Pânico e luto em Maputo
Elevado número de vítimas e enormes prejuízos materiais
Com indignação geral pede-se, e já, a demissão imediata do ministro da Defesa, Tobias Dai, cunhado do presidente da República
Cerca das 16:15 horas de ontem a capital moçambicana foi surpreendida por violentas explosões no paiol militar de Malhazine, no distrito urbano n.º 5, que acabariam por se saldar, num número ainda não especificado de mortos, mais de uma centena de feridos graves, confirmados, e pânico generalizado dada a intensidade das explosões que se prolongaram por mais de 5 horas e prosseguiram com Pânico e luto em Maputo, rebentamentos esporádicos noite adentro.
Contudo, repórteres do «Canal de Moçambique» posicionados no principal hospital do país, cerca da meia noite davam conta que as autoridades estavam a esconder a verdade sobre o número de vítimas, alegadamente para tentarem reduzir a indignação que tomou conta da população de Maputo e do país em geral, por mais um caso que atribuem ao desleixo a que o governo votou matérias de responsabilidade.
Na televisão pública, Edgar Cossa, indicado como porta-voz do Ministério da Defesa, fez o balanço em 9 mortos e 99 feridos quando eram aproximadamente 22 horas.
Sensivelmente à mesma hora, num contacto telefónico com Jeremias Government, Oficial de Dia na morgue do Hospital Central de Maputo, o «Canal de Moçambique» apurou 15 mortos confirmados, mas a fonte alertava que estava à espera de mais e que mais tarde poderia dar informações mais precisas. Os feridos já eram também a essa hora, mais de cem. Feridos graves. Mais tarde voltámos a ligar à fonte, cerca das 23 horas, e ele pediu desculpas por ter de desligar dado que estavam a chegar mais cadáveres à morgue do HCM.
Os números que o «Canal de Moçambique» avança só reflectem parte do movimento na principal unidade hospitalar do País, faltando fazer o rastreio de outros importantes hospitais periféricos, tanto de óbitos como de feridos.
Um porta-voz do Ministério da Defesa nos primeiros momentos da ocorrência pedia calma à população e apontava um curto-circuito como a causa da deflagração do incêndio que acabaria por detonar uma imensa carga de diversos artefactos militares de pequeno e grande calibre.
No entanto, factores técnicos aconselham a que se rejeite tal hipótese.
Observadores abalizados admitiram em conversa com o «Canal de Moçambique» que possa ter-se tratado de uma faísca causada pela fricção de duas superfícies metálicas, faísca essa resultante de roubo de material para venda às sucateiras.
Dificilmente esta probabilidade poderá ser confirmada dado que a ser o caso os autores terão perecido, desintegrando-se.
Segundo desastre em três meses
Esta foi a segunda ocorrência do género este ano. Em Janeiro, o ministro da Defesa prometera que seriam tomadas providências para se evitar a repetição do desastre.
No entanto, menos de dois meses depois da primeira tragédia, ontem o desleixo voltou a fazer sangue, tendo desta vez o desastre assumido proporções tão graves que fez com que nos canais de televisão privada os espectadores apelassem, ora telefonicamente, ora via sms, para a demissão imediata do ministro da Defesa, general Tobias Dai, em nome de uma democracia responsável e responsabilizante.
Tal era também a tónica dominante das conversas em vários pontos da cidade.
Mas punha-se sempre a hipótese de tal não vir a suceder dado o ministro Tobias Dai ser cunhado do presidente da República.
As explosões foram de proporções tais que fizeram tremer a cidade.
Há informações de obuses que foram projectados dezenas de quilómetros, tendo alguns explodido em escolas, outros em unidades hospitalares, para além de outros ainda terem atingido casas em diferentes
bairros da cidade, havendo notícia de um ter atingido a Praça da OMM junto a uma estação de reabastecimento de combustível, no Bairro da Coop, a poucas centenas de metros da Sommerschield.
Há também a confirmação de casas de construção precária que ruíram com as ondas de choque provocadas pelas explosões de material pesado.
Como ao início da noite ainda havia fortes explosões, só hoje ao amanhecer será possível começar-se a fazer um balanço mais preciso dos estragos.
Pode-se, no entanto, confirmar que nas avenidas Eduardo Mondlane e 25 de Setembro, FPLM, Joaquim Lapa, Av. De Angola, Consigliere Pedroso e em muitos outros locais da capital, partiram-se vidros de montras de bancos, grandes armazéns de mobílias e electrodomésticos, lojas e apartamentos e até houve casos de telhados de casas que ruíram em vários pontos da cidade.
No edifício onde está instalada a redacção do Canal de Moçambique estilhaçou-se um vidro de uma montra devido a uma onda de choque de grande intensidade.
Uma repórter do «Canal de Moçambique» confirmou que o tecto da Escola de Aeronáutica ruiu e o aeroporto internacional de Maputo, em Mavalane, proximidades do Paiol de Malhazine, cerca das 18 horas encontrava-se deserto porque também havia já sido encerrado ao tráfego aéreo.
Os estragos são elevados em toda a cidade.
Apesar de ter havido casos de obuses que atingiram a cidade de cimento, a maior parte caiu em Kongolote e Zona Verde na baixa do Infulene, em ambos casos zonas relativamente próximas do paiol das Forças Armadas de Defesa de Moçambique em Malhazine, por sinal o mais importante do país.
Já à noite havia notícias de pilhagens em diversos bairros abandonados por grande parte dos seus residentes que se refugiaram em zonas distantes do local enquanto as explosões prosseguiam.
Há notícias confirmadas de várias crianças mortas, designadamente na escola primária de Wiriamo no Zimpeto.
O Hospital Psiquiátrico do Infulene também foi atingido por um obus que destruiu e incendiou o bloco administrativo, e um outro que atingiu uma das enfermarias de onde os doentes já tinham zarpado a fugir dos estrondos.
À hora do fecho desta edição a capital moçambicana continuava em pânico, mas com a televisão pública a apelar às pessoas para regressarem às suas casas pedindo-lhes apenas que, se houvesse mais alguma explosão esporádica, se aproximassem dos militares no terreno.
A tragédia foi horrível. Vimos crianças sem membros inferiores e mulheres sem membros e acompanhadas de bebés a amamentar.
A reportagem do «Canal de Moçambique» acompanhou o desenrolar dos acontecimentos no terreno. Verificou que morteiros, obuses e outros artefactos feriram e mataram, nomeadamente nos bairros de Kongolote, Zona Verde, Laulane, bairros das Mahotas, Choupal, Jardim e Zimpeto. Nas proximidades do paiol o perigo era uma constante com a população a tentar livrar-se em correrias estonteantes.
Todos os meios foram usados para transportar feridos para os centros de saúde.
O director do serviços de urgências do Hospital Central de Maputo, HCM, Assiz da Costa, falando ao «Canal de Moçambique», não precisou o número de vítimas.
Quando começaram a chegar ao HCM os primeiros feridos ainda se ouviam explosões intensas.
Informações ainda não confirmadas davam conta de existência de corpos sem vida nos bairros da Polana Caniço e Missão S Rock 2 e nas redondezas do paiol, a uma distância considerável do paiol de Malhazine.
O resgate de vítimas no terreno deverá prosseguir já hoje à luz do dia.
(Carlos Humbelino, João Chamusse, Fernando Veloso e Conceição Vitorino) - CANAL DE MOÇAMBIQUE - 23.03.2007
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