Eleições de 2004
(Maputo) O «Canal de Moçambique» apurou que nas Eleições Gerais de 2004 só duas Comissões Provinciais de Eleições (CPEs) das 11 que existem em Moçambique para monitorar procedimentos eleitorais, mais precisamente as da Zambézia e de Sofala, centralizaram os resultados, distrito por distrito, como se exige na Lei Eleitoral. Na província de Nampula o apuramento distrito por distrito foi iniciado mas acabou sendo interrompido por ordens da CNE em Maputo. Semanas a fio tentámos confrontar os dados em nosso poder com o porta-voz da Comissão Nacional de Eleições (CNE), Dr. Filipe Manjate, que também exerce um cargo na direcção de uma empresa internacional de auditoria em Maputo. Não foi possível. Sistematicamente ele furtou-se ao diálogo com a imprensa e particularmente com o autor destas linhas.
As fontes do «Canal de Moçambique» que sustentam a informação que acima veiculamos fazem parte do aparelho da Comissão Nacional de Eleições, mas, estão impedidas de falar à imprensa, alegando exigências regimentais daquele órgão. Conseguimos, no entanto, os seus comentários com o compromisso de não divulgarmos os seus nomes.
Com a indisponibilidade de Filipe Manjate que já foi vice-ministro da Justiça de um governo da Frelimo, agravam-se as suspeitas de que algo errado continua a ter de ser escondido.
O Conselho Constitucional, sem que estes pontos acabem por ser devidamente esclarecidos, embora tenha decidido em última instância e das suas decisões não haja recurso, fica assim também comprometido por ter dado aval a uma contabilidade eleitoral até hoje enferma de suspeitas cada vez mais sustentadas e que descredibilizam as eleições em Moçambique perante, sobretudo, os candidatos e eleitores.
Sucede, porém, que hoje o ponto não é o passado. Trata-se antes de apreciar o que suscitou todo este ambiente com características de vício e procurar contributos para que a Assembleia da República encontre matéria com mais substância para se deixar de procurar impedir uma revisão séria da Lei no que respeita à CNE e à operacionalidade do sistema eleitoral.
Segundo as fontes que aceitaram conversar connosco, tanto a CNE como o Conselho Constitucional não tiveram os mapas com os resultados dos distritos, distrito por distrito, de cada província ou círculo eleitoral. Ou seja, a CNE divulgou os resultados nacionais sem que antes tivesse tido acesso aos mapas com dados dos distritos. Por seu turno, o Tribunal Constitucional validou e proclamou os resultados que a CNE lhe submeteu nas condições referidas e a enfermar de tais lacunas.
As nossas fontes associam o sucedido à pressão que as Comissões Provinciais de Eleições sofrem durante o apuramento eleitoral. Ficam desnorteadas, por não conseguirem apresentar os resultados dentro dos prazos preceituados pela lei para o efeito do apuramento distrito por distrito, e alegam sobrecarga de trabalho. Tudo se concentra nas capitais provinciais e o exercício de contagem dos editais e análises das actas e protestos vários, todos provenientes das assembleias de votos, ao longo da província, suscita um ambiente de nervosismo tremendo que acaba sendo ultrapassado com medidas que violam a Lei. Medidas essas que acabam sendo tomadas apenas por uma parte dos membros da CNE contra o desespero dos representantes da outra parte que acaba boicotando o funcionamento do órgão eleitoral para não se chegar a vias de facto.
A lei eleitoral fixa um prazo máximo de sete dias para o presidente de cada CPE, anunciar os resultados na respectiva província. Este prazo, nas Eleições Gerais de 2004, foi largamente ultrapassado na generalidade das CPE´s.
De acordo com as fontes da CNE por nós ouvidas, o grande problema que dita o não cumprimento dos prazos pelas CPEs e a não centralização dos resultados, distrito por distrito, é a existência de um vazio legal na actual lei eleitoral que não dá a possibilidade às Comissões Distritais de Eleições de serem elas a efectuar ao seu nível os apuramentos dos resultados a partir dos editais e actas provenientes das assembleias de voto dos respectivos distritos.
Na óptica dos nossos interlocutores, quando (ou se...) as CDE´s passarem a fazer o apuramento distrital o trabalho vai ficar mais simplificado uma vez que estarão a lidar com pouco volume de dados facto que também facilitará a análise de todo o expediente eleitoral.
O papel das Comissões Distritais de Eleições (CDE) na actual legislação resume-se apenas em recolher todo o material de votação, incluindo boletins de votos e as respectivas actas e editais e posteriormente procederem a sua entrega ás CPE.
As nossas fontes consideram que para se evitar a sobrecarga excessiva de trabalho as CPE, deveriam ser as CDE a procederem ao apuramento distrital e produzirem os respectivos editais e actas. A ser assim, segundo as explicação das fontes da CNE, as CPEs deveriam fazer apenas, por seu turno, o apuramento provincial, a partir dos editais e actas distritais. Também só iriam dirimir apenas os conflitos que as CDE não tivessem conseguido fazê-lo ao nível distrital. Actualmente, as CPE fazem o apuramento contabilizando milhares de editais, conferindo as respectivas actas e dirimindo os conflitos, tudo isso, produzido nas assembleias de voto ao longo de toda a província. Para as nossas fontes é uma tarefa excessiva e muito fatigante. Acham elas ainda que para além do mais o processo como manda a actual lei é pouco transparente e tem ainda o inconveniente de desembocar em protestos de vária ordem entre os concorrentes, sobretudo aqueles que acabam perdendo. (J.Chamusse)
CANAL DE MOÇAMBIQUE - 23.02.2006