Projecto dos“sete milhões” na Zambézia
Por Armando Nenane
O processo de reembolso dos empréstimos concedidos pelo governo a vários mutuários no âmbito da aplicação do Fundo de Investimento à Iniciativa Local (FIIL) está a decorrer a uma velocidade de camaleão nos distritos de Chinde e Mopeia, na província da Zambézia. Apesar de ter constatado esse facto, a ministra da Função Pública, Vitória Dias Diogo, que efectuou uma visita de trabalho àqueles distritos no âmbito do lançamento do programa nacional de ensino à distância para funcionários da administração pública, minimizou o problema, tendo considerado que o programa está a surtir os efeitos desejados pelo governo. Fez notar que os reembolsos dependem muito do ciclo de rendimento de cada projecto, para além de que muitos deles têm sido assolados pelas calamidades cíclicas.
Muitas vezes criticado em diferentes fóruns económicos, o Fundo de Investimento à Iniciativa Local (FIIL), instituído em 2007 e que agora atingiu os cerca de “nove milhões” de meticais para cada distrito, é atribuído a projectos cujos custos estão fixados entre 50 e 500 mil meticais. Na sequência da sua implementação, certos bancos comerciais e alguns críticos afins não têm visto com bons olhos aquela iniciativa governamental, devido à falta de clareza no concernente às garantias dadas pelos mutuários para o reembolso dos créditos concedidos. Eles entendem que com essa acção o governo poderá estar a roubar o protagonismo à banca, retraindo o processo de bancarização da economia nos distritos mais recônditos do país. Os bancos comerciais, segundo os defensores desta corrente, não irão para os distritos, supostamente porque lá encontrarão o governo a fazer o papel que é suposto ser deles por excelência.
“O governo está a cumprir a sua responsabilidade”, Vitória Diogo
Face a esse cepticismo, já demonstrado pela banca comercial e por alguns economistas reputados, a ministra afirmou que cada actor social tem o seu papel no processo de desenvolvimento nacional.
Para a ministra, aquele fundo não pode ser visto como uma instituição que visa colocar o governo numa situação de concorrência desleal com a banca comercial. “O governo está a fazer o seu papel, o qual consiste em promover o desenvolvimento económico e social das populações, enquanto que os bancos comerciais também têm o seu papel, que é muito bem claro”, disse Diogo.
Embora o programa em curso possa estar melhor escudado sob o ponto de vista político, podendo mesmo visar acautelar interessses eleitoralistas, os críticos não vêem nele uma melhor fundamentação sob o ponto de vista financeiro e acrescentam que o governo, cujo papel consiste em promover o bem-estar social das populações, não tem melhores garantias de que o dinheiro dado será devidamente reembolsado.
Aliás, os administradores dos distritos de Chinde e Mopeia disseram à ministra que o nível de reembolso dos pedidos efectuados ao FIIL são baixos e não ultrapassa a fasquia dos cinco por cento, uma realidade que parece não fugir muito à regra do que acontece no resto dos distritos, um pouco por todo o país. Por outro lado, aqueles administradores indicaram que as dificuldades de reembolso estão mais presentes nas áreas da agricultura devido às calamidades cíclicas que têm assolado a produção, uma situação que já não se verifica assim tanto no sector comercial.
“Governo não concorre com a banca”
A ministra Dias Diogo insistiu que o FIIL é um quadro que visa beneficiar aqueles que não têm acesso à banca, referindo que o governo está a organizar-se para que continue a haver apoio.“Trata-se de uma responsabilidade social do governo e enquadra-se na eleição dos distritos como pólos de desenvolvimento. Os que beneficiam desse fundo não têm garantias para serem dadas à banca comercial, mas têm vontade de trabalhar, daí que o governo não concorre com os bancos”, disse Diogo.
Outra crítica que tem sido feita ao FIIL e que mereceu o comentário da ministra tem a ver com o alegado facto de haver situações de nepotismo no processo de atribuição àqueles que submetem projectos. Aliás, um estudo recentemente divulgado pelo Ministério da Planificação e Desenvolvimento indica que há uma enorme insatisfação da parte daqueles mutuários cujos projectos foram chumbados supostamente por não preencherem os requisitos exigidos.
Para a ministra, os funcionários da administração pública, a quem compete avaliar os projectos que se candidatam aos fundos, agem sob regras rígidas e obedecem a uma série de requisitos. “Os funcionários que não cumprem com os procedimentos legais ou que violam a lei são processados disciplinar e/ou criminalmente”, disse a governante.
De pequeno a grande comerciante
No distrito de Chinde, a ministra conversou com Domingos Francisco Duli, um comerciante que teve acesso a 250 mil meticais do Fundo de Investimento à Iniciativa Local para melhorar o seu negócio. Diogo ficou impressionada com os resultados alcançados por aquele comerciante graças ao financiamento a que teve acesso.
Francisco Duli iniciou sua actividade comercial com uma pequena banca no interior do mercado. Foi nessa banca que o comerciante aprendeu a arte do negócio. Em 2007, requereu o empréstimo ao governo e comprou, por cerca de 125 mil meticais, o estabelecimento comercial no qual hoje opera, por sinal o único existente no distrito de Chinde e que oferece produtos de primeira necessidade.
O empréstimo serviu também para Duli adquirir um barco a motor a fim de trazer produtos a partir do outro lado do rio Zambeze, em Marromeu, onde também adquiriu um carro que traz produtos de outras partes das províncias da Zambézia e Sofala. “Mudei muito com a ajuda”, disse o comerciante, acrescentando que conseguiu empregar pelo menos 10 pessoas no Chinde e em Marromeu.
No concernente ao reembolso, Duli disse ao SAVANA que acaba de fazer um pedido no sentido de poder começar a pagar o valor a partir do segundo semestre, uma vez que no ano passado o distrito teve muita fome. “Embora tivesse muito produto, não tive compradores”, frisou.
Neste momento, Duli está a pensar em desenvolver um projecto de abastecimento de material de construção e para tal espera pedir mais dinheiro ao governo.
Mas por que não usar os lucros do actual negócio para desenvolver um outro?, questionámos, ao que o comerciante nos respondeu: “Não seria suficiente”.
Alguns poderão ser processados
No distrito de Mopeia, pelo menos 56 projectos de diversas áreas de actividade tiveram acesso ao FIIL em 2009, contra os 54 projectos de 2008, alguns dos quais foram visitados pela ministra da Função Pública na sua digressão pela província da Zambézia.
Os projectos são de áreas relacionadas com a produção de comida e geração de rendimento. Os referidos projectos deram lugar a pelo menos 548 postos de trabalho.
De acordo com o administrador de Mopeia, Simão Manuel, parte dos que beneficiaram do financiamento tem estado a mostrar desinteresse em reembolsar os respectivos valores. Embora reconheça que o fraco nível de reembolso também poderá ter a ver com a falta de conhecimentos de gestão da parte de alguns dos mutuários, Manuel acredita que alguns deles poderão ser processados devido à falta de interesse de reembolsar o dinheiro, pois “o dinheiro que foi dado é para ser devolvido”.
O distrito de Mopeia, ainda segundo o administrador, dispõe de um fundo de exploração madeireira, o qual é atribuído aos madeireiros que realizam algumas acções de responsabilidade social nas áreas em que exercem as suas actividades, como a abertura de furos de água, fabrico de canoas, abertura de vias de acesso, entre outros.
SAVANA - 30.03.2009