A talhe de foice
Por Machado da Graça
Um centenário não é uma data vulgar. Cem anos são muito tempo e isso quer dizer que, muito provavelmente, quem assistiu ao actual centenário da cidade da Beira, pelas leis da Natureza, não deverá assistir a mais nenhum.
A cidade da Beira não é um posto administrativo perdido nos fundos de uma qualquer região rural do nosso país.
É a segunda maior cidade de Moçambique.
Portanto, o centenário da Beira deveria ter tido, a nível nacional, a pompa e a circunstância dos grandes acontecimentos nacionais.
Só que...
Só que o Município da Beira foi conquistado, em eleições livres e justas, pelo principal partido político da oposição, a Renamo.
E isso provocou fenómenos que só podem levar a que perguntemos qual é o nível dos nossos actuais dirigentes.
Muitas foram as formas de tentar diminuir a visibilidade e o brilho das comemorações do Centenário. Mas não vou agora debruçar-me sobre elas, difíceis que são de provar, no campo pantanoso das intenções. Vou-me ficar por um único facto: a representação do Governo Central pelo ministro Aiuba Cuereneia. Para uma data de tal importância, nem o Presidente da República nem sequer a Primeira-Ministra acharam que valesse a pena uma deslocação à cidade da Beira. O ministro Cuereneia chegava e, se calhar, até sobrava.
E, perante isto, não consigo deixar de lembrar as presenças do nosso Chefe de Estado nas inaugurações dos empreendimentos de alguns empresários como, por exemplo, o dinâmico proprietário do grupo MBS.
Em relação a este, tivemos ocasião de ver o nosso Presidente na inauguração da nova Mesquita da Baixa, construída no local onde foi destruída uma outra mesquita, considerada monumento nacional, derrubada sem que ninguém se tenha sentido muito preocupado.
Tivemos, também, o nosso Chefe de Estado a visitar, uma primeira vez, o novo Centro Comercial da MBS, quando ainda estava em construção. E uma segunda vez a proceder à inauguração das instalações, embora me digam que a maioria das lojas continua fechada.
É verdade que o proprietário destes empreendimentos já comprou, uma vez, o cachimbo do Presidente Guebuza por uma pequena fortuna. E, noutra ocasião, comprou uma caneta do mesmo dono por outra quantia louca. Com a agravante de, depois de comprar os tais objectos por rios de dinheiro, os ter imediatamente oferecido à esposa do anterior proprietário.
Mas a verdade é que a mesma pessoa que corre para inaugurar os empreendimentos de tão generoso amigo parece não ter encontrado espaço, na sua agenda, para uma deslocação à Beira para festejar o centenário da cidade com os seus habitantes. Talvez a razão seja que o edil Daviz Simango nunca lhe comprou nenhum cachimbo nem caneta.
Sabe-se lá se, no meio da confusão dos abraços de parabéns, o nosso Presidente não iria encontrar-se nos braços de alguém de quem, politicamente, não goste?
Jogando pelo seguro, Armando Guebuza e Luísa Diogo deixaram-se ficar pela capital, evitando maus encontros na cidade do Chiveve.
Pode ser que, se um dia o Grupo MBS decidir abrir um espaço comercial na cidade da Beira, um daqueles dirigentes (ou até os dois...) decida ir à capital de Sofala para comemorar, com os seus habitantes, a importante data.
A ver vamos...
SAVANA - 24.07.2008