ANA DIAS CORDEIRO
O Washington Post acusa o Presidente nigeriano de corrupção.
O Presidente de São Tomé e Príncipe, Fradique de Menezes, anunciou ontem ter chegado a acordo com o chefe de Estado nigeriano, Olusegun Obasanjo, relativamente à atribuição de cinco blocos petrolíferos da zona de exploração conjunta com a Nigéria. Antes de iniciarem a exploração, prevista para 2007, as empresas contempladas desembolsam
nos próximos meses os "bónus de assinaturas", para pagar os direitos adquiridos, segundo as regras destes concursos, que neste caso totalizam 280 milhões de dólares (dos quais 40 por cento, ou seja, 112 milhões, para São Tomé).
Mas embora concluído, ao fim de vários meses de atraso, o processo continuará a ser contestado em São Tomé e Príncipe. Em declarações ao PÚBLICO, Carlos Neves, vice-presidente da Assembleia, manifestou-se "muito desiludido" com todo o processo "pouco transparente", que acompanhou enquanto presidente da comissão parlamentar para os
assuntos do petróleo.
Este segundo leilão—o primeiro aconteceu em 2003 caracteriza-se pela ausência de grandes multinacionais como a TotalFinaElf , a BP, a Shell ou a americana ChevronTexaco (que participou no primeiro leilão); é também notório o domínio de empresas nigerianas, ligadas
ao regime de Abuja e à Presidência são-tomense, que participaram no leilão e acabaram por ser contempladas.
Mohamed Asebelua, empresário nigeriano e ao mesmo tempo conselheiro especial para os investimentos externos do Presidente Fradique de Menezes em São Tomé, ê tido, nos meios especializados, como proprietário da Momo Petroleum e da Equinox Oil and Gás, com direitos no Bloco 2 e 3.
A ERHC, do milionário nigeriano Emeka Offor, ligado ao Governo de Abuja, e da qual o político são-tomense e aliado de Fradique de Menezes, Mateus Meira Rita, é sócio, excedeu as expectativas: ficou como operadora (responsável pela exploração) dos dois melhores blocos, com participações acima dos 60 por cento, embora associada às
americanas Devon (bloco 2)eNoble(bloco4).
Nestas duas zonas de exploração, destacam-se ainda, com participações menores, as nigerianas A&Hartman Resources e a Foby Engineering, do empresário Emmanuel Efoby, que goza do apoio do regime nigeriano.
A Conoil, do conhecido homem de negócios da Nigéria, Mike Adenuga e a Energy Equity Resources, do poderoso empresário, Aliko Dangote, com ligações familiares a Obasanjo, também conseguiram satisfazer as suas apostas.
A Sahara Energy, que obteve parte do Bloco 5 é propriedade do empresário Tony Cole, filho de um amigo de Obasanjo. E a companhia nigeriana, Filtim-Huzod, do político e empresário Chief Hope Uzodinma, conseguiu 85 por cento dos direitos de exploração no Bloco 6.
Estas pequenas empresas, sem experiência na área de exploração, associaram-se a companhias com reputação no sector, como a independente americana Anadarko, que fica com mais de metade dos direitos no Bloco 3.
A propósito deste processo, o Washington Post acusa o Presidente nigeriano, Olusegun Obasanjo, de corrupção, num editorial intitulado Corrupção na Nigéria, na sua edição de ontem. Numa evidente alusão à ERHC, o diário refere que uma empresa "controlada por pessoas com ligações políticas na Nigéria parece a favorita sobre uma concorrente
americana que ofereceu substancialmente mais". O jornal lamenta que Obasanjo esteja "sob grande pressão das elites corruptas do seu país" e lembra que "o Governo de São Tomé protestou contra o processo e exigiu um novo leilão".
Fradique de Menezes "será responsabilizado"
O anúncio da conclusão desta ronda culmina várias semanas de crise relacionada com suspeitas relativamente ao processo de decisão da distribuição dos direitos às empresas. As propostas contestadas nas últimas semanas por sectores são-tomenses não foram revistas e Carlos Neves responsabiliza Fradique de Menezes, que tomou uma decisão
individual, pelos prejuízos para o país que daí possam advir. Carlos Neves é da opinião de que o Presidente da República não tem poderes constitucionais para assinar sozinho, em nome do Estado, contratos petrolíferos Importantes para o futuro do país.
Embora o Tratado de Exploração Conjunta, entre a Nigéria e São Tomé e Príncipe, estabeleça que, na ausência de consensos nacionais, os dois chefes de Estado têm a última palavra, Carlos Neves faz notar que Fradique de Menezes é chefe de Estado e não chefe de Governo, enquanto Olusegun Obasanjo da Nigéria é chefe de Estado, chefe de Governo e ministro dos Petróleos do seu país. "Num regime semipresidencialista, como é o caso de São Tomé, o Presidente tem de concertar uma posição com o Governo e isso não aconteceu."
PÚBLICO - 02.06.2005