O EX-PRIMEIRO-MINISTRO da Guiné-Bissau, Aristides Gomes, atribuiu a série de golpes de Estado e assassinatos no seu país ao que chamou de produto da “convivência entre carrascos e vítimas” no seio do seu antigo partido, o Partido para a Independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde (PAIGC).
Maputo, Segunda-Feira, 27 de Abril de 2009Notícias
Segundo ele, as bases da conflitualidade no país estão bem instaladas na própria estrutura interna do PAIGC (Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde, no poder) cuja “relação carrascos-vítimas contribui para a proliferação de golpes de Estado e assassinatos”.
Explicando as razões da sua ruptura com o actual partido no poder na Guiné-Bissau, ele indicou que o PAIGC perdeu a sua vocação de desenvolvimento e passou a estar ao serviço de interesses pessoais. “O PAIGC, hoje em dia, é uma organização utilizada por indivíduos ou pequenos grupos na sua estratégia de aceder ao poder e ter uma maneira de viver”, disse numa entrevista à PANA.
Aristides Gomes foi primeiro vice-presidente do PAIGC até 2008 quando decidiu criar a sua própria formação política, o Partido Republicano da Independência para o Desenvolvimento (PRID).
Disse acreditar que as pessoas “ainda têm a oportunidade de ver que, afinal, tínhamos razão nessa ruptura com o PAIGC (…), uma organização que perdeu aquela característica de partido de desenvolvimento”. Para ele, o seu antigo partido político e do pai da independência nacional, Amílcar Cabral, “deixou de ser uma boa equipa, apesar de ainda conservar muitos craques no seu seio”.
“Uma equipa pode ter craques individualmente e não ganhar colectivamente. Não ganha porque não constitui uma equipa, pois cada craque joga para resolver os seus problemas pessoais. É o que acontece com o PAIGC”, exemplificou.
O actual líder do PRID reconheceu, entretanto, que em termos simbólicos, o PAIGC “é uma organização que ainda tem implantação na Guiné-Bissau” por ter dirigido a luta pela independência nacional. Nesse aspecto, disse, “o mito está ainda salvaguardado porque, social e economicamente, a Guiné-Bissau não conseguiu ultrapassar a situação pós-independência, estando mais ou menos no mesmo estágio”.
“A Guiné-Bissau está a patinar. É só com a mudança social e económica que os mitos desaparecem e se criam novos mitos em função das novas ambições e das novas situações sociais económicas criadas.
“Ora, a Guiné-Bissau conserva até agora aquela mesma base de pobreza, de falta de progresso social e económico. O PAIGC aproveita-se desta situação. O mito continua e o país vive do seu passado onde a única referência é a luta pela independência”, disse.
A este propósito, disse crer que no dia em que o país passar a uma fase nova de desenvolvimento social e económico, o tal mito “vai mudar de capa e da própria alma”, mas que enquanto a situação não mudar, “vamos continuar a viver no mito do passado como até agora”.
No seu entender, as lutas intestinas já têm uma tradição interna e estão encrostadas no seio das estruturas do próprio PAIGC pelo que “acabam por imolar a capacidade de programação, de perspectivar e de realizar o processo de desenvolvimento da Guiné-Bissau”.
“Por isso é que pode (o PAIGC) ter 90 deputados (dos 100 possíveis) mas nunca vai conseguir fazer avançar o país porque não consegue sequer governar-se enquanto organização”, sublinhou. Disse não ser um acaso que o assassinato do general Tagmé Na Waie e do Presidente da República, em Março passado, tenha surgido “logo após lutas internas no PAIGC pelo controlo do Parlamento e do Governo”.