Aeroporto Eduardo Mondlane, sim
Na última edição do Semanário ZAMBEZE, Francisco Rodolfo, solicito funcionário do Ministério dos Transportes e Comunicações, membro activo do Partido Frelimo e cronista regular deste semanário, propôs na sua habitual rubrica “MAPUTADAS” que o nome do primeiro presidente da Frente de Libertação de Moçambique, Doutor Eduardo Chivambo Mondlane venha a ser atribuído ao Aeroporto Internacional de Maputo. A proposta veio em boa hora. E teve o mérito de fazer jus a um dos homens que conseguiu unir num só movimento os grupos que já pensavam em conseguir a auto-determinação e independência do País mas que, divididos, estavam a encontrar barreiras difíceis de transpor e a adiar a emancipação de todo um povo.
A proposta de Francisco Rodolfo peca apenas por estar incompleta, a nosso ver.
Eduardo Mondlane foi o primeiro presidente da Frente de Libertação de Moçambique. Só isso basta para que todos os moçambicanos se revejam nele que foi líder da marcha em que os nacionalistas das mais variadas tendências se uniram até se dividirem apenas com a extinção da Frente e com a consequente criação, sob a mesma sigla ou acrónimo, FRELIMO, do Partido Frelimo que passa a ter propósitos diferentes, abandona o princípio que até então vigorava, de inclusão, e passa a ter como desígnio servir apenas certas pessoas num claro esforço de exclusão dos que defendiam outras valências. Acabou tudo, como se sabe, com uma tremenda guerra civil.
Nessa epopeia pela união de todas as tendências políticas e ideológicas, numa única frente pela independência nacional – a Frente de Libertação de Moçamnbique – o sulista Eduardo Chivambo Mondlane não esteve só. Com Mondlane, no posto de vice-presidente da ex-Frente de Libertação de Moçambique, esteve também o Reverendo Urias Simango, um cidadão do Centro-Norte do país. E com Mondlane e Simango estiveram muitos outros heróicos combatentes das províncias mais próximas do Rovuma.
Concordamos plenamente que Eduardo Chivambo Mondlane tem perfil para que o seu nome seja atribuído ao Aeroporto Internacional de Maputo.
Concordamos, sobretudo pela dimensão da obra dele e de todos os que revistos nele uniram os moçambicanos no projecto pela auto-determinação e independência. Concordamos não apenas por Eduardo Mondlane em si, mas, sobretudo, pelo que nele se personificava. E concordamos mais do que tudo porque se está a propor um nome de alguém que não está vivo.
Estamos absolutamente contra a prática que se tem visto por aí de se dar a obras publicas o nome de alguém ainda sobrevivo. Quanto a nós são actos de verdadeiro culto da personalidade próprios de regimes totalitários e de mentes absolutistas. Opomo-nos abertamente a esses egocentrismos. E achamos que ficaria bem a isso também se passarem a opor todos os moçambicanos com bom senso. Culto da personalidade dá sempre errado. Acaba pela certa em DITADURA. Já vimos esse filme!…
Sabendo também que está para breve a inauguração da Ponte do Zambeze, entre Caia, na província de Sofala, e Chimuara, na província da Zambézia, ao concordarmos que se dê o nome de Eduardo Mondlane ao Aeroporto Internacional de Maputo, queremos também aqui deixar proposto que se dê a essa nova obra de arte e de grande engenharia o nome do Reverendo Urias Simango.
Quis o destino que a Ponte fosse construída em ambiente já de fraternidade, por cidadãos do ex-país colonizador e por moçambicanos já livres e senhores da sua terra. Para que isto fosse possível começou por contribuiu também Urias Simango, a secundar Eduardo Mondlane.
Urias Simango, note-se, não foi a peste que certos senhores pintam. Ele não foi só o primeiro vice-presidente da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO). O reverendo Urias foi também um dos obreiros da unidade nacional, até o começarem a perseguir por defender um regime como o que hoje temos em Moçambique, com características que quem o mandou matar, na época odiava mas hoje faz delas a sua bandeira já com os bolsos cheios de meticais e dólares, numa superior forma de capitalismo a que arrogantemente em tempos se opuseram os que acabaram por matar os que com eles discordavam.
Urias Simango foi ostracisado e vilipendiado apenas porque defendia um regime de economia de mercado e de respeito pelos direitos humanos. Defendia que a unidade só seria possível com respeito pela diversidade. Defendia o pluralismo e o direito à diferença. Defendia a tolerância. Hoje, já em liberdade, depois do Acordo Geral de paz em Roma, sem ameaças das armas e de insultos, já podemos falar dos seus feitos sem irmos parar aos campos de extermínio a que chamavam de “reeducação”.
O reverendo Urias Simango contribuiu tanto como Mondlane para a unidade que se julgou imprescindível à formação da Frente de Libertação de Moçambique. O seu defeito pode ter sido não ser marxista-leninista, mas esse defeito a história veio a julgar. Os que lhe viam tantos defeitos por isso hoje são das mais ricas e abastadas figuras do regime que vigora em Moçambique. Afinal é doce o pão que o diabo amassou!…
Não queremos levantar fantasmas. Queremos apenas dizer que os ideais de Urias Simango vingaram e o seu nome ficaria bem na nova ponte do Zambeze. Mas não só por isso. Não nos podemos esquecer que o reverendo não foi em algum momento preso pela Polícia Tanzaniana por suspeita de assassinato de Mondlane em casa de Betty King, como chegaram a ser Joaquim Chissano, Marcelino dos Santos e Pamela Santos. Foi até Urias que dirigiu as exéquias fúnebres do Presidente Mondlane.
Com o nome de Mondlane no Aeroporto de Maputo, a imagem de unidade ficaria para a eternidade a ser passada a todos nós e aos que nos visitam, defende Francisco Rodolfo.
Com o nome do Reverendo Urias Simango atribuído à nova Ponte do Zambeze – nesse grande rio que tanto nos orgulha – já que a outra ponte a montante, na Cidade de Tete, se chama Ponte Samora Machel, ficaria fechado o ciclo da reconciliação entre os moçambicanos. A unidade que hoje ainda tanta falta também nos faz, sairia reforçada.
Com esse gesto nobre, quem tem dirigido o país deixaria de continuar a ser visto como quem apenas sabe homenagear os heróis do Sul.
Moçambique ganharia muito com um gesto nobre dessa dimensão.
Se o presidente Armando Guebuza prescindisse de dar o seu nome ou o de Joaquim Chissano à nova ponte do Zambeze e optasse por aproveitar o momento para ele próprio se redimir dos erros graves de que foi cúmplice no passado relativamente a Urias Simango, só sairia a lucrar com isso.
Se o actual chefe de Estado tiver a coragem de dar o nome de Urias Simango à ponte do Zambeze, quando ele morrer certamente que a história o lembrará para sempre. Se lhe faltar força para isso, talvez a ponte do Zambeze um dia venha a ter de mudar de nome. A reconciliação fica adiada.
Os gestos de quem hoje promova a reconciliação farão de quem os assuma, alguém sublime. Estamos cá para ver o que se segue.
ZAMBEZE - 19.02.2009
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