Comentário
Salvador Raimundo
Há dias, Manuel Chang veio a público dizer aos moçambicanos que o Estado corre o risco de perder – ou já perdeu – qualquer coisa como 100 milhões de dólares norte-americanos, dinheiro que estava previsto para o Orçamento do Estado deste ano.
O Ministro das Finanças sustentou que tais valores resultariam da venda do alumínio, do algodão e do camarão no estrangeiro. Mas como a crise financeira internacional está a condicionar alguns mercados, aqueles produtos nacionais tendem a perder espaço e os operadores forçados a reduzir o preço.
Atento a todo este cenário, o Governo de Moçambique, ainda segundo Chang, há um mês que iniciou uma revolução interna de modo a se fazer poupança, atravez da redução de gastos ministeriais, sob a batuta do peloiro de Manuel Chang.
Decidimos iniciar “O Meu Estado da Nação” exactamente por este capítulo, o das finanças públicas. Porque há muita gente, anónima, a intensificar as reclamações de em Moçambique não haver dinheiro para a maioria, mas sim para um punhado de indivíduos.
Com as suas palavras, o Ministro das Finanças terá tentado transmitir a ideia de que a “ausência” de dinheiro no bolso dos moçambicanos tem a ver com o facto de o alumínio, o algodão e o camarão terem perdido mercado lá fora. E que as autoridades têm estado a lutar contra este triste cenário.
Mas o Zé Povão não tem nada a ver com isso. Não quer saber se o alumínio, o algodão ou o camarão têm ou não têm mercado no estrangeiro, sobretudo porque Manuel Chang, quando tais produtos têm negócio, em nenhum momento veio a público congratular-se pelo facto de Moçambique angariar dinheiro – sabe-se agora que são 100 milhões de dólares/ano – à custa daqueles três produtos de marca nacional.
Esta situação, que à priori parece de menor importância, tira a seriedade das palavras do Ministro das Finanças.
Ele que falasse nos momentos de boa saúde financeira, para que os seus discursos em tempo de vagas magras tenham alguma credibilidade.
Em Moçambique, as máquinas administrativa, legislativa e política estão funcionais. Nada está parado, mesmo em tempo de aparente crise, em nenhum momento o País ficou estagnado por causa do rebentar de um problema de âmbito nacional. Isto dá a falsa ideia de que está tudo bem, que não há nenhum problema que condicione o pleno funcionamento daquelas.
Na verdade, quem tem a missão de fazer a gestão financeira e administrativa das instituições ministeriais, sobretudo estas, sabe o quão é dificílimo aturar o actual momento, porque não há dinheiro para funcionar e as despesas essenciais são enormes. Em muitos casos, o pouco dinheiro prometido pela gestão central do erário público, raramente é transaccionado em tempo útil.
E quando surgem políticos como Raul Domingos a reclamar igualdade de tratamento entre os candidatos à Ponta Vermelha, à Assembleia da República e para as assembleias provinciais, fica a ideia de que haverá, por aí, algum candidato em melhor vantagem em termos de condições de fazer campanha, mas não somente.
Em teoria, o Partido que sustenta o Governo do dia é a organização que detém mais fundos para se fazer no terreno da campanha e, desse modo, melhor convencer o eleitorado a votar na sua marca.
O pronunciamento de políticos como Raul Domingos também pode ser interpretado como estando de mão estendida no tão habitual “tá pidir” fundos, aos que detém dinheiro em Moçambique e lá fora, no estrangeiro.
Mau grado o facto de nas gerais de 94 ter havido o famoso “trust fundo” para todos os candidatos ao processo eleitoral, pois desde então, os políticos se acham no direito de reclamar dinheiro cada vez que no País se avizinham eleições.
A relação entre as queixas de Manuel Chang e as de Raul Domingos é tão simples como isto. Há, no seio do Zé Povão, quem suspeite haver a retenção de dinheiro com o propósito de alimentar o processo eleitoral, não apenas atravez da Comissão Nacional de Eleições (CNE), como por intermédio de esquemas bem engendradas entre os partidos políticos. Isso faz com que não haja dinheiro e os moçambicanos tenham de suportar um Ministro das Finanças envolto em esclarecimentos nada convincentes.
A ganância pelo poder é capaz de fazer com que não haja dinheiro para o pleno funcionamento das instituições, desde que ele (dinheiro) seja canalizado a partiderizecos que, pese a sua pequenez, acabam dando uma ajudazinha ao processo de votação e ao falso equilíbrio de forças na futura Assembleia da República.
O recente protagonismo dado pelos agentes das Alfândegas não surpreende aos mais atentos. Se, por um lado, a iniciativa é de louvar, por outro, regra geral, acontece por alturas em que o dinheiro é cada vez mais necessário para colmatar diversos gastos.
Andar atrás de empresas que incorrem contra as normas aduaneiras é sempre de aplaudir.
Mas tais iniciativas devem, deveriam, ser mais abrangentes, que englobassem mais empresas que provavelmente andam fugidos do fisco. Continua
EXPRESSO – 29.06.2009