MARCO DO CORREIO
Por Machado da GraçaMinha cara Helena
Como estás tu, minha boa amiga? E o teu marido e as crianças? Do meu lado está tudo bom, como dizem esses da publicidade aos celulares.
Onde acho que não está nada bom é na situação da nossa região, a poucos dias da segunda volta das eleições no Zimbábuè.
E se eu já estava muito preocupado, mais preocupado fiquei ao saber que esteve em Maputo, para falar longamente com o Presidente Guebuza, uma delegação da ZANU-PF que incluía, para além de Emerson Munangagwa, ministro da Habitação Rural, também os ministros da Defesa, Sydney Sekermaie, e o da Segurança, Happton Bonyonhgwe.
Mais de uma hora esteve esta delegação fechada com Armando Guebuza, em contraste forte com os 15 minutos que o nosso dirigente concedeu, há tempos, a Morgan Tsvangirai.
E do que terão falado estas ilustres personagens?
Dado que não é provável, no presente contexto, que a conversa tenha sido sobre a problemática da habitação rural, tenho sérios receios de que tenha incidido mais fortemente sobre a área da defesa e segurança.
Isto num momento em que Robert Mugabe afirma, sem margem para dúvidas, que se o povo zimbabueano eleger Tsvangirai para Presidente da República ele voltará para a guerrilha, lutando até à morte para voltar a ocupar o poder.
Um colega e amigo perguntava-me se esta delegação não teria vindo verificar se as suas antigas casas em Maputo ainda estariam livres para voltarem para elas depois da derrota eleitoral.
O meu receio é que tenham vindo perguntar se as antigas bases da ZANU-PF, junto da fronteira entre Moçambique e o Zimbábuè, ainda estarão disponíveis para eles voltarem a ocupá-las e daí lançarem os seus ataques contra o Governo eleito.
Pela maneira como as coisas estão a correr, minha cara amiga, parece-me que há fortes probabilidades de asneira grossa seja quem for que seja declarado vencedor.
Se for Mugabe, como parece mais provável depois de tudo o que se está a passar em termos de intimidação, assassinatos, detenções arbitrárias e agressões selváticas, muito provavelmente teremos a oposição a revoltar-se.
No caso de, apesar de tudo isso, ser declarada a vitória de Morgan Tsvangirai nem precisamos de imaginar o que pode acontecer, porque Robert Mugabe, do alto da sua senilidade militante, já o anunciou claramente: teremos uma guerra civil no país vizinho.
E, por muito que nos desagrade a todos, a visita desta delegação tão estranha cheira a isso mesmo.
Cheira a pólvora queimada.
Tudo leva a acreditar que estamos a colher os frutos de uma cumplicidade obtusa, sem qualquer sentido de Estado.
Esperemos, Helena, que não vamos assistir a um regresso à guerra, trazida por um velho ditador e apoiada, provavelmente sem nenhuma vontade, pelos seus velhos companheiros de luta, dentro e fora das fronteiras.
Esperemos que eu esteja completamente enganado.
Um beijo para ti do
Machado da Graça
CORREIO DA MANHÃ - 19.06.2008