Radicais frelimistas exigem cabeça de Macuácua
Por Raul Senda
A eliminação de cerca de cinco mil proponentes da candidatura de Armando Guebuza pelo Conselho Constitucional (CC), por considerá-las inválidas por estarem feridas de vícios, está a criar um certo mal-estar nas hostes da Frelimo, com alguns sectores radicais do partidão a exigirem a cabeça do Secretário para a Mobilização e Propaganda, o jovem Edson Macuácua. O gabinete dirigido por Macuácua é o principal responsável pela recolha de assinaturas junto dos cerca de três milhões de militantes distribuídas em 200 mil células para sustentar a candidatura do candidato do partido. Porém, sectores mais moderados entendem que o mal deve ser dividido pelas aldeias.
Ao que o SAVANA apurou, esta intrincada questão deverá ser amplamente debatida e amadurecida na IV Sessão Ordinária do Comité Central da Frelimo que arrancou nesta quinta-feira na cidade da Matola e deverá terminar neste domingo.
Não é para menos. Das 20 mil fichas apresentadas, o CC detectou 5.102 documentos com uma série de irregularidades de fórum criminal, o que desagradou alguns sectores que não entendem como é que um partido organizado e com História como a Frelimo expõe-se a problemas daquela natureza. Fazem notar que dos três candidatos apurados pelo CC, Daviz Simango, um novato nestas andanças, teve o número mais baixo de documentos inválidos.
Afonso Dhlakama registou 9.644 proponentes inválidos, seguido de Guebuza com 5.102 e Simango com 4.343. Para alguns frelimistas, esta desorganização pode ser um indício do que pode acontecer nas eleições de 28 de Outubro próximo.
Outras fontes da Frelimo, mas pertencentes à ala mais moderada, afiançaram-nos que o Comité Central, após o debate, deverá dividir o mal pelas aldeias. É que segundo eles, as falhas cometidas não deverão ser imputadas apenas ao Secretariado para a Mobilização e Propaganda, mas também ao gabinete jurídico responsável pela verificação da legalidade dos proponentes.
“Os juristas do partido deveriam ter tido o cuidado de verificar a legalidade dos proponentes antes de submeter ao Conselho Constitucional”, frisou uma fonte bem colocada no partido Frelimo.
Falhas
Na candidatura de Armando Guebuza, foram detectadas fichas com vários nomes repetidos; números de inscrição dos proponentes no recenseamento ilegíveis; números de inscrição no recenseamento inválidos; fichas com nomes, mas sem os respectivos números de inscrição no recenseamento; fichas com registos de nomes ilegíveis; rasuras nos números de inscrição dos proponentes no recenseamento, mas sem a devida ressalva efectuada pelo notário; números de inscrição dos assinantes no recenseamento incompletos ou mal preenchidos; fichas com rasuras nos nomes de proponentes, mas sem a devida ressalva efectuada pelo notário; nomes e assinaturas sem o devido reconhecimento notarial além de fichas com impressões digitais postas com o mesmo dedo em várias ou na mesma ficha.
Dúvidas
As irregularidades acima citadas, levaram o C.C. a concluir que a natureza de certos processos de candidatura suscita dúvida quanto à autenticidade da vontade manifestada por eleitores no sentido de propor candidaturas.
O C.C. sublinhou que nos exames feitos a algumas impressões digitais e a caligrafias confirmaram a maioria das suas suspeitas, o que lhe permitiu chegar à conclusão de que em tais situações duvidosas houve efectivamente viciação intencional da vontade de eleitores que aparecem registados nas fichas como proponentes de determinadas candidaturas.
Estas e outras conclusões do CC deixaram alguns membros da Frelimo revoltados e pediram a tomada de medidas sérias contra as pessoas que estiveram por detrás da recolha de assinaturas.
Os membros da Frelimo vêem a invalidação de cinco mil processos como sendo uma grande humilhação ao partido bem como à figura do seu presidente, Armando Guebuza.
Reunião do Comité Central
Antes da publicação do Acórdão do C.C., a Frelimo já tinha marcado a quarta Sessão Ordinária do Comité Central para 20 a
O encontro tem como agenda principal discutir a preparação das Eleições presidenciais, legislativas e das assembleias provinciais, aprovação da estratégia eleitoral e do respectivo manifesto; o relatório de desempenho do governo; o plano de actividades e orçamento para 2010; relatório da comissão política à IV sessão ordinária do CC além da apresentação e discussão do relatório sobre o desempenho da Bancada Parlamentar da FRELIMO.
No entanto, o SAVANA soube de fontes próximas do partido que à última hora, incluiu-se na agenda do encontro a questão das irregularidades detectadas pelo C.C. na candidatura de Armando Guebuza. Esta matéria deverá ser aflorada no ponto que tem a ver com a preparação das eleições de 28 de Outubro.
Com vista a se inteirar do cenário que está em volta deste mal-estar, o SAVANA ouviu Edson Macuácua, na manhã desta quarta-feira, tendo este sido muito parco nas palavras, dizendo apenas que o C.C. explicou no seu Acórdão as razões que levaram o órgão a excluir certas candidaturas.
Processos na PGR
O C.C. mandou extrair cópias dos documentos apresentados pelos nove candidatos à presidência da República, naquele órgão, a fim de serem remetidos à Procuradoria Geral da República (PGR) e ao Ministério da Justiça para efeitos de procedimentos criminais e disciplinares.
O C.C. concluiu que os documentos apresentados pelos candidatos contêm vícios graves cujo tratamento atinge níveis de índole criminal, razão pela qual a PGR e o Ministério da Justiça deverão proceder à respectiva investigação.
Assim, Armando Guebuza, Afonso Dhlakama e Daviz Simango, apesar das suas candidaturas terem sido aprovadas, a documentação por este apresentada e que contém vícios, será investigada pela PGR. A medida alastra-se aos candidatos excluídos nomeadamente: Raul Domingos, Ya-qub Sibindy, Khalid Sidat, Leonardo Cumbe, Artur Jaquene e José Viana.
Entende o CC que os concorrentes, como candidatos que são à suprema magistratura da Nação exige-se não só o respeito da legalidade, mas sobretudo uma postura de ética e de seriedade, incompatível com inadmissíveis violações ou com grosseiras tentativas de contornar quer as leis, quer os procedimentos definidos e, porque em democracia o principal protagonista é o povo, é imperioso que esse protagonismo não seja frustrado através de procedimentos fraudulentos, em que eleitores são, à sua revelia, submetidos e instrumentalizados por funcionários ou por simpatizantes dos partidos ou dos candidatos.
Para o C.C., não se percebe que um cidadão que queira ascender ao cargo de Presidente da República, apresente, por exemplo, situações de inúmeras fichas com o mesmo nome aparecendo em algumas com assinatura, noutras com impressão digital e ainda noutras com a indicação de que não sabe assinar; com o nome do proponente diferente daquele que aparece no lugar da assinatura; ou com impressões digitais apostas com o mesmo dedo na mesma ou em várias fichas de proponentes; e ainda o empolamento do número de proponentes através da reprodução em série, por fotocópia, de fichas previamente preenchidas.
Fala-se ainda da falsificação de assinaturas e de impressões digitais; registo de supostos eleitores; tentativa grosseira de defraudar a lei e ludibriar o próprio Conselho com fotocópias em série de fichas de proponentes contendo os mesmos nomes e números de cartões de eleitores.
O CC alastra a responsabilidade para os funcionários dos Registos e Notariados demonstrando negligência na observância de alguns ditames legais que se impõem ao ofício de autenticação de documentos, no caso vertente, através do reconhecimento de assinaturas.
Perante este cenário, o CC entende que as condutas anómalas atrás descritas indiciam responsabilidade quer criminal quer disciplinar cuja imputação deve ser determinada em processo próprio, cabendo ao Conselho Constitucional participar prontamente as ocorrências às entidades competentes.
Alerta à navegação
Para o CC as irregularidades verificadas neste âmbito legitimam a presunção de ter havido muitos casos de eleitores registados fraudulentamente em fichas de proponentes, seja por não terem tido o devido conhecimento desse registo, seja por terem sido registados sem conhecimento exacto do propósito de tal registo ou, conhecendo-o, sem o pleno conhecimento da identidade do candidato a que destinava o seu apoio.
Inconformismo dos excluídos
Na apreciação das candidaturas, o CC detectou uma série de vícios que, grosso modo, afectam todas as candidaturas. Armando Guebuza, Afonso Dhlakama e Daviz Simango foram apurados porque, mesmo com as irregularidades conseguiram reunir as 10 mil assinaturas exigidas por lei.
Raul Domingos, Yá-qub Sibindy, Khalid Sidat, Leonardo Cumbe, Artur Jaquene e José Viana não conseguiram reunir as 10 mil assinaturas.
Reagindo a decisão do CC, o presidente do partido Independente de Moçambique (PIMO) disse que não concorda com a decisão do CC pelo facto de não ter sido notificado pelo órgão para suprir as irregularidades contidas na documentação dos apoiantes da sua candidatura.
Avança referindo que os juízes conselheiros do CC não accionaram a Lei Eleitoral no seu artigo número 135, que instrui que o presidente do Conselho Constitucional, detectadas as irregularidades na candidatura, manda notificar imediatamente o mandatário do candidato para num período de cinco dias suprir as irregularidades verificadas.
Por seu turno, o líder do Partido para a Paz, Democracia e Desenvolvimento (PDD), Raul Domingos, acusou o Conselho Constitucional de ter violado a lei.
Domingos disse esperar que o Chefe do Estado, como garante da Constituição, não fique indiferente aos actos de violação da lei fundamental do país, visto que o CC não obedeceu à Constituição e à lei.
Para aquele candidato o CC não tomou em consideração na fase de decisão de que ele mesmo tem a obrigação de respeitar a Constituição e a lei.
Terminou a sua explanação referindo que a democracia em Moçambique está em risco de extinção e que a ameaça à democracia multipartidária e competitiva tem o propósito de assegurar o regresso ao monopartidarismo.
O responsável da Aliança Independente de Moçambique, Khalid Sidat, lamentou que não tenha sido notificado para suprir as irregularidades dos seus proponentes e que vai realizar uma investigação prévia junto das brigadas do seu partido que estiveram envolvidas na recolha de assinaturas de apoio à sua candidatura para o cargo de Presidente da República para depois tomar uma decisão final.
Refere que o grande problema não está relacionado com os proponentes mas sim com a tramitação da documentação no Notário.
Yá-qub entrega-se à PGR
Yá-qub Sibindy, candidato excluído da corrida presidencial, diz que vai colaborar com a justiça com vista ao rápido esclarecimento das acusações que pesam sobre si.
Sibindy disse que, na próxima semana, vai-se entregar à PGR com vista a salvar o país. Entende Sibindy da forma como as coisas estão, Moçambique corre o risco de ter um presidente criminoso e que na sua óptica seria injusto sermos governados por uma pessoa com pendente judiciário.
O presidente do PIMO disse que vai à PGR exigir que se esclareça a sua situação bem como dos três candidatos aprovados para que estes vão à votação enquanto tem a situação esclarecida.
SAVANA – 21.08.2009