Talvez começar por dizer que este Ministério requer uma mudança de nome pois dos dois nomes que o compõem só um é que efectivamente funciona ou vai dando a cara. Quase sempre que se fala de Obras Públicas e Habitação só se ouve algo sobre obras públicas. A iniciativa de fomento da habitação que durante algum tempo mereceu tratamento público, praticamente está enterrada e do que sejam planos para a habitação neste país, se existem, estão no segredo dos deuses. Na verdade é uma cópia de algo que já teve esse nome no passado tendo sido também de Construção e Águas. Obras públicas existem e algumas de grande vulto. Só para citar algumas temos a ponte sobre o rio Zambeze, em Caia, que está caminhando a passos largos para a sua conclusão praticamente dentro dos prazos, com apenas ligeiro atraso. Esta empreitada como outras que o país tem, resultam de esforços multiformes e de uma capacidade de continuar a executar sobre planos desenhados durante a governação anterior. Na altura dos elogios, é necessário que o quadro técnico do ministério mesmo durante aquela governação geralmente condenada como a do «deixa andar», seja incluído. A concepção, planificação e execução de muitas empreitadas em estradas e pontes começou a ser feita naqueles dias e há que reconhecer que Moçambique deu alguns saltos em termos técnicos. Houve entretanto capacidade de gerir a transição e garantir a continuidade de processos. Isso poupou fundos e tempo pois não se teve que recomeçar do zero. Numa área sujeita a mutações dos preços das obras em decorrência de alguma dependência em relação ao mercado externo de onde provêm muito do que se usa, tem havido complicações que afectam prazos de execução e mesmo a qualidade final das obras. Muitas obras, especialmente as estradas não são entregues nos prazos contratuais e isso acarreta custos adicionais. E até ficam pedaços de estrada por concluir se confrontado o que há no terreno com o que consta dos projectos. Fica-se até com a impressão que muito “taco” levou sumiço sem que as autoridades competentes se preocupem a investigar o que se passou, não vá apanhar-se o “rabo” de algum “cabritão”… Acresce a isso que decorrente da dependência de fundos disponibilizados pelos doadores e parceiros internacionais pode-se afirmar que isso afecta negativamente os fluxos de trabalho. O Ministério em si não tem os fundos de que necessita para gerir com a independência desejável as suas obras. O seu trabalho de fiscalização está profundamente afectado pela origem dos fundos e qualidade de seus próprios avaliadores. Quando se dão casos abertos de incumprimento de empreitadas aparece todo um jogo político e diplomático tendente a não permitir que as regras estabelecidas se cumpram. É tristemente famoso o caso da construtora portuguesa Tamega que mesmo falhando na entrega do troço de estrada adjudicado, não é penalizada. Fala-se, mas no concreto nada acontece. Gerir obras, garantir qualidade dentro dos padrões estabelecidos envolve custos e capacidade de fiscalizar que cabe dizer ainda, é insuficiente entre nós. Este é o grande calcanhar de Aquiles do Ministério das Obras Públicas e Habitação. A qualidade final de uma obra depende de rotinas de fiscalização forte e independente. No entanto só se vêem facilidades…Está tudo numa boa!... Não é só o que se pode pagar mas fundamentalmente como se paga. Quando o processo é abertamente atropelado e enviado para os meandros da diplomacia fica mais difícil ao ministro do pelouro decidir mesmo quando tem razões para fazê-lo. À parte outras “condicionantes” de que às vezes também se ouve falar, entre casas e residenciais à beira-mar… De modo prático há que reconhecer que sendo ou não fundos doados, o governo do país de origem dos mesmos tem muita coisa a dizer sobre como se utilizam tais fundos, quem constrói, quem fiscaliza, o que é permitido e o que não é. São outro tipo de condicionantes. Os acidentes e percalços que acontecem um pouco por todo o país, relacionados com prazos e qualidade final de obras públicas, tem de ser vistos nesta óptica. Mas também se pode dizer que a força e qualidade negocial do governo receptor dos fundos conta, e desempenha um papel muito importante. Moçambique não só deve, como pode declarar que não está interessado em determinadas condições impostas por seus parceiros. Mas vezes há em que se sabe que quem nos representa tem o “rabo preso”. Aí está a independência política e defesa da soberania, mas por vezes comprometida. Os compromissos acabam por acabar em abraços… os resultados nem sempre são bons…Percebe-se quem uns e outros não são santos… O diálogo entre os parceiros, a consulta permanente, o envio de relatórios atempadamente relatando o estado de coisas e as opiniões do governo receptor jogam um papel importante pois permitem que assim os parceirtos fiquem sabendo a tempo o que pensa o outro lado. É importante enviar sinais de maneira oportuna e isso evita surpresas e reclamações de que não se tinha conhecimento sobre determinado dossier. Mas nem sempre os “rabos presos” permitem que o que se deve fazer, se faça. Daí que merece atenção especial, em qualquer análise que se faça deste sector, a vida útil das obras e a qualidade das mesmas. Vemos que raramente as mesmas coisas não têm de ser feitas repetidamente. Quando aparece um ministro a reclamar que houve obras em estradas que não obedeceram ao ideal e que por causa disso, foi por exemplo, temporariamente interropido o tráfego na EN1 em Massinga, isso demonstra que de facto existe um problema grave. Ainda vão sobrando casos para dar o show de comportamento governamental desejável. Embora não se possa evidentemente falar de um mar de rosas num sector que consome avultadas somas monetárias para realizar o seu trabalho, dinheiro esse quase todo de fontes externas, há que reconhecer no entanto que algum trabalho que está sendo feito. Alguns abortos como as ECMEPs, APIEs não mancham a imagem geral de desempenho que este ministério tem demonstrado ao longo dos anos. Só que há problemas de tal gravidade que não podem continnuar adiados sob pena de provocar danos incomensuráveis. Trata-se da manutenção periódica e preventiva nas obras de grande engenharia como as pontes sobre o Save na Vila Franca do mesmo nome e da ponte sobre o rio Zambeze em Tete só para citar dois casos. O trabalho que tem sido feito não reflecte a dimensão e importância das obras. Não se pode enveredar pela poupança e contratação de empresas sem o perfil necessário para executar obras daquele vulto. Mesmo sem um conhecimento profundo sobre a matéria, a julgar pela qualidade das intervenções, dá para dizer que algo não está sendo bem feito, em tempo útil e com a periodicidade exigida. Pode-se chegar a pagar muito caro por não se intervir hoje com a qualidade necessária. Numa situação de abertura do mercado não se pode travar a entrada de empresas construtoras internacionais. Mas algo mais tem de ser feito para promover o desenvolvimento e fortalecimento de empresas de construção civil nacionais. A tendência de funcionários públicos do Ministério das Obras Públicas e Habitação enveredarem pela obtenção de alvarás para assim intervirem no processo de construção de obras do Estado pode passar despercebida mas é um facto negativo na medida em provoca toda uma salada russa no processo de adjudicação de obras. A proliferação de empresas do ramo sujeitas a críticas em muitas províncias, por trabalho de fraca qualidade, deve ser motivo de reflexão urgente porque são fundos públicos que acabam sendo usados para pagar a quem não executou obras dentro dos padrões estabelecidos. Muitas moscas estão pousando no bolo que é a construção civil. Capacitar e promover os moçambicanos não deve ser feito em detrimento da qualidade das obras. Julgo que uma das coisas que este ministério deve engajar-se de maneira permanente é no diálogo com os diversos parceiros nomeadamente a Ordem dos Engenheiros, a associação dos empreiteiros nacionais para identificar lacunas e melhorar rotinas de trabalho. Facilitar a formação especializada para áreas em que se registem carências vai jogar um papel importante no desenvolvimento e fortalecimento do sector. Se o pelouro da habitação faz de facto parte deste ministério então é necessário que se comece a pensar seriamente na degradação rápida dos prédios urbanos. Alguma coisa tem de ser definida e ser feita antes que os desastres aconteçam. Importa desenhar soluções a alturas das nossas capacidades e possibilidades e ir fazendo alguma coisa. Deixar para depois e para os outros não é a opção válida.
(Noé Nhantumbo) - CANAL DE MOÇAMBIQUE - 26.01.2009
|