O líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, declarou-se "desapontado" com o tratamento que a FRELIMO dá ao multipartidarismo em Moçambique e acusou o partido no poder pela guerra civil que durou 16 anos, no balanço dos 30 anos de independência.
Por Manuel Matola da Agência Lusa
"Estou desapontado" com a forma como decorre o processo político em Moçambique, "sobretudo no sistema multipartidário", disse o líder do maior partido da oposição, em entrevista à Agência Lusa a propósito do 30º aniversário da independência do país, que se assinala no sábado, dia 25.
Afonso Dhlakama apontou a conquista "positiva" da independência e os acordos de paz de 1992 como "marcos importantes na vida dos moçambicanos que, logo depois de 1975, foram empurrados para uma guerra civil, porque a FRELIMO não aceitava as diferenças de opiniões".
"Durante estes anos aconteceram muitas coisas positivas, a começar pela própria independência, embora com isso, infelizmente, não tenhamos conseguido alcançar uma vida condigna, a democracia, justiça e liberdade sociais, aquilo que era difícil no tempo da dominação colonial", disse o presidente da RENAMO.
"E tudo, porque a FRELIMO não aceitou as diferenças de opiniões", defendeu.
"Deste modo", prosseguiu, "vimos pessoas serem levadas para os campos de reeducação, serem fuziladas e enterradas vivas porque não pactuavam com os ideais da FRELIMO. Vimos também pessoas serem mortas em pleno dia nos comícios populares, o que obrigou, mais tarde, a que houvesse uma reacção da população, através da guerra civil, o que valeu a pena".
"É claro que quando há guerra tudo pára e assim não há desenvolvimento económico, mas temos que reconhecer que era preciso que isso acontecesse para se criar um modelo democrático", disse Afonso Dhlakama, que esteve no lançamento, em 1986, da guerrilha contra o governo da FRELIMO.
O líder da RENAMO acusou ainda a FRELIMO de fazer "propaganda", ao afirmar que o antigo movimento rebelde de Moçambique tinha sido "instrumentalizado" pelo regime do "apartheid", da África do Sul, para fazer a guerra civil, frisando que "em nenhum momento, a FRELIMO atacou quaisquer bases da RENAMO no território sul-africano".
Reconheceu, no entanto, que a sua decisão de luta contribuiu para a regressão da economia do país, mas ressalvou que "foi a alternativa possível para que se criasse um modelo democrático, onde as famílias se livrassem das machambas estatais e deixassem de ser tratadas como escravas".
Dhlakama recusou que o regime marxista-leninista tenha sido proposta colectiva da FRELIMO, sustentando que "o objectivo de Eduardo Mondlane (fundador da FRELIMO, assassinado em 1969) não era implantar o comunismo em Moçambique, (e) talvez seja por isso que o assassinaram".
"É claro que ele (Mondlane) pretendia libertar Moçambique para que o povo escolhesse livremente os seus líderes, mas os comunistas da FRELIMO decidiram instalar esse regime, assassinando Mondlane", acusou, referindo-se a um crime geralmente atribuído à PIDE-DGS.
O presidente da RENAMO reconheceu no sistema de alfabetização de adultos "a coisa excelente" que a FRELIMO fez logo depois da independência, em 1975, porque permitiu que muitos idosos, incluindo a sua mãe, já falecida, pudessem aprender a ler e a escreve em português.
"O outro lado positivo da independência foi ver pela primeira vez um moçambicano (Samora Machel, falecido em 1986), representando o nacionalismo, a governar o país. Para mim foi uma honra depois de 500 anos de dominação colonial", comentou.
"É claro que ele era um Presidente que só lia discursos escritos pelos comunistas, porque não percebia nada disso, mas foi uma figura simbólica do nacionalismo moçambicano", disse.
A independência "foi positiva só porque o colonialismo português abandonou Moçambique e o país tornou-se livre, governado pelos moçambicanos, mudámos a bandeira e já não entoamos o hino português", acrescentou.
A abertura do mercado nacional ao investimento estrangeiro e o sistema democrático "ainda fragilizado" são outros pontos positivos destacados por Dhlakama.
"Não há comparação, por exemplo, com os últimos 15 anos, apesar de ainda termos muitos problemas. Estamos a marcar passo, por causa da fraude qualificada em todos os processos eleitorais e isso é um problema porque cria 'stress' nas pessoas, sobretudo nos jovens que perguntam qual o rumo de Moçambique", lamentou o candidato derrotado nas três eleições presidenciais do país.
"Agora, com o novo executivo liderado por Guebuza (presidente moçambicano) as coisas estão a piorar, pois este está a agir como se fosse alguém que esteve no exílio durante anos e que pretende corrigir os erros cometidos pelo seu antecessor, Joaquim Chissano", acusou.
"A família moçambicana está triste, por estar num país dirigido por comissários políticos", concluiu Dhlakama.