ANA DIAS CORDEIRO
Eduardo dos Santos, líder de uma "grande potência em África", foi convidado a visitar Paris em 2009.
Foi breve a visita de Nicolas Sarkozy a Angola - umas horas apenas -, mas simbólica na forma como o Presidente francês e o chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, concordaram em iniciar "uma nova era", virando a página de umas relações difíceis desde que, há oito anos, começou a ser investigado o processo Angolagate, de venda de armas a Luanda, durante a guerra civil, entre 1993 e 2000.
A partir de agora, a relação entre os dois Estados será de "amizade, confiança e respeito mútuo", afirmou José Eduardo dos Santos. O Presidente angolano agradeceu "os esforços" de Sarkozy para ultrapassar as dificuldades que impediam o reforço da cooperação entre os dois países, refere o jornal francês Figaro na sua edição on-line.
Nicolas Sarkozy, por seu lado, quase se desculpou em nome da França pelos "mal-entendidos" do passado, numa referência ao caso do Angolagate, e disse perceber que os dirigentes angolanos estivessem "magoados". O caso começou por envolver o nome de dirigentes angolanos e também o próprio Presidente, a propósito da suspeitas de desvios de dinheiro nas transacções de armamento do Leste europeu para Angola.
Nenhum angolano foi pronunciado para ir a julgamento, marcado para Outubro deste ano em França. Mas Pierre Falcone, um amigo de Luanda, é um dos 42 acusados, apesar das várias tentativas do Governo de
Angola e da Presidência para o proteger. "A França quer comprometer-se no longo prazo com Angola (...), grande potência da região e de África", disse Sarkozy, anunciando que consultará Luanda "sistematicamente sobre o conjunto dos grandes dossiers africanos". E manifestou o desejo de uma parceria comercial e de cooperação, iniciada já com a assinatura de vários acordos durante esta visita.
A propósito desta deslocação de Sarkozy, o especialista e investigador francês do Centre d"Études et de Recherches Internationales (CERI) de Paris, Roland Marchal, lembra que, no seu discurso de vitória, o Presidente francês defendera uma diplomacia baseada na ética e nos direitos humanos. "Mas o que vemos é um
cinismo absoluto", disse ao PÚBLICO. "As prioridades de Paris, afinal, são apenas de melhorar as relações com países do golfo da Guiné", rico em petróleo.
E conclui: "A normalização das relações entre França e África só acontecerá no dia em que será possível conceber ter-se uma política de Estado e um sector privado que não estão intimamente ligados, como o estão actualmente", referiu Roland Marchal, criticando uma diplomacia que se baseia muito nos interesses e não em valores e políticas.
PUBLICO - 24.05.2008