na sequência de 11 meses de guerra civil, foi afastado por uma junta militar que era liderada pelo brigadeiro Ansumane Mané. Mas sempre foi esclarecendo que, "neste momento", isso não faz parte dos seus planos. Ialá era solidário com a junta que depôs Nino e venceu Sanhá nas eleições efectuadas no início de 2000, mas veio ele próprio a ser derrubado pelos militares em 2003. Jorge Heitor 10 de Abril de 2005.
PÚBLICO - 10.04.2005