- O SAVANA soube que Lagos Lidimo convocou, recentemente, o actual chefe do Estado Maior das Forças Armadas para uma reunião em Boane, situação interpretada como “insubordinação e falta de respeito” pelas actuais chefias militares
- Nos próximos dias, Guebuza deverá reunir-se com Lidimo e Macaringue, num esforço para desanuviar as tensões
Reina um ambiente de mal-estar nas Forças Armadas de Defesa Moçambique (FADM), situação com epicentro num alegado relacionamento tenso entre o ex-Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), General Lagos Henriques Lidimo, e o actual boss dos militares, o general do exército Paulino José Macaringue. Aliás, circulam com alguma insistência na capital moçambicana indicações que sugerem uma iminente revolta na instituição castrense nos próximos dias, caso não haja uma “intervenção cirúrgica” do comandante em chefe das Forças de Defesa e segurança, Armando Guebuza. Apurámos, na noite desta quarta-feira, que estará para breve uma reunião entre Guebuza, Lidimo e Macaringue para desanuviar a tensão.
Na noite de Terça-Feira, circularam informações que advertiam sobre uma possível manifestação de militares agendada para o dia seguinte.
A mesma informação foi captada nos meios diplomáticos, que das diligências feitas junto da polícia conseguiram confirmar uma manifestação programada por soldados desmobilizados, tendo recebido garantias de que as autoridades estavam no terreno para a tomada de medidas preventivas. Contudo, nos mesmos circuitos diplomáticos veio mais tarde a circular uma outra informação, indicando que a revolta seria desencadeada por soldados no activo e não desmobilizados.
Lagos Lidimo
Lagos Lidimo, conhecido nos meios castrenses como o “baixinho do Planalto”, é objecto de frequentes rumores – em geral relacionados com alegações da sua contínua influência junto de alguns elementos influentes que continuam em posições chaves nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique, uma situação que estará a poluir o ambiente entre os militares.
Temido no seio das Forças Armadas devido ao seu papel durante o período em que foi chefe da Contra-inteligência militar, incluindo nas operações contra a Renamo na província da Zambézia, nos meados dos anos 1980, Lidimo continua aparentemente a influenciar algumas patentes no seio daquele sector, chegando mesmo a ultrapassar o poder das actuais chefias militares.
As nossas fontes relataram que há uma relação conflituosa entre Lidimo e Macaringue. É que Macaringue, um militar de academia, incluindo uma passagem como docente na prestigiada Universidade sul-africana de Witwatersrand, está a introduzir profundas reformas nas Forças Armadas. Dizem que Macaringue pretende prestigiar as Forças Armadas, profissionalizá-las e colocá-las na rota do desenvolvimento, contrariamente ao que acontecia num passado recente. Porém, Macaringue está a experimentar resistências, sobretudo vindas de elementos ainda leais a Lagos Lidimo.
Consta que Lidimo teria mesmo se oposto à nomeação de Macaringue para o substituir do cargo de Chefe do Estado Maior, aparentemente por o considerar um “desertor”, que preferiu prosseguir os estudos superiores, ao invés de se dedicar às FADM a tempo inteiro.
Aliás, o Presidente da República, Armando Guebuza, terá precisado de recorrer a um complicado jogo de cintura (negociações) para substituir Lagos Lidimo.
Aparentemente, as influências de Lidimo estendem-se ainda a sectores da polícia, onde terá conseguido bloquear algumas das transformações que o actual ministro do interior, José Pacheco, pretendia introduzir, nomeadamente, a criação de um corpo de elite profissional de combate ao crime organizado.
Quinta de Boane
Ao que o SAVANA apurou, recentemente, Lagos Lidimo, um maconde, nascido no planalto de Mueda, Cabo Delgado, terá convocado para um encontro, numa Quinta situada em frente do quartel de Boane, 30 quilómetros do centro da cidade de Maputo, o actual CEMGFA, Paulino Macaringue. Sublinhe-se que os funcionários desta Quinta, onde Lidimo cria gado, constavam nas folhas de salários das Forças Armadas, situação que mudou com a chegada das novas chefias.
Segundo os nossos informadores, após o “convite” de Lagos Lidimo, Macaringue, prudente, solicitou audiências com o Presidente da República e com o ministro da Defesa, Filipe Nyussi, para lhes comunicar da “estranha” reunião. Acrescentam que, Guebuza terá aconselhado Macaringue a fazer ouvidos de mercador. Contudo, este solicitou ao Presidente que o autorizasse a ir ouvir as pretensões do General Lagos Lidimo. No encontro, apurámos, Lidimo terá dito a Macaringue que os métodos que está a usar na gestão das Forças Armadas, poderão precipitar um descontentamento generalizado entre os militares. Acrescentam, as mesmas fontes, que Lidimo terá dito que Macaringue está a “maltratar os militares” e a faltar-lhes respeito.
Esta postura, contaram-nos os mesmos informadores, terá forçado Macaringue a recordar ao general Lagos Lidimo quem de facto era o CEMGFA, uma atitude que não agradou o antigo boss das FADM e agudizou o clima de tensão que reinava entre os dois.
Recorde-se que as mexidas nas altas chefias das FADM foram efectuadas em Março de 2008, pelo chefe do Estado, Armando Guebuza. Cessaram funções Lagos Lidimo, chefe, e o Tenente-General Mateus Ngonhamo, vice. Paulino José Macaringue e o Major-general Olímpio Cardoso Laisse Cambora foram indicados chefe e vice, respectivamente. Posteriormente, o Presidente aproveitou as mexidas nas FADM para também exonerar o então ministro da Defesa, Tobias Dai, uma figura que viu a sua imagem beliscada com os tristes episódios do paiol de Mahlazine, que ceifaram a vida a mais de cem pessoas, feriram 500 e provocaram danos materiais avultados.
Na altura, num acto interpretado como de demonstração de força, Lidimo contestou publicamente a terminologia “exoneração”.
“Eu não fui exonerado. Cessei funções”, frisou. A uma pergunta dos jornalistas sobre o futuro, Lidimo disse: “quem me tirou daqui (CEMGFA) terá que me informar para onde é que vou”, sublinhou, num tom interpretado como de intimidação. Na altura, Lidimo fez emitir um comunicado pouco usual do Estado Maior em paralelo com a Presidência da República, exigindo uma cerimónia de despedida com grande pompa e formalismo.
O CEM das FADM, Paulino Macaringue, era, até à sua nomeação, chefe da Política Nacional de Defesa. Olímpio Cambona era o Comandante Nacional do Exército. (Redacção)
SAVANA 17.07.2009