Para o europarlamentar Giusto Catania, os sentimentos de ativistas pelos direitos dos imigrantes ao dizer que a votação em Estrasburgo marca um dos “dias mais tristes” da União Européia
20/06/2008
David Cronin
de Bruxelas (Bélgica)
IPS/Envolverde
O Parlamento Europeu aprovou, na quarta-feira (18), a “diretiva de retorno”, lei que permite aos governos manter presos por até 18 meses imigrantes clandestinos ou solicitantes de asilo não atendidos, antes de sua deportação. O europarlamentar esquerdista italiano Giusto Catania refletiu os sentimentos de ativistas pelos direitos dos imigrantes ao dizer que a votação em Estrasburgo marca um dos “dias mais tristes” da União Européia.
A “diretiva de retorno”, rejeitada em bloco pelos partidos de esquerda, estabelece para só 27 países do bloco um critério comum sobre o tempo que os imigrantes que enfrentam a expulsão podem ficar detidos. Até agora, em sete dos Estados não havia um limite obrigatório. Segundo a nova lei, deveria ser estabelecido um máximo de detenção de seis meses, podendo se estender por outros 12 em uma ampla gama de circunstâncias. Uma grande coalizão de organizações religiosas, humanitárias e de direitos civis considerou excessivos os 18 meses, pois a maioria dos imigrantes que poderia ser submetida a uma detenção tão extensa não foi condenada por nenhum crime.
Souhayr Belhassen, presidente da Federação Internacional de Direitos Humanos, qualificou a votação de inoportuna. Quando falta pouco para o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, “os legisladores europeus nos fazem saber que os imigrantes não são seres humanos como qualquer outro”, disse Belhassen. “Eles os desumanizaram”, lamentou.
Um dos principais críticos da diretiva, o presidente da Bolívia, Evo Morales, a considerou uma negação dos “fundamentos da liberdade e dos direitos democráticos. Existe a possibilidade de prender mães de família e menores de idade sem levar em conta sua situação familiar ou escolar, nestes centros de internamento onde sabemos que ocorrem depressões, greves de fome, suicídios”, escreveu Morales. “Como podemos aceitar sem reagir que sejam concentrados em campos compatriotas e irmãos latino-americanos sem documentos, dos quais a imensa maioria está há anos trabalhando e se integrando?”, perguntou o mandatário.
Em carta aberta, Morales exortou a Europa a reconhecer a contribuição positiva dos imigrantes para a economia do continente. “Hoje, a União Européia é o principal destino dos imigrantes do mundo, devido à sua positiva imagem de espaço de prosperidade e liberdades públicas”, acrescentou. “A imensa maioria dos imigrantes vão à UE para contribuir com esta prosperidade, não para se aproveitar dela. Ocupam empregos em obras públicas, construção, nos serviços pessoais e em hospitais, que os europeus não querem ou não podem ocupar”, ressaltou.
Outro motivo de conflito é a proibição por cinco anos do reingresso no território da União Européia de quem for expulso, o que, segundo a Anistia Internacional, constitui “um exemplo extremamente ruim para outras regiões do mundo”. Além disso, alertou que a lei não garante o atendimento das necessidades das crianças imigrantes que não estejam acompanhadas dos pais. Outras organizações alertaram que a diretiva permitirá deportações para países onde os migrantes podem sofrer torturas, hostilidades e até a morte. Em alguns casos, o traslado seria para países que não os seus, segundo diversas interpretações.
“O texto admite implicitamente que um menor não acompanhado por seus pais nascido no país A seja expulso para o país B”, disse Patrick Peugeot, presidente da organização francesa de defesa dos refugiados Cimade. “Como é possível imaginar algo assim?”. Mas a diretiva foi defendida pelos grupos políticos majoritários. A aprovação foi por 367 votos contra 206 e 100 abstenções. A lei “não é perfeita”, mas contém várias salvaguardas, argumentou Patrick Gaubert, membro do Partido Popular Europeu, de centro-direita, o principal grupo do Parlamento Europeu. As detenções devem ser submetidas a controle judicial e, no começo, as deportações devem acontecer com o consentimento dos imigrantes, afirmou.
Segundo Gaubert, a falta de leis antes desta quarta-feira permitia critérios arbitrários que agora foram substituídos por regras claras e adequadas. “A propaganda se refere a uma medida xenófoba, mas a Europa está, na realidade, assumindo com seriedade suas responsabilidades e se negando a abandonar as pessoas vulneráveis em um vazio legal”, acrescentou. Este ponto de vista foi apoiado pela Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa. A europarlamentar holandesa Jeanine Hennis-Plasschaert considerou “meridianamente claro que este pacote negociado” entre o Parlamento Europeu, a Comissão Européia (braço executivo da UE) e os governos nacionais “estabelece regras onde antes não existiam”.
Mas, o europarlamentar Catania, do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Européia/Esquerda Verde Nórdica, acusou os governos que apoiaram a diretiva de assumir um “enfoque autoritário. Este será lembrado como um dos dias mais tristes na história da UE”, afirmou o legislador italiano. “Estas medidas serão decisivas para os oito milhões de imigrantes irregulares hoje residentes na Europa, decisivas para esses homens e mulheres que, escapando das guerras e da fome, tentam alcançar nosso litoral”, ressaltou. (IPS/Envolverde)
Recent Comments