MARCO DO CORREIO
Por Machado da Graça
Bom dia, Luís
Estás bom, pá? Do meu lado está tudo bem, felizmente.
Estava aqui a ouvir, na rádio, um funcionário superior do ministério encarregado de lidar com a função pública. Estava a falar sobre a nova política salarial e a tentar explicar a razão de, desta vez, se estar a fazer o oposto do que se fazia anteriormente.
Mas eu explico.
Nos anos anteriores a política era aumentar em maior percentagem os trabalhadores que ganham menos e em menor percentagem os que ganham mais.
Desta vez, no aparelho de Estado, vão aumentar numa percentagem menor os que ganham menos e numa percentagem maior os que ganham mais.
Isto é, os pobres vão ficar na mesma pobreza e os ricos vão ficar ainda mais ricos.
Com esta medida o Governo deitou para o caixote do lixo da História quaisquer resquícios de socialismo que ainda tivesse. Agora é beneficiar ainda mais os mais ricos. Sem qualquer pudor.
É certo que as percentagens de aumento, entre 14% e 28%, são maiores do que nos anos anteriores, mas não nos podemos esquecer que estamos em ano eleitoral e, nestes períodos, é normal os governos abrirem um pouco os cordões à bolsa para ver se conseguem amealhar mais uns votos.
E alguns dos beneficiários deste critério vão ser os quadros médios, jovens, com formação superior e, até aqui, pouco virados para a política. Os tais que têm engrossado, de eleição para eleição, as percentagens da abstenção. Muitos deles não terão o aumento máximo, mas terão um aumento bastante maior do que teriam se o critério usado fosse o oposto.
A justificação que o sr. Director Nacional se esforçou por dar foi de que o leque salarial estava muito achatado. Isto é que, na opinião do Governo, a diferença entre o salário mínimo, na Função Pública, e o salário mais alto era muito pequena.
Infelizmente não tenho esses dados aqui comigo, mas gostava de saber quantas vezes mais ganha o mais bem pago do que o mais mal pago. E comparar essa diferença com outros países. Por exemplo a Suécia.
Creio que isso nos daria uma ideia muito mais clara da situação real entre nós. Nos daria um retrato muito melhor focado do que aquelas frases sempre repetidas, mas nunca exemplificadas do sr. Director Nacional.
O Emílio Manhique ainda tentou defender a melhor lógica do critério anterior, mas foi rapidamente abafado pela argumentação, vaga, mas contínua, do entrevistado.
Entrevistado esse que defendia a medida, muito provavelmente, não só por ser a política definida pelo Governo, mas também por ele próprio, pessoalmente, ir beneficiar bastante com ela.
Há que dar, portanto, os parabéns aos bem pagos gestores da nossa terra, porque vão ser ainda melhor pagos. E dizer aos mal pagos que ainda não é desta que a situação deles se vai alterar de forma significativa.
Se é que se altera mesmo alguma coisa, sabido como é que, por estas alturas, os preços têm tendência para subir.
Mortos e enterrados estão os tempos em que se dizia que os dirigentes eram os “primeiros nos sacrifícios e últimos nos benefícios” e outras coisas semelhantes.
E é em momentos destes que eu fico estarrecido quando ouço gente da RENAMO a chamar “comunistas” aos dirigentes da FRELIMO.
Quais comunistas, meu caro Luís. Capitalistas e do mais selvagem capitalismo que por aí existe.
Mondlane dizia que não fazia sentido estar a destruir o capitalismo para, depois da independência, o voltar a construir com moçambicanos.
Samora tentou criar um Estado socialista.
Mas mataram-nos aos dois.
Os sobreviventes estão bem e, é claro, prósperos.
Gerindo à sua maneira o capitalismo e a exploração do homem pelo homem, como se dizia antigamente.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.
Podiam era não mudar de forma tão completa...
Um abraço para ti, Luís, do
Machado da Graça
CORREIO DA MANHÃ – 30.04.2009