Uma desilusão(Concl.)
MANUEL DE ARAUJO*
(...)Dai Excias, ao abrigo do disposto no Artigo 198, ponto 2 da Constituição da Republica, lhe sugerimos que reformule o presente programa por forma a que o mesmo seja coerente consigo mesmo. Fazemos este voto, porque sabemos que os nossos Ministérios tem quadros competentes o suficiente para produzir um programa que seja não só um modelo para Moçambique mas também para outros países.
(...) O documento que nos é apresentado, reconhece a problemática das assimetrias regionais, como um problema sério cuja solução merece uma atenção especial. Contudo, notamos com alguma desilusão, que o documento uma vez mais não nos apresenta uma estratégia clara de como é que pretende acabar com tais assimetrias. O documento descreve a terra prometida, mas não nos indica como e que lá chegaremos!
Esta situação preocupa-nos sobremaneira, pois sabemos da experiência de outros povos do mundo que as assimetrias não se eliminam com meras acções quantitativas. E necessária uma estratégia clara, concisa e coerente de como e que tais acções complementar-se-ão, com o propósito de atingir os objectivos traçados, isto é, eliminar as assimetrias. Isto pressupondo que interessa ao vosso governo e ao vosso partido a eliminação de tais assimetrias.
E neste caso concreto gostaria de recordar a Vossa Excia, Senhora Primeira Ministra o caso especial da província da Zambézia, que deveria bem conhecer uma vez que foi Cabeça de lista pelo seu partido nas eleições recentes. Excia, a província da Zambézia e tida como ‘aquela que mais sofreu dos efeitos da guerra’ e estamos a citar o então Governador da Zambézia e actual Ministro da Administração Estatal, Lucas Chomera, em entrevista ao Semanário Domingo a 24 de Agosto de 2003.
A província da Zambézia, é citada pelo Relatório de Desenvolvimento Humano de 1997, e por outros documentos e relatórios como ‘aquela que possui os Índices de Desenvolvimento Humano mais baixo de Moçambique. Em face destas constatações que estratégias tem o executivo para minorar senão eliminar tal situação singular?
Excias, no capitulo da habitação preocupa-nos sobremaneira, que o nosso pais volvidos mais de trinta anos de independência, não possua ainda uma política nacional de habitação e urbanização clara, coerente e concisa. Temos engenheiros civis, arquitectos, planificadores, economistas, juristas e desenvolvimentalistas, urbanistas e ambientalistas em numero suficiente para que possamos ter tal instrumento nas nossas mãos. Faltando apenas vontade política. Excia, a crescente degradação das nossas cidades, bem como a sua ‘ruralizacao’ é reflexo directo da falta deste instrumento crucial de planificação e gestão. Exigimos, como é nosso dever, entanto que mandatários legítimos do povo, a elaboração urgente e prioritária de tal instrumento, condição sine qua non para uma gestão eficaz e sustentável das nossas urbes.
Excias, no concernente á Política Externa, preocupa-nos a inexistência de uma estratégia de promoção do interesse nacional, que envolva a sociedade civil, os homens de negócios, a academia, os moçambicanos na diaspora no processo de planificação, implementação, monitorização e avaliação da nossa política externa. Reconhecemos a primazia do Executivo na concepção, condução, e monitorização da nossa política externa, mas não reconhecemos a monopolização desse exercício tão fundamental para a instauração de qualquer sistema democrático no mundo moderno.
Excia, senhora Primeira Ministra, primazia, não significa monopólio! A democratização da nossa política externa é uma necessidade urgente e essa necessidade deve estar reflectida no Programa Quinquenal do Governo e nos seus instrumentos assessores.
(...)Notamos com alguma tristeza e desilusão, termos que confessar, que o documento que nos é apresentado não reflecte o urgente e necessário redimensionamento das nossas representações diplomáticas e muito menos a imperiosidade da valorização da carreira diplomática no nosso pais. Temos jovens formados e competentes que passam mais de cinco anos sem beneficiarem da respectiva promoção na carreira, em manifesta violação do estatuído nos preceitos legais que regulam a carreira diplomática. Preocupa-nos sobremaneira a falta de uma definição clara do lugar que deve ocupar na nossa política externa a valorização e promoção da nossa cultura bem como a valorização da nossa moçambicanidade na nossa política externa.
Na educação, o programa parece optar por uma visão sistémica. Mas não nos esqueçamos Excias que as visões sistémicas tem por mérito ou demérito a não hierarquização clara das prioridades. Assim ficamos sem saber se o executivo prioriza o primário, o secundário, o superior ou o vocacional. É que essa priorização não deve ser apenas no papel. Deve sim, reflectir-se na quantidade e na qualidade dos recursos que são alucados a tal área priorizada. E isso esperamos nos que venha reflectido no Plano económico e social bem como no Orçamento Geral do Estado.
No que se refere ao empresariado nacional, preocupa-nos sobremaneira a falta de estratégia definida.
No passado assistimos impávidos e serenos à destruição da nossa industria do caju que lançou para o mundo do desemprego milhares e milhares de concidadãos nossos.
Hoje assistimos, também impávidos e serenos ao processo gradual da destruição da nossa industria avícola com a importação de frangos brasileiros.
Mas ao mesmo tempo, assistimos Excia, a uma defesa desenfreada da industria do açúcar! Excia, somos pela liberalização ou pela protecção? Porque esta política de dois pesos e duas medidas? Será que o facto de a industria açucareira estar a ser financiada por investimento estrangeiro lhe dá o direito de ser tratada como filha e as restantes como enteadas? Não podemos continuar a piscar à esquerda e virar à direita!
Se queremos ser competitivos, temos que ser coerente na nossa política industrial.
Assinalar que preocupa-me sobremaneira a lentidão com que se processa a revisão da lei do trabalho. È que a flexibilização da lei do trabalho e do nosso mercado do trabalho são condições sine qua non para uma maior dinamização do nosso processo de crescimento. Não nos podemos dar ao luxo de manter uma lei de trabalho que não seja flexível. A actual lei do trabalho, protege os postos de trabalho daqueles que já são empregados, por ser rígida, inflexível e irrealista face aos novos desenvolvimentos da nossa sociedade bem como face à crescente globalização do mercado mundial. Contudo, uma vez desempregado, o trabalhador mergulha-se num mercado de trabalho pouco transparente, ineficiente, corrupto, repleto de amiguismo, favoritismo, nepotismo e compadrio.
Excias estas são apenas algumas considerações gerais. Por limitações de tempo preferimos parar por aqui na esperança de que o espírito de diálogo permanente entre a Assembleia da Republica e o Executivo continue são para o fortalecimento da democracia no nosso pais.
* Deputado da Renamo-UE. Excerto da intervenção, semana passada, na AR durante o
debate do programa quinquenal do Governo.
Título da responsabilidade do IMPARCIAL
IMPARCIAL – 04.04.2005