DOSSIER ADELINO SERRAS PIRES
Na nossa edição nº 39, do dia 28 de Abril de 2005 , concretamente no espaço “Hoje escrevo eu”, publicámos uma carta aberta de Fernando Nota, dirigida a Mário Ferro. Na referida missiva Nota pretendia aclarar-se junto de Ferro sobre a sua eventual ligação com a extinta secreta moçambicana, a SNASP, com que este foi conectado no livro “Ventos de Destruição”, obra essa que expõe passagens arrepiantes de sevícias de que Adelino Serras Pires, o filho e mais um indivíduo, foram sujeitos, partindo de um rapto na Tanzania até desaguar, vendados, na “Gulag” da Cadeia da Machava. Enquanto ficávamos a aguardar pela resposta de Mário Ferro eis que a vítima emerge com um documento “facsimile”:
Adelino Serras Pires divulga relatório da lavra de Mário Ferro (1)
Maputo, 24 de Junho de 1984
Sua Excelência
Presidente do Partido Frelimo
Presidente da República Popular de Moçambique
Marechal Samora Machel
Maputo
Actividade dos Bandos Armados em Portugal
1. Recrutamento de ex-comandos
Ex-comandos do Exército Português, naturais ou que viveram vários anos em Moçambique e se encontram radicados em Portugal, estão a ser recrutados para acções de sabotagem no interior do nosso País, com especial incidência em Maputo, a capital.
Um dos responsáveis é um indivíduo de nome Correia Mendes, natural da Ilha de Moçambique, ex-comando formado em Montepuez, integrando a 6ª ou 7ª Companhias de Comando.
Este Correia Mendes contactou, por exemplo, com um indivíduo de nome Nuno Branco, ex-comando da 1ª e 2ª Companhias de Comando, e que, no seu regresso a Portugal, após a proclamação da independência nacional, serviu no Batalhão de Comandos sob as ordens do coronel Jaime Neves.
A família do Nuno Branco era proprietária do Hotel Vera Cruz em Quelimane.
Actualmente, Nuno Branco reside na zona de Santo António dos Cavaleiros, em Lisboa, onde gere um restaurante.
Segundo as informações que me prestou Nuno Branco fora contactado pelo Correia Mendes para:
a) Acções de sabotagem contra
-Refinaria do Maputo
-Tanques de combustível do Maputo
-Instalações portuária do Maputo
b) (...)
Ao contactar Nuno Branco, Correia Mendes aliciou-o com o pagamento de 500 contos portugueses a seguir.
Nuno Branco disse-me que recusou a proposta do Correia Mendes, porque tem outros projectos e pelas razões seguintes:
1. Não pretende complicações com o Governo Moçambicano.
2. Recebeu uma proposta do Estoril-Sol para vir trabalhar em Moçambique.
3. Recebeu uma proposta para durante o período da FACIM/84, trabalhar no restaurante que irá ser explorado por um tal Armindo Ahmed, até há pouco tempo sócio da Pastelaria e Salão de chá Cortiço, na esquina das avenidas 24 de Julho e Vladimir Lénine, em Maputo.
4. Se fosse possível gostaria de voltar a explorar o Hotel Vera Cruz em Quelimane. Nuno Branco disse que houve ex-comandos, contactados pelo Correia Mendes que aceitaram a proposta, mas que desconheciam os respectivos nomes. Os ex-Comandos Portugueses têm uma associação em Portugal.
2. Actividade propagandística dos Bandos Armados
O dito porta-voz da chamada Renamo, Jorge Correia, tem distribuído regularmente comunicados à imprensa não só portuguesa como a que está acreditada em Portugal. Particular acolhimento é dado a esses comunicados pela imprensa da direita e extrema-direita portuguesa, por agências noticiosas e pelos correspondentes de jornais e agências noticiosas de vários países, acreditados em Portugal.
Um dos elementos em evidência é um correspondente da United Press International (UPI), de nome Sandy Alexander Sloop, cidadão norteamericano, que esteve muitos anos radicado no Brasil, antes de ser colocado há uns seis anos em Portugal.
Trata-se de um indivíduo com estreitas ligações com Jorge Correia e que, no ano passado, entrou ilegalmente no nosso país, acompanhado por um câmara-man de nacionalidade francesa, para a recolha de imagens dos Bandos Armados na região central do nosso País. Ele esteve, segundo me disse, na região da Gorongosa e junto à linha férrea Inhaminga-Beira.
O opinião de várias pessoas com quem contactei é de que Sandy Alexander Sloop é agente da CIA.
Aliás, foi por seu intermédio que tive conhecimento da conferência de Imprensa que os Bandos Armados pretendia dar (e vieram a dar) na última terça-feira, dia 19 de Junho, no Hotel Diplomático, em Lisboa. Foi a partir desta informação, transmitida ao Sr. Embaixador Baptista Cosme, em devido tempo, que foi possível registar-se uma tímida intervenção do Governo português, com a interrupção da conferência de Imprensa por agentes da Polícia Portuguesa.
Entre os comunicados distribuídos pelos Bandos Armados em Lisboa, destaco aquela em que o senhor Jorge Correia informa da “fuga precipitada de Samora machel e do seu Governo para Nampula”, onde foi fixada “a capital provisória”, devido a situação de “instabilidade e insegurança criada pelas forças da Renamo em Maputo”.
De salientar que a Radiotelevisão Portuguesa (RTP), o órgão de Informação de maior audição em Portugal, pouca ou quase nenhuma atenção dispensa aos comunicados e nem sequer fez referência nos seus noticiários e no telejornal a dita conferência de Imprensa.
Em contrapartida, no dia em que os bandidos armados deram a conferência de Imprensa, conseguimos cinco minutos da antena no Telejornal da RTP.
Depois de uma reunião com o Sr. Embaixador Baptista Cosme, durante a qual se abordou quais as respostas que poderiam ser dadas face às perguntas que eventualmente poderiam ser feitas, estive na RTP, onde fui entrevistado pelo jornalista Mário Crespo.
O tema foi o que este jornalista chamou de “Reformas Governamentais”, ao que contrapus com reorganização e reestruturação do aparelho do Estado, na sequência das decisões do 4º Congresso, como resposta para a liquidação do banditismo armado e da fome no nosso País.
3. Presumíveis acções na Tanzania
Encontram-se actualmente na Tanzânia os indivíduos de nome Adelino Serras Pires Júnior, mais conhecido por Tim-Tim, e Serras Pires Cardeano.
Ambos estão ligados a uma empresa de turismo cinegético, propriedade de um cidadão italiano. Esta empresa tem sede em Arusha e actividades em vários pontos da Tanzania.
Esses indivíduos, segundo soube, iriam trabalhar em coutadas no sul da Tanzania, portanto, junto à nossa fronteira norte.
Ambos pertencem aos Bandos Armados.
Continua na próxima edição
SEMANÁRIO PÚNGUÈ – 02.06.2005
Veja:
http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/2005/04/carta_aberta_a_.html