“O colono deixou-nos com a herança de não sabermos roubar”, jurista e defensora dos Direitos Humanos em Moçambique, Maria Alice Mabota ao “vt”
(Maputo) Esta semana o balanço dos 30 anos da independência é com Maria Alice Mabota, presidente da Liga Moçambicana dos Direitos Humanos (LDH). Ela é da opinião de que a aquisição da própria independência foi o melhor acontecimento dos últimos 30 anos. Por outro lado, enumerou a criminalidade e injustiça contra os moçambicanos como as marcas negativas dos 30 anos e como desafios aponta o combate contra a corrupção.
Para a defensora e activista dos direitos humanos, “a quisição da independência total e completa de Moçambique a 25 de Junho de 1975 foi o acontecimento que me marcou pela positiva nos últimos 30 anos, porque com este acto solene, o povo moçambicano adquiriu a dignidade de ser alguém na vida. Com a aquisição da Independência Nacional desenvolvemos a cultura, o modo de viver dos cidadãos, de expressar e a identidade, para além de muita coisa boa”.
Mabota recordou-se com saudades das jornadas de trabalho de campo que aconteceram nos primeiros anos da independência: “nós aproveitámos as máquinas que os colonos tinham abandonado, bem montadas no campo e fomos participar em várias jornadas de produção do arroz no Chókwè e de ananaz em Goba. Dormiámos no campo e trabalhavamos com convicção de que tudo o que faziamos era para o nosso País”.
Conforme a nossa fonte, “o colono deixou-nos com a herança de não sabermos roubar. Naquela altura o moçambicano tinha o espírito de trabalho. O que estragou o nosso País, foi de rotular todos os que tinham ideais contrárias do regime como inimigos. Por exemplo, as pessoas que logo nos primeiros anos da independência defendiam o multipartidarismo foram conotados como inimigos. Matou-se pessoas por causa de vender açúcar e camarão mas hoje, há tráfico de drogas e armamentos. Será que terá valido a pena sacrificar-se essas pessoas?”.
Por outro lado, falando sobre a guerra de desestabilização, Mabota disse que “a guerra dos sul-africano e rodezianos encontrou terreno fértil porque houve muitas pessoas maldosas que olhavam os outros como inimigos no lugar de ouvirem as suas ideias” e sublinhando que “falar da guerra é coisa do passado. É melhor que se fale da criminalidade que é o mal que afecta a sociedade neste momento”.
Outra lamentação feita por Mabota, está relacionada com o facto de no país não se valorizar a pessoa formada: “esse é um dos males que aconteceu nos trinta anos da independência. Os nossos formados não são acarrinhados”, recordando com mágoa o caso dos trabalhadores da Mozal que foram expulsos da empresa por reivindicarem salário igual ao dos sul- africanos que com a mesma formação ou inferior ganham muito mais que os moçambicanos”.
COMBATER A CORRUPÇÃO
Para que Moçambique possa desenvolver, Alice Mabota acha que “é necessário acabar-se com a herança da corrupção. O combater a pobreza deve ser depois de outros males da sociedade e a corrupção é um deles . Para mim a corrupção atingiu um nível muito alarmante neste País e considero este mal como um dos piores fenómenos que apareceu nos 30 anos da independência”.
Como acção prioritária para o combate a corrupção neste momento, a nossa entrevistada considera que é preciso “criar trabalho para a população. Mesmo os presos deviam trabalhar. Os presos é que deviam limpar os cemitérios; ajudar a limpar a cidade ao invés de ficarem na cadeia a tirar-se piolhos uns aos outros e depois planificar novos crimes”.
Sobre o desempenho do novo Governo saído das Eleições Gerais de Dezembro último, Mabota acha que “o presidente Guebuza está a tomar o barco sozinho. Os outros membros do Governo só dizem que o presidente disse para fazer isto ou aquilo. Assim, está-se a dar muito trabalho ao presidente. Essa coisa de deixar tudo nas maus do presidente é abrir caminho para que ele se torne autoritário” e acrescentando que “ainda não vi nenhuma acção a ser implementada daquilo que foi prometido pelo Governo e a criminalidade continua a aumentar”.
Mas acima de tudo, para a nossa interlocutora o maior desafio para o país é acabar com a corrupção e “limar o fuso entre ricos e pobres”.
(Arménia Mucavele) - VERTICAL - 21.06.2005