Parque Nacional está a ser reabilitado
Búffalos, elefantes, rinocerontes, gazelas e zebras estão a regressar em força ao Parque Nacional da Gorongosa, em Moçambique, ao abrigo de um projecto internacional de reabilitação que envolve os esforços de americanos, portugueses e moçambicanos.
Agora, sob a coordenação da Carr Foundation - uma instituição criada em 1999, pelo milionário e filantropo norte-americano Gregory C. Carr - o Parque Nacional da Gorongosa está no bom caminho para voltar a ser uma das principais reservas naturais de protecção da vida selvagem em África.
O memorando de intenções assinado em Outubro de 2004, com o Ministério do Turismo moçambicano, sob a égide do então Presidente Joaquim Chissano, consagra o investimento global de 36 milhões de dólares (31 milhões de euros) no projecto de recuperação desta área de 3770 quilómetros quadrados, na Província de Sofala, em pleno centro de Moçambique.
Greg Carr frisa o carácter de longo prazo do seu compromisso de desenvolvimento do Parque Nacional da Gorongosa, nos próximos 30 anos. «Temos de planear a nossa intervenção em várias fases: conservação, sócio-económica e turística. Este projecto motivou-me, porque é uma combinação entre uma acção de protecção da natureza e um projecto de desenvolvimento económico. Trata-se de usar a beleza do ecossistema para combater a pobreza».
Prioridade ao repovoamento
Assim, a primeira fase passa pelo repovoamento dos animais dizimados por caçadores furtivos durante as duas décadas de guerra que se seguiram à independência do país. O filantropo americano reconhece que «houve algum esforço de restauração, logo a seguir à guerra, mas o parque precisava de uma nova injecção de dinheiro».
Com recurso aos fundos disponibilizados pela Carr Foundation, está já a ser construída uma vedação em torno de uma área com 5000 hectares, especialmente vocacionada para a reprodução de animais, nomeadamente, rinocerontes e búfalos que serão depois libertados no parque. «Os elefantes estão a regressar - existem cerca de 250 -, mas só temos uma manada de 35 búfalos e, apenas, sete leões», revela. Paralelamente, serão desenvolvidos estudos hidrológicos, da flora e da fauna, com recurso a meios de detecção por satélite, envolvendo cientistas americanos e moçambicanos da Universidade Eduardo Mondlane, do Museu de História Natural de Maputo e da empresa de consultoria ambiental Impacto, liderada pelo biólogo e escritor Mia Couto.
Os responsáveis por este projecto de recuperação também gostariam de ver a Serra da Gorongosa (onde nascem os rios que irrigam a reserva) incluída no perímetro do parque e estão a trabalhar na legislação que visa criar uma "zona tampão" de protecção nas zonas limítrofes, onde existem 12 aldeias tradicionais.
«Estamos muito envolvidos com as populações - assegura Greg Carr - essa é a nossa grande diferença em relação a outros parques, em que há autênticas batalhas para afastar os habitantes locais. Nós, pelo contrário, queremos incluir as pessoas no sucesso do parque, gerando empregos para elas mas, também, possibilitando-lhes a criação dos seus próprios negócios».
No futuro, 20% das receitas do parque reverterão para as comunidades locais, que serão objecto de um recenseamento com vista à determinação das suas necessidades mais prementes nos domínios da saúde, educação e abastecimento de água.
Ecoturismo
Greg Carr recorda que, no passado, «a Gorongosa apresentava a maior densidade de animais em África» e que as razões para isso estão nos diferentes ecossistemas da região. «Existe uma grande diversidade de ecossistemas, numa superfície relativamente pequena: planícies, savanas, rios, lagos e dois tipos de floresta húmida, que criam uma abundância de vida selvagem e cenários de grande beleza. Uma oportunidade para o turismo tremenda», comenta.
Na opinião do milionário americano, «a Gorongosa pode ser o motor económico de Moçambique, atraindo dezenas de milhares de turistas por ano, que vão ao parque, mas também, a outras regiões do país e gastam dinheiro nas viagens, no alojamento e no comércio e serviços». Numa fase inicial, Greg Carr aponta para «um total de 100 mil entradas, um número que considera realista quando comparado com os dois milhões de pessoas que visitam anualmente o Kruger Park, na vizinha África do Sul».
Além do vulgar turista, a promotores do Parque Nacional da Gorongosa querem reunir todas as condições para atrair cientistas e outros estudiosos do mundo animal. Para o efeito, «vai ser construído um centro permanente de Ciência para investigadores convidados», revela Vasco Galante, responsável pelo desenvolvimento turístico do empreendimento.
No próximo ano, será dado início à construção dos primeiros "lodges", mas só em 2007 o parque estará equipado para organizar safaris na rede de picadas, actualmente, em fase de preparação. Todavia, «o parque já está a receber visitas de turistas com um espírito mais aventureiro - revela Vasco Galante - são, normalmente, italianos, suíços e holandeses, que se deslocam nas suas próprias viaturas e com todo o equipamento de campismo. Dispomos de chuveiros e de um pequeno restaurante no Chitengo». O aldeamento construído pelos portugueses no tempo colonial será, posteriormente, transformado num campo educacional para crianças moçambicanas e dotado de um museu, acrescentou o mesmo responsável.
Portugal apoia recuperação
De passagem por Portugal, Greg Carr foi recebido pelo secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, João Cravinho, a quem o milionário americano apresentou o projecto de recuperação do Parque Nacional da Gorongosa. À saída do encontro e satisfeito com a receptividade demonstrada, Carr revelou que o Governo Português vai facilitar os contactos e apoiar a recolha de documentação sobre o parque no Arquivo Histórico Ultramarino, na Cinemateca e na RTP. «Há muitos portugueses que conservam memórias e fotografias antigas da Gorongosa que gostaríamos de reunir. O Parque Nacional da Gorongosa é um espaço onde portugueses e moçambicanos poderão partilhar a sua história comum», concluiu.
Formado em Harvard, nos anos 80, Greg Carr fez fortuna nos primórdios da economia da informação, à frente de empresas como a Boston Technology e os servidores de Internet Prodigy e Africa Online. Em 1998, renunciou a todos os cargos e vendeu as suas participações para criar o Carr Center for Human Rights Policy, o Idaho Human Rights Education Center, o Market Theater e a fundação com o seu nome.
Conhecido pelas suas campanhas anti-racistas e em prol dos direitos humanos, Greg Carr concentra, aos 45 anos, as suas atenções no desenvolvimento social e na protecção da biodiversidade em África. «Este é o projecto mais belo da minha vida - confessa - sempre pensei que, se algum dia fosse rico, passaria a minha vida a fazer as coisas com que, realmente, me preocupo».
Alexandre Coutinho - EXPRESSO AFRICA - 03.01.2006
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