Um tribunal da África do Sul recentemente condenou o antigo ministro da segurança do apartheid, Adriaan Vlok, a uma pena suspensa de 10 anos por ter tentado assassinar o Reverendo Frank Chikane, proeminente figura política que militou contra o regime de minoria branca durante a presidência de P. W. Botha. Vlok havia sido levado a tribunal não obstante a sua declaração pública de arrependimento pela prática de crime frustrado, e da sua conversão, devota, ao cristianismo, a ponto de ter lavado os pés de Chikane, numa cerimónia amplamente reportada pela comunicação social sul-africana. Ao apresentar o caso de Vlok em tribunal, a procuradoria-geral da Republica sul-africana pedia ao juiz que tivesse condescendência para com o antigo ministro de Botha, pois ele havia manifestado remorsos pelos actos praticados.
São agora conhecidas as circunstâncias da tentativa de assassinato do Reverendo Frank Chikane. O então ministro Adriana Vlok pediu a Wouter Basson, especialista em guerra química e bacteriológica do regime do apartheid, para que adquirisse uma substância venenosa para ser usada contra o reverendo sul-africano. Em Abril de 1989, Basson enviava a substância solicitada. Tratava-se de Paraoxon que poderia ser usada em peças de roupa.
Nesse mesmo mês, a polícia do regime interceptou a bagagem do Reverendo Chikane no Aeroporto Internacional de Joanesburgo quando ele se preparava para embarcar com destino à Namíbia. A polícia contaminou a roupa de Frank Chikane, acabando o reverendo sul-africano por ser transportado de emergência para um hospital.
Há uns dias atrás, o ex-ministro da segurança do regime da Frelimo, Sérgio Vieira vangloriava-se em entrevista a um semanário de Maputo, do assassinato de um outro reverendo, de nome Uria Simango. Dizia Vieira que o reverendo Simango fora "executado por crimes contra a Pátria." Os regimes totalitários, ou pseudo-democratas como no caso vertente, utilizam os argumentos que entendem ser os mais apropriados para silenciar os seus oponentes. Se aos olhos do apartheid Chikane era um "agente do comunismo internacional" a abater, por, tal como o Reverendo Simango, se opor a um sistema político que rejeitava, na visão do regime que Sérgio Vieira serviu com afinco e dedicação, o ex-vice presidente da Frelimo era culpado de algo que, como notou um editor moçambicano, até nem vinha contemplado no Código Penal moçambicano.
Vlok mostrou remorsos, lavou os pés a Chikane, e em seu nome a Procuradoria-Geral da Republica sul-africana apelou ao juiz para mostrar clemência para com o antigo ministro da era do apartheid.
Vieira não mostra remorsos. Continua a ser o mesmo arrogante que costumava reservar um elevador só para ele quando era governador do Banco de Moçambique, e obrigava os funcionários desta instituição a usar gravata nos escaldantes meses do Verão maputense. Tal como o recentemente galardoado com o título de honoris causa por um universidade portuguesa, Sérgio Vieira acha que a execução sumária de um prisioneiro político, raptado num país vizinho com a conivência do Estado português e da secreta do Hastings Banda, foi justa, um caso de "justiça altamente popular".
Ao contrário da sua congénere sul-africana, a Procuradoria-Geral da República moçambicana mantém um silêncio cúmplice. Perante a flagrante confissão de um crime político, feita a um jornal da praça por um ex-ministro da segurança, não move palha, nem mesmo quando ele se afirma como autor moral de um longo e multifacetado crime, que começou por ser rapto, depois um travesti de justiça encenado pelo próprio em Nachingwea, e mais tarde o encarceramento à revelia dos tribunais, culminando com a execução sumária, sem julgamento e com a agravante de na altura a Assembleia, dita Popular nem sequer tinha aprovado nenhuma lei da pena de morte que pudesse constituir a moldura legal da matança de M´telela.
canal de moçambique - 21.08.2007