O dito combate à corrupção no nosso País começa a parecer-se um circo. Prendem-se os suspeitos, cria-se a sensação nos cidadãos e no público em geral de que agora é que o combate à corrupção e ao assalto aos bens, património do Estado e erário público é mesmo a sério, mas depois de largos meses de cárcere despronunciam-se os arguidos. Está a acontecer isso com vários cidadãos e em vários casos que correm com réus presos. Um dos casos mais mediáticos deste “circo” é o do ex-ministro do Interior, Almerino Manhenje, mas não só...
O ex-ministro do Interior e ex-ministro na Presidência para Assuntos de Defesa e Segurança dos últimos governos do ex-Presidente da República Joaquim Chissano, coronel piloto-aviador Almerino Manhenje, foi detido e encarcerado na Cadeia Civil de Maputo, há vários meses. Começou por ser acusado pela Procuradoria Geral da República de 49 crimes, mas sabe-se agora que já foi despronunciado de 48 desses mesmos crimes de que chegou a estar acusado pelo Ministério Público, instituição que ao mais alto nível da sua hierarquia vertical é dirigida pelo Dr. Augusto Raul Paulino.
Embora de vertente oposta, não tarda também que Benigno Parente Júnior, ex-director de crédito do extinto Banco Austral e ex-administrador do Conselho de Administração Provisório do mesmo banco, acabe por ser ilibado por falta de consistência de provas que sustentem a acusação que o mesmo Ministério Público deduziu contra ele. A PGR, nem mais nem menos, acusa Parente Júnior de ser um dos co-autores materiais do assassinato de Siba-Siba Macuácua, a 11 de Agosto de 2001, antes ou devido à queda, como tudo indica provocada, pelo poço das escadas do edifício-sede do então Banco Austral, na Av. 25 de Setembro, em Maputo-Cidade, onde hoje funciona o banco Barclays que nada tem a ver com este caso.
Vai para oito anos e só agora a PGR se lembrou de nos surpreender com uma acusação mesmo a dar a entender – à boa maneira de quem pensa que os outros são burros – que se está finalmente a querer resolver o mistério que persiste sobre a morte do Dr. Siba-Siba Macuácua.
Ai comunidade internacional a quando obrigas quando condicionas o desembolso da ajuda financeira ao desfecho de casos tão bicudos!!!... Ai que maneira tão ridícula que se encontrou para escusar de responsabilidades quem não convém beliscar!...
Não tarda também que algo surpreendente venha a suceder no processo judicial relativo a desvios de fundos e outras falcatruas na «Empresa de Aeroportos de Moçambique». O PCA, Diodino Cambaza, ainda não destituído mas presentemente encarcerado, já disse nos autos, a crer-se em notícia dada por um dos semanários, que os desvios de valores da empresa, de que é acusado ser autor, foram afinal para financiar o Partido Frelimo. Por outras palavras quis dizer que não roubou por sua própria iniciativa, mas tê-lo-á feito por ordens de quem decide; por ordens de quem nomeia as administrações das instituições em que o Estado, representado pelo Governo e ao mais alto nível pelo presidente da República, tem a última palavra a dizer. Por sinal o presidente da República é também presidente do Partido Frelimo e isso cruza bem as hipóteses suscitadas!.. embora nada esteja provado.
Tudo isto se assemelha a episódios de uma tragicomédia ou mais uma cena de circo, se quisermos.
Estamos perante uma Procuradoria Geral da República (PGR) totalmente desacreditada. Desacreditada por não acertar uma. Desacreditada por deixar claro aos olhos de quem não quer ser cego, que está ao serviço de lobbies e não propriamente da Justiça que se pretende isenta. Anda como uma barata tonta. Diz uma coisa hoje e faz outra amanhã. Prende e depois não sabe justificar porque o fez. Prende e depois permite lavagem de imagem. Prende e depois arranja maneira de ajudar a resolver problemas políticos que estão à vista de toda a gente e só não vê quem se recusa a ver.
Estamos perante uma PGR que não sabe ser Estado. Estamos perante uma PGR onde impera gente que dá sinais de ter o rabo preso. Da grande esperança que suscita no início quando começa a agir, passa a bobo de festa.
Para alguns é cedo para tirarmos conclusões sobre este elenco ao mais alto nível da Procuradoria Geral da República. Contudo, o que já é publicamente conhecido – pelo menos para quem já se deixou de andar à procura de saber qual o sexo dos anjos – não há dúvidas de que estamos muito longe de ter no País uma PGR dotada de gente capaz ao mais alto nível, se bem que a outros níveis, onde o poder político “esclerosado” que temos não tem braços nem pernas para chegar, já se comece a vislumbrar alguma qualidade nos processos e estrito cumprimento da lei. Verdade seja dita: ainda que não se valorize essa muita gente com alguma qualidade que começa a rechear o aparelho do Ministério Público a níveis subalternos e um pouco por todo o território nacional, valha-nos essa gente que começa a honrar e dignificar o País e a Justiça em Moçambique. À parte essas excepções, tirem-nos da frente, por favor, estas “encomendas” que nos andam a querer deitar poeira nos olhos!...
Sempre que não há indícios do caso mexer com a numenklatura ou com os interesses de gente, essa sim, notoriamente suspeita de envolvimento em casos de enriquecimento duvidoso e com indícios claros de crime, ou com interesses directos no chamado partidão, vemos que a Justiça deu e continua a dar passos animadores que nos fazem acreditar no futuro. Mas quando envolve nomes sonantes, sempre que a conclusão pode deixar a nu os verdadeiros corruptos, aí os problemas começam a sobressair… Despronuncia-se quem já era dado como o maior ladrão deste mundo, ou começa-se a procurar bodes expiatórios, ou deita-se água na fervura quando convém ilibar alguém de responsabilidades por inconfessas razões. Tudo se apresenta sem consistência, muito à laia de cenas de “circo”, ilusionismo…
No caso de Manhenje começou-se por alegar que ele estava implicado no sumiço de 200 milhões de meticais (duzentos mil milhões da Velha Família do Metical) dos cofres do Ministério do Interior, quando era o principal funcionário do Estado na instituição. Agora só o acusam de ter responsabilidades sobre quinhentos mil meticais, valor que não passa de qualquer coisa como vinte mil dólares de quase 10 milhões de USD que era inicialmente a acusação sustentada por uma auditoria às contas do Ministério que o actual ministro do Interior, José Pacheco, mandou fazer antes de tomar posse do cargo para que o presidente da República Armando Guebuza o nomeou há cerca de 4 anos.
Não tarda o Estado ainda vai ter de pagar a Manhenje uma indemnização por danos incalculáveis ao seu bom nome. Aí somos nós os contribuintes que vamos ter de pagar. Sempre nós. Roubam-nos nas instituições e depois roubam-nos para pagarem os erros de pessoas que nunca são responsabilizadas por coisa alguma. Desgraça a nossa!
Estamos perante uma PGR submissa e às cambalhotas. Do que nos está a ser dado ver sobressai a tremenda falta de independência da Justiça que vamos tendo. É mesmo preocupante o que está a acontecer!
Podem pensar que os moçambicanos são parvos, mas não são seguramente o que se imagina. Estamos em ano de eleições. Quem terá a coragem de não contribuir mais para que este estado de coisas continue? Já alguém disse um dia, algures, que “no reino dos Trinitás precisa-se de um Bud Spenser”. Que bem que calha este apelo agora aqui entre nós! Que venha! Basta de circo!
(Canal de Moçambique & Semanário Zambeze) - 26.02.2009