Espinhas
Por Fernando Lima
É lugar comum dizer-se que os homens não se medem aos palmos.
A crise de Timor-Leste fez emergir Mari Alkatiri como um político de longo alcance no pequeno país do crocodilo. Mesmo que para tal tivesse de abdicar da chefia do Governo, cargo que lhe foi conferido constitucionalmente e por mérito inquestionável.
Timor-Leste viveu nas últimas semanas, nos últimos dias, o pesadelo da confrontação violenta.
Mesmo invocando os direitos que lhe assistiam a si e à Fretilin como partido maioritário democraticamente plebescitado, Alkatiri soube compreender que outros valores mais altos estavam em causa para além do esgrimir de argumentos legais contra um Presidente de opereta, enredado nas suas próprias contradições.
Na fase mais crucial da crise, também Ramos Horta, outro protagonista central dos últimos acontecimentos, soube compreender o que estava em causa. Soube ver para além do seu ego e ter em mente as décadas de trabalho quase solitário a que se entregou pela causa de Timor-Leste. Soube perceber que tudo poderia ser deitado a perder, também por ele que soube ver a janela de oportunidade para Timor, quando a ditadura indonésia foi ferida de morte.
Tem-se argumentado que Ramos Horta se colocou do “lado errado” da contenda, alinhando com um Presidente populista e debilitado fisicamente. Que cedeu finalmente à tentação de trazer para a praça pública as suas divergências de longa data com Alkatiri e a Fretilin. Como o fez nas últimas semanas nas páginas de opinião do “Wall Street Journal”. Manda a verdade dizer que não são ambições pessoais que movem José Ramos Horta. Há muito que o seu pequeno país é demasiado pequeno para as suas ambições. Horta, Prémio Nobel por mérito próprio, tem à sua mercê um lugar de topo em qualquer organismo internacional do sistema das Nações Unidas.
Ao contrário do que alguns argumentam, Horta não quer ser Presidente nem Primeiro-Ministro.
Como Alkatiri foi igualmente empurrado para a cadeira do executivo.
Não é clara ainda a solução a encontrar para o drama de Timor-Leste vivido nas últimas semanas. Mas estão para já criadas algumas condições para que o país possa respirar em paz, sem o perigo da confrontação.
Alkatiri “engoliu” o revés do afastamento do Governo “vendendo” à Fretilin uma nova vitória em eleições a convocar para 2007. Horta usou toda a sua capacidade de influência junto de Xanana Gusmão para re-equacionar o papel da Fretilin numa solução intermédia até às eleições e sem passar pela dissolução do parlamento, como pretendiam todos os que queriam a cabeça de Alkatiri.
Ramos Horta e Alkatiri adiaram para já o cenário de países mais ou menos hipotecados como o são, infelizmente, a Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe.
Resta saber o que é que Xanana Gusmão vai aprontar para o próximo “round”, com aconselhamento da esposa .. e do Benfica, o seu clube do coração.
SAVANA - 30.06.2006
NOTA:
Moçambique não é um país hipotecado? Quem lhe cobre mais de 50% do orçamento de Estado?
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE