Recebemos um apelo por parte dos nossos parceiros do Fórum de Recursos Naturais da província de Nampula, que nos deixou particularmente preocupados.
Corre a informação de que o Governo da Província de Nampula, reunido em sessão algumas semanas atrás, tomou a decisão de suspender o processo de canalização dos 20% das taxas de exploração florestal para as comunidades beneficiárias e determinou que o montante em causa passasse a ser depositado nas contas dos Governos Distritais, ao abrigo de uma nova modalidade de pagamento a introduzir na província.
Para o Fórum dos Recursos Naturais, esta decisão, em momento algum foi reduzida a escrito, significou o comprometimento imediato de todo um conjunto de actividades de apoio às comunidades locais no processo de constituição de Comités de Gestão Local e de abertura de contas bancárias.
"Segundo uma das nossas fontes, cuja identidade preferimos proteger,* "os 20% resultados da exploração florestal estão já a ser canalizados aos governos distritais e um exemplo concreto é o Distrito de Murrupula, que recebeu um valor de 210 000,00 na semana passada em cheque que se diz ser para canalizar às comunidades. Num comunicado público em que o Exmo. Senhor Administrador do Distrito, Afonso das Neves Ussene, anunciou no Posto Administrativo Sede, Cabo Mucare, comunidade de Nikuete, a existência desses valores em poder do Distrito".*
Segundo as mesmas fontes, para além da manifesta violação do disposto na lei, está em causa o receio de que os 20% acabem diluídos nas contas dos Governos Distritais, sendo reorientados para outros fins, ou que venham a ser simplesmente desviados em processos de gestão pouco transparentes.
Ora, da leitura que fizemos do Diploma Ministerial n.º 93/2005, de 4 de Maio, referente à definição dos mecanismos de canalização e utilização dos 20% do valor das taxas de exploração florestal e faunística para as comunidades locais, em momento algum encontramos enquadramento para semelhante decisão do Governo da Província de Nampula.
Senão vejamos, de acordo com o n.º 1 do artigo 4. º, "a entidade licenciadora (neste caso a Direcção Provincial da Agricultura) procederá à requisição das receitas consignadas a favor das comunidades locais, as quais serão depositadas numa conta bancária aberta para o efeito, com a designação "Fundo Comunitário", acompanhadas das especificações referentes às comunidades beneficiárias, a qual será movimentada pela referida entidade licenciadora".
Por seu turno, o n.º 2 do referido artigo estabelece que "a entidade licenciadora deverá proceder à transferência trimestral das receitas consignadas para as contas das comunidades beneficiárias, acompanhadas das informações sobre a origem das referidas receitas, informando do facto as próprias comunidades e a administração do distrito.
Portanto, não há qualquer base jurídico-legal para a decisão tomada ao nível do Governo da Província de Nampula, violando-se claramente o estipulado pelo Ministério da Agricultura no que toca ao processo de canalização dos 20% para as comunidades locais localizadas nas áreas de exploração florestal e faunística.
A ser verídica esta informação, constitui um grave precedente para todo um historial de construção de um quadro jurídico-legal consagrador de direitos comunitários, bem como para um já rico historial de organização das comunidades locais, com o envolvimento directo dos órgãos locais do Estado, as organizações da sociedade civil e o sector privado.
Apelamos a quem de direito para rapidamente investigar o que efectivamente se passou e, a ser verídica a suspeita, acautelar a reposição do direito. Um apelo especial fica aqui endereçado à Direcção Nacional de Terras e Florestas, a qual, com o devido respeito pelo processo de descentralização em curso no País, deve exercer um importante papel na interpretação e implementação harmoniosa da legislação de florestas e fauna bravia.
*Protegendo as florestas, construindo o desenvolvimento sustentável...
* Carlos Serra/ Amigos da Floresta
VERTICAL - 23.05.2008