Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
A multiplicação de apelos para que haja ou se crie um partido que dê aos moçambicanos uma nova esperança quanto ao seu destino vai continuar e tem a sua razão de ser em face da calamitosa situação em que vive a maioria dos moçambicanos.
Não se pode negar a legitimidade de pessoas que procuram através de meios lícitos alcançarem alguma coisa que traga a dignidade necessária a seres humanos que tenham sido continuamente esquecidos pelas elites que se apoderaram de todos os poderes neste Moçambique. Se havia algumas dúvidas sobre a necessidade de uma nova força política isso já deixou de ser o caso.
Quando dizemos que nem tudo o que parece ser o é isso vem de uma apreciação daquilo que nos tem sido oferecido em termos de informação pelos diferentes protagonistas e pela comunicação social. Não se pode “parar o vento com as mãos” diz o ditado e os moçambicanos, uma franja importante deles, geralmente pessoas que se sentem ludibriadas pelo projecto político que tinham abraçado no quadro da maior força da oposição em Moçambique, a Renamo, aparecem com uma vontade nunca antes vista de abraçar um novo partido ou movimento político.
Não se verificou o mesmo aquando de desentendimentos anteriores no seio da Renamo. Parece que o surgimento do PDD por exemplo foi como que programado segundo fórmulas pré-concebidas e financiado por interesses políticos que não tinham origem num sentimento popular enraizado. De outro modo não se consegue explicar o evidente descalabro ao nível das urnas após um início auspicioso.
O que se passa neste momento é que uma fatia considerável do eleitorado moçambicano apresenta-se disposta a não obedecer àqueles que antes se supunham depositários incontestáveis da vontade popular. Se antes diziam que perdiam as eleições porque o partido no poder estava fazendo batota, as pessoas parecem cansadas de acreditar em tal coisa. Fala-se que tem havido vendas e compras entre lideranças de partidos tudo visando manter a actual estrutura do poder inalterada. Qualquer suspeita desse tipo não é, evidentemente, bem vista pelo eleitorado que se sente continuamente sacrificado. Diz-se que há líderes da oposição nomeadamente da Renamo que nunca estiveram interessados em atacar com consequência a actual ordem vigente porque lhes convém o status quo.
Se o PDD de Raul Domingos não conseguiu transformar o entusiasmo inicial numa força que o levasse a conquistar franjas cada vez maiores do eleitorado.
O movimento que se prenuncia e que poderá vir a designar-se por MDM, parece arrancar com uma outra base. Logo à partida pode dizer-se que começou com o pé direito. A vitória dos que decidiram abraçar a desobediência democrática nas eleições autárquicas na Beira é um sinal importante do que pode um movimento fazer em termos políticos. Não se pode negar que a vitória foi resultado de trabalho e de uma capacidade de controle e fiscalização que até faz inveja a partidos enraizados e com anos de existência.
Vaticínios não vão ser suficientes para parar a vontade popular numa situação em que de ano para ano vai piorando a vida das pessoas. Os moçambicanos mesmo sem recurso a grandes esforços têm tido a capacidade de aprender que os políticos que os procuram conquistar, são muitas vezes movidos por sentimentos que não são de confiar.
Tudo o que as sucessivas legislaturas tem produzido deixa muito pouco a desejar. Os problemas remetidos ao Parlamento acabam quase sempre sem as soluções desejadas mesmo quando a razão está do lado de quem se queixa.
Do governo o que se tem visto é uma preocupação em aparecer como protagonista de tudo o que cheire a ouro. Dos partidos políticos tradicionais a apatia só termina nos períodos de campanha e quando isso acontece é a repetição de promessas de que o eleitorado já está farto.
Um novo movimento político para ter pernas para andar vai significar muito trabalho num ambiente político em princípio hostil.
Os primeiros sinais de que algo de facto surgirá são dados pela vontade e determinação demonstrada desde os primeiros dias da revolta democrática na Renamo, aquando do dito por não dito sobre os candidatos à presidência da autarquia da Beira.
De facto, se alguma coisa vai resultar deste movimento, há que prestar atenção extrema nas alianças que se estabeleçam. Não se pode recusar a vontade de quem se apresente como candidato a membro sob qualquer tipo de alegações. Também espero que não se assista a exercícios que se viram na Renamo em tempos, como interferir e negar a candidatura de novos membros sob pretextos escusos. Se por um lado há que ter cuidado com infiltrações que coloquem em risco os interesses estratégicos do movimento, por outro lado há que também prestar atenção a certas tendências que se desenvolvem no seio de movimentos políticos, com os mais veteranos negando-se a admitir a inclusão de novos membros, só porque isso iria afectar determinados status.
Eu, pessoalmente teria simpatia por um movimento que albergasse outras forças políticas já existentes no terreno pois isso iria dar um sinal de que afinal os políticos estão compreendendo que a união faz a força.
É da divisão da oposição que outros colhem dividendos. Se projectos políticos podem ser aglutinados por força das semelhanças e da compreensão das suas vantagens estratégicas, então porque não avançar por aí? Isto é, se a criação do movimento significasse a aglutinação de alguma oposição que até aqui se tem manifestado como desnorteada, acredito que daí se colheriam dividendos. Importa compreender que o espectro político não comporta assim tantas diferenças de conceitos ou filosofias.
O que muitas vezes emperra as máquinas dos partidos e não os faz funcionar como seria de desejar são factos relacionados com egos dos dirigentes.
Tem sido mais uma perspectiva de reinar sem sombras que leva a que alguns políticos enveredem pela via de criação de partidos políticos e não propriamente qualquer diferença ideológica. O mesmo fenómeno já se verificou no seio de algumas confissões religiosas.
Decerto que muita tinta vai correr e as coisas ainda estão num estágio que se pode considerar primário.
Qualquer que seja a via a seguir ou decidida, o que se deve esperar é que haja uma clarividência política que coloque os superiores interesses dos moçambicanos acima de intrigas, lutas intestinas, por poderes e relevância.
Se não há acordo com a actual maneira de fazer política é porque nela não se vislumbram sinais de aceitação e prática da democracia.
Esse deve ser o princípio que deve guiar tudo o que se faça. (Noé Nhantumbo)