Por Nádia Rebouças - do Rio de Janeiro
Ao desembarcar em Angola, eu me deparei com um aeroporto mais limpo e organizado, bastante diferente da aparência de improviso, pobreza e pequenos recados nos ouvidos, como na última visita, há dez anos. Na ocasião, um dos funcionários me pediu dinheiro para liberar minhas malas. Não era simplesmente um pedido como conhecemos e sim uma súplica "estou com fome, não comi nada hoje".
A partir de 2000, com a morte do líder da Unita, os angolanos puderam começar a entender o que é viver em paz, muitos pela primeira vez na vida, visto que o país viveu mais de 20 anos em guerra.
Muitas ruas continuam esburacadas, mas outras foram ampliadas, existem avenidas que levam a Luanda Sul, a Barra da Tijuca de Luanda. Lá estão os privilegiados, morando nos seus condomínios fechados. Não há violência armada como conhecemos nas grandes cidades brasileiras, apesar da miséria cercar a cidade, tal como retratou Regina Casé, na Central da Periferia.
O angolano é sorridente. Agora existe paz. Ele pode viajar livremente pelas províncias. Algumas famílias não se encontraram durante todo o período de guerra. As estradas melhoraram, é permitido rever as terras da infância e muitos contam que se emocionam com essas possibilidades.
Os meninos de Luanda que faziam parte da paisagem no período da guerra, trazidos por helicópteros das províncias, jogados ali por suas mães ansiosas em preservá-los da guerra, viraram jovens que vendem de tudo nas esquinas, desde terno a abajur e eletrodomésticos. Alguns conseguiram voltar para suas famílias.
A elite de Angola imita o Brasil de hoje. É facílimo nos sentirmos em casa em Angola. Música, alimentação e o jeito alegre de ser.
Em Angola se encontram os brasileiros de espírito aventureiro, jovens casais, jovens mulheres. Todos têm oportunidade nessa terra que começa a desabrochar e a mostrar ao mundo suas rosas de porcelana e muitas riquezas; petróleo, minerais, diamantes.
As empresas brasileiras estiveram lá desde a guerra, construindo, pesquisando. Os chineses estão lá em seus guetos, calados e rapidamente construindo prédios e prédios. Quem sabe nem eles resistirão às bonitas e sensuais angolanas? Em minha opinião, na próxima visita que fizer, poderei notar os mulatos de olhinhos puxados como já comentam os angolanos.
O espanto fica por conta do velho caminho do desenvolvimento. O desejo de consumir. Uma sociedade represada por anos começa a poder comprar, quando a maioria não tem condições básicas de vida.
Carros 4x4 são normais num trânsito que não anda. São Paulo fica para trás. Todos que podem tem dois ou três Prados. Todos que podem tem carro. Não há transporte público, o povo anda de vans, as candongas. Há regras de trânsito, mas elas não são muito respeitadas, o que vale segundo explicam, é: "a prioridade é sempre à direita". Todos se entendem e nós não entendemos como se buzina todo o tempo, consumindo combustível porque os veículos podem ficar meia hora parados a cada 300 metros percorridos.
Desenvolvimento sustentável? Não há qualquer referência, entendimento ou empatia. Exportamos professores, publicitários entre muitos outros profissionais, que estavam em perigo aqui e tinham muito a oferecer lá.
Muitos aventureiros. É fácil um estrangeiro ganhar US$ 5.000 em Luanda.
Falta todo tipo de profissional para acompanhar o ritmo assombroso de crescimento. A corrupção também não tem fronteiras, o "jeitinho" está lá há muito tempo. Nossas novelas se encarregam de exportar estilo de vida, crenças e desejos de consumo.
Regina Casé mostrou a importância da novela brasileira. Hoje ela é assistida em tempo real em Angola. Comunidades percorrem quilômetros para assistir TV onde existe energia. Falta tudo na periferia: energia, saneamento, água. Na cidade, as coisas melhoram pouco a pouco. O paradigma do TER, para a elite, é evidente. As mulheres já vendem frutas, as províncias passaram a produzir. Todos vendem algo numa economia quase que totalmente informal. É preciso viver.
Logística é o desafio, já que petróleo, diamantes e minério precisam de estrutura de transportes e portos. Angola vai crescer muito, se desenvolver, mas o que nós brasileiros, já conscientes dos novos paradigmas, podemos fazer para ajudá-los a pular etapas? O que fazer para aumentar a consciência social e ambiental, num país que tem tantos laços importantes com o Brasil? Lá, como em toda parte existem os protagonistas de uma nova história, como multiplicá-los?
Vamos ser nós e os chineses, entre outros, os novos colonizadores da África? Como nós que trabalhamos para a transformação podemos assistir calados a esse modelo falido de desenvolvimento para um país que passou todo o século XX sendo espoliado? Podemos contribuir para apoiar movimentos inovadores na
Angola de hoje?
Não dá para ir à África e voltar sendo a mesma pessoa. Temos todos muita responsabilidade com esses países que representam a origem de uma grande maioria da população brasileira. O que ficou certo é que nossas empresas, nossas Instituições do Terceiro Setor, RH e Comunicação têm grande contribuição para dar à Angola.
Educação. Troca de experiências. A R&A colabora com a agência Movimento de Angola desde 1995 e apóia a AAPM (Associação Angolana de Publicidade e Marketing) desde sua formação.
28.01.2008