ANA DIAS CORDEIRO
Legislativas foram agendadas para 26 do próximo mês. Presidenciais
estão previstas para o segundo semestre.
O Presidente de São Tomé e Príncipe, Fradique de Menezes, marcou as
eleições legislativas para 26 de Março, pondo fim à recente polémica
sobre a demora no anúncio do escrutínio, criticada por alguns
partidos políticos que se querem preparar para a votação. A alocução
do chefe de Estado são-tomense ontem à tarde estava a ser aguardada
com especial atenção, sobretudo depois das recentes acusações de
corrupção envolvendo os dois últimos ministros dos Negócios
Estrangeiros, da sua confiança política. Sobre isso o Presidente não
falou.
Ovídeo Pequeno, actual chefe da diplomacia demissionário e Mateus
Meira Rita, embaixador na Nigéria, ex-ministro dos Negócios
Estrangeiros, e ex-director do gabinete de Fradique de Menezes, foram
acusados de desvio de fundos de um programa de cooperação do reino de
Marrocos, por uma investigação da Inspecção-Geral das Finanças são-
tomense. O Inquérito foi instaurado pela primeira-ministra Maria do
Carmo Silveira, depois de a imprensa são-tomense ter implicado Ovídeo
Pequeno no desvio de cerca de 400 mil euros da cooperação marroquina.
O documento dos inspectores das finanças atribui "irregularidades e
infracções" na gestão dos recursos destinados a programas de carácter
social e económico, confirmando as acusações contra Ovídeo Pequeno e
responsabilizando também Mateus Meira Rita pelo desvio de 150 mil
euros quando ainda era ministro, e que hoje é embaixador na Nigéria.
Enquanto chefe da diplomacia de um dos países que presidiu até final
de 2005 a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Ovídeo
Pequeno chefiou várias missões da organização e foi presidente em
exercício do conselho de ministros da CPLP.
A primeira-ministra invocou falta de lealdade do seu ministro na
forma como terá ocultado informações sobre o programa de cooperação
marroquina e pediu a sua demissão. Ovídeo Pequeno pôs o cargo à
disposição, desmentindo as acusações de que é alvo, mas mantém-se em
funções à espera de uma posição oficial de Fradique de Menezes.
Este caso levou o MLSTP-PSD a responsabilizar, mais uma vez, o
Presidente da República pela instabilidade no país. A propósito dos
desvios de fundos da cooperação, a primeira-ministra Maria do Carmo
Silveira aludiu a uma apropriação da política externa, por parte do
Presidente da República, queixando-se da falta de cooperação
institucional.
Fradique de Menezes, por sua vez, acusou Maria do Carmo Silveira e o
seu partido de quererem abalar a imagem da Presidência e com isso
tirar proveito político, em vésperas de eleições legislativas às
quais também concorre o MDFM/ PCD, partido que apoia Fradique de
Menezes.
Nestas legislativas, que decorrem antes das presidenciais previstas
para o segundo semestre de 2006, o Presidente também joga o reforço
da correlação de forças do seu partido, para com isso influenciar a
escolha, que caberá à Assembleia, de um sistema em que o chefe de
Estado terá maior ou menor poder, num regime presidencial ou
semipresidencial.»
Confirmados conflitos de interesses nos negócios do petróleo
Fradique de Menezes não se pronunciou sobre o relatório da
Procuradoria-Geral da República (PGR) são-tomense, que em Dezembro
confirmou suspeitas de irregularidades na atribuição dos blocos
petrolíferos na zona de exploração conjunta com a Nigéria. O
documento confirma ainda os prejuízos para São Tomé e Príncipe
decorrentes da assinatura de um contrato com a ERHC, empresa detida
por um empresário nigeriano próximo do poder de Abuja e da qual
também são sócias algumas figuras próximas de Fradique de Menezes,
como o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, Mateus Meira Rita,
agora embaixador na Nigéria.
O contrato com a ERHC pode resultar em perdas de 60 milhões de
dólares (50 milhões de euros) num país cujo orçamento anual é de 50
milhões de dólares (41 milhões de euros), conclui o inquérito da PGR
são-tomense que em Janeiro teve o apoio da coligação internacional
Publish What You Pay (Publiquem o que Pagam) — criada em prol da
transparência das relações entre as petrolíferas e os governos dos
produtores.
No segundo leilão de blocos da zona conjunta, em 2005, empresas sem
qualificação técnica e financeira foram favorecidas em detrimento de
ofertas mais credíveis, conclui o documento, que recomenda a anulação
desse leilão e questiona a validade do contrato com a ERHC
prejudicial para São Tomé e que pode ter resultado de pressões
políticas, lembrando que os presidentes Fradique de Menezes e
Obasanjo da Nigéria subscreveram o Iniciativa para a Transparência
nas Indústrias Extractivas e assinaram a Declaração de Abuja que
promete uma gestão transparente das receitas do petróleo.
PÚBLICO - 07.02.2006