Está todo o mundo em polvorosa na cidade de Maputo, e arredores, só porque a justiça moçambicana possui indícios incriminatórios que justificam que o cidadão Nyimpine Chissano seja chamado a instâncias competentes para demonstrar a sua inocência perante tais indícios, limpando, desse modo, a sua imagem, ou, em caso de não ser inocente, que seja condenado a penas equivalentes à gravidade do delito cometido, castigando-o como se castigam os demais cidadãos deste mundo, quando pratiquem actos contrários aos previstos na Lei, dessa forma se assegurando a boa harmonia e convivência da sociedade.
Custa-nos imenso entender o porquê de frenéticas tentativas de obstrução da justiça, simplesmente porque, o visado, desta vez é o cidadão Nyimpine Chissano.
É que, de acordo com a Constituição da República de Moçambique, Nyimpine Chissano goza, exactamente, dos mesmos direitos que Nenwasse Khongolo, camponesa da Aldeia 25 de Junho, em Mondiana, Chibuto, ou kudjira Matchebesse, professor no Búzi, ou Assinanhe Amde, polícia em Ancuabe dos mesmos direitos que personagens sobre quem nunca ninguém se preocupou tanto aquando do seu vilipêndio público, por se recusarem a ceder as suas únicas terras para dois mega-projectos patrocinados pelo Estado moçambicano.
Agora, só porque o cidadão Nyimpine é convocado pela justiça, se movem mundos e fundos, incluindo a inaceitável interferência do prestígio público dos pais, para condicionar procedimentos judiciais normais, como se o seu julgamento constituisse o desabamento da República de Moçambique!
Em nosso modesto entender, o melhor sítio para o cidadão Nyimpine Chissano limpar a sua imagem é o tribunal, pois, antes do seu julgamento continuará a pairar a suspeição de que ele, de facto, foi mandante exactamente da morte de Carlos Cardoso, em Novembro de 2000, acusação que pesa sobre ele desde que, em finais de 2002, os arguidos do “caso Cardoso” associaram, de forma grave, o seu nome com aquele hediondo crime.
Aliás, ainda não entendemos por que é que o Senhor Nyimpine Chissano ainda não requereu, pessoalmente, um julgamento rápido com vista a limpar-se o mais rapidamente possível a sua imagem, inocente que ele sempre se declarou!
É que não sabemos se, por falta de uma assessoria condigna ou por estratégia pessoal, mas a experiência mostra que o comportamento normal de um inocente não é este que o compatriota Nyimpine tem vindo a evidenciar. O comportamento normal de um inocente é o de demonstrar muita avidez pelo rápido julgamento do caso, com vista a livrar-se das acusações sobre a sua pessoa. É de exigir que o julguem o mais rapidamente possível, a fim de ficar livre da suspeição popular, atitude que o nosso compatriota não tem privilegiado, talvez por razões estratégicas.
Seja como for, sempre fomos a favor de que o processo autónomo aberto na sequência das declarações dos arguidos do “caso Cardoso” fosse levado até às últimas consequências, pois sempre deu má imagem ao sistema judicial moçambicano iniciar casos e deixá-los pendurados no ar, alegadamente, por interferência ou pressões do poder executivo, do qual o nosso poder judicial ainda depende muito, em termos, pelo menos, materiais.
Em caso de o cidadão Nyimpine Chissano ser considerado culpado da morte do jornalista Carlos Cardoso, o mesmo deve ser severamente punido, tal como são punidos outros cidadãos que se envolvam em crimes da mesma natureza. Em caso de ser considerado inocente, o mesmo deve ser ilibado, tal como são ilibados outros cidadãos considerados inocentes pelas instâncias judiciais. O que não nos parece aceitável é a tentative de obstrução da justiça quando o indiciado é filho, irmão ou primo de alguém que detém influência sobre o poder politico e, consequentemente, sobre o poder judicial.
Nós, neste jornal, já comparecemos várias vezes nas barras dos tribunais, acusados de difamação de certas figuras públicas deste País. Serenamente, enfrentamos as acusações e, nalgumas, saímos absolvidos, noutras, saímos culpados e assumimos, naturalmente, a nossa responsabilidade civil e criminal nesses casos.
É que não vemos como é que num Estado de Direito, que pretensamente estamos a construir, as coisas poderiam ser feitas doutra maneira.
Estado de Direito (rule of Law) significa governo da Lei, isto é, um Estado subordinado ao respeito escrupuloso da Lei. Ora, a lei moçambicana diz que todos nós devemos ser responsabilizados pelos nossos actos, mas, de repente, vemos ex-legisladores profundamente atrapalhados quando a lei está para ser aplicada, em sua casa.
Afinal, essa lei é para ser aplicada aonde? Não é em Moçambique e sobre todos os moçambicanos?
Nós pensamos que o governo moçambicano deve desencorajar a violação, pelos seus membros activos ou inactivos, da legalidade em Moçambique e deve deixar o sistema judicial funcionar normalmente, com vista a construirmos um país decente e respeitado pelas demais nações.
O que faz as pessoas respeitarem um país, como por exemplo a RAS, é sobretudo a independência do seu sistema judicial, em que os cidadãos sabem que ninguém ali está acima da lei, seja Presidente da República, Vice-Presidente da República, ou seus filhos e familiares, pois todos estão sob o governo da Lei.
Nessas circunstâncias, os cidadãos ficam seguros de que não vão ser abusados ou assassinados por ninguém que, na hora da sua perseguição, se vai refugiar na cancela do poder político para dizer: “Aqui, ninguém me toca porque o meu pai, tio, marido ou esposa é do poder!”, como, às vezes, assistimos, tristemente, entre nós, nesta caricatura de Estado de Direito.
Portanto, repisamos, não vemos por que razão, o cidadão Nyimpine Chissano, sendo ele inocente como se declara, não se apresenta, voluntariamente, às autoridades judiciais, exigindo celeridade na tramitação do seu julgamento, com vista a limpar-se o seu nome da suspeição popular, para ele voltar a ser visto como aquele jovem empresário batalhador.
Pensamos que esse é o caminho mais aconselhável para todos os inocentes. Mas, não querendo seguir esse caminho, então, que facilite o trabalho das instâncias judiciais competentes, colaborando com a justiça, como aconselham a lei e a boa educação.
Para nós, o “caso Nyimpine Chissano” constitui uma “prova de bala” da maturidade do processo de construção do verdadeiro Estado de Direito em Moçambique.
Se o mesmo for conduzido com isenção e independência pelo nosso sistema judicial, este sairá mais credibilizado e respeitado pelos cidadãos, que passarão a ver nele o verdadeiro fiel da balança na resolução de querelas sociais e políticas. Se ele claudicar, ou se deixar manipular por interesses estranhos à justiça, então, o nosso judiciário sai deste processo chamuscado, irrelevante para os cidadãos e inútil para o País.
E nós merecemos um sistema judicial sério, credível, justo e de confiança dos cidadãos. Tudo está nas mãos dos senhores magistrados!
Salomão Moyana - ZAMBEZE - 18.05.2006