The New York Times - 11.05.2005
MCHINJI, Malawi - Nas horas após a morte de James Mbewe há três anos, enterrado em uma tumba sem lápide não muito longe daqui, sua mulher de 23 anos, Fanny, não ficou de luto nem aceitou visitas de pessoas querendo dar pêsames. Em vez disso, ela sentou-se na cabana de sua irmã, esperando que o resto de seus parentes não a encontrasse.
Mas eles a perseguiram, ela contou, e insistiram que, se ela se recusasse a exorcizar o espírito de seu marido morto, ela seria culpada por toda a morte que ocorresse na vila. Então, Fanny pegou seus dois filhos pequenos e depois se forçou a fazer sexo com o primo de James.
"Eu chorei lembrando do meu marido", contou ela. "Quando ele acabou, eu saí e me lavei porque estava com muito medo. Estava com tanto medo de contrair a Aids, de morrer e deixar meus filhos sofrendo".
Aqui e um grande número de nações próximas, entre as quais Zâmbia e Quênia, o funeral de um marido há tempos se encerra com um ritual: a viúva mantém relações sexuais com um dos parentes de seu marido, para quebrar o laço com seu espírito, e acredita-se, salvá-la e o resto da vila da loucura ou doença. As viúvas têm tolerado isso há tempos, líderes tradicionais apóiam o costume, como uma tradição da vida rural da África.
Mas agora a Aids está mudando isso. Líderes políticos e tribais começaram a falar abertamente contra o que chamam de "limpeza sexual", condenando-a por ser uma das razões pelas qual o HIV se espalhou entre 25 milhões de africanos subsaarianos, matando 2,3 milhões apenas no ano passado. Eles têm sido criticados por líderes dos movimentos locais pelos direitos das mulheres da região, que alegam que a falta de controle da vida sexual delas é a principal razão para que seis entre os dez infectados pelo vírus sejam mulheres.
Mas as mudanças têm ocorrido vagarosamente, vila por vila, cabana por cabana. Em uma região onde a crença em magia é comum e em que as mulheres são ensinadas, desde crianças, a não questionar os líderes tribais ou as prerrogativas dos homens, o medo de não cumprir a tradição muitas vezes é maior do que o da Aids.
"É muito difícil dar fim a algo que foi feito há tanto tempo", disse Monica Nsofu, uma freira e ativista contra a Aids do distrito de Monze, no sul da Zâmbia, há 200 milhas da capital Lusaka. "Nós aprendemos isso quando nascemos. As pessoas perguntam por que devem mudar".
Na Zâmbia, onde um em cada cinco adultos está infectado pelo vírus, o Conselho Nacional da Aids observou que, em 2000, a prática era muito comum. Desde então, o presidente Levy Mwanawasa declarou que força a viúva a ter relações ou casar com parentes de seu marido deve ser desencorajado, e que os chefes tribais das nações decidiram não defender a tradição, segundo informaram os porta-vozes deles.
Ainda assim, uma recente pesquisa da organização Mulher e Leis no Sul da África indicou que pelo menos em um terço das províncias do país a prática de 'limpeza sexual' das viúvas persiste, contou Joyce MacMillan, que chefia a unidade da organização na Zâmbia. Em algumas áreas, a prática se estende aos homens.