Em todos os 15 anos da história eleitoral
em Moçambique que a oposição vem se queixando de não estar a receber dos órgãos
de administração das eleições o tratamento que lhe é devido, sendo essa a causa
que agita como justificação das suas sucessivas derrotas.
Em alguns momentos tomámos essas
reclamações como típicas da narrativa de quem nunca quer admitir a sua
responsabilidade no insucesso, tentando atribuir culpas a outrem.
Mas precisamos de mudar de atitude, e
começar a olhar para os processos eleitorais em Moçambique com olhos de quem
tem benefícios a colher de um processo eleitoral íntegro, sujeito a uma
fiscalização minuciosa desde o princípio até ao fim.
O nosso envolvimento em eleições não se
pode reduzir a acordar cedo no dia da votação, ficar na fila até que chegue a
nossa vez e depois ir tomar copos e comentar com os amigos. Precisamos de nos
envolver mais a fundo, para que as eleições não sejam apenas livres e justas,
mas para que acima de tudo sejam transparentes e íntegras.
E essa integridade e transparência não se
pode esperar que sejam o fruto exclusivo do trabalho da Comissão Nacional de
Eleições (CNE) e do seu braço executivo, o Secretariado Técnico de Administração
Eleitoral (STAE), que como todos nós sabemos são compostos por seres humanos como
nós, e que individualmente têm as suas próprias preferências eleitorais.
Desde os preparativos para o
recenseamento eleitoral, passando pelo registo eleitoral, as próprias eleições
e a contagem dos votos todos precisamos de estar vigilantes. Não sendo possível
que todos os eleitores exerçam essa vigilância, poderia se esperar que eles o
fizessem através do envolvimento activo dos partidos políticos que os
representam, procurando a cada passo do processo inteirar-se detalhadamente das
actividades que estão a ser realizadas.
Mas é isto que não aconteceu nos preparativos
das eleições que estão marcadas para o dia 28 de Outubro deste ano, um processo
totalmente conduzido à margem de todos os intervenientes, que como se sabe só
começaram a emergir como cogumelos em tempo de chuva com o aproximar do fim do
prazo do seu registo na CNE.
É mesmo uma vergonha esta nossa classe
política, a qual só não pedimos o seu banimento total para que a simulação de
democracia no nosso país não desapareça para sempre.
Enquanto os partidos políticos
moçambicanos estavam no gozo das suas férias quinquenais, a CNE e o STAE
conseguiram, fora da nossa vigilância colectiva, tomar uma decisão sobre o
sistema informático a ser usado no recenseamento eleitoral e sua actualização.
Não se sabe se houve concurso público para a aquisição do referido equipamento,
como mandam as regras sobre aquisições para as instituições do Estado, não se
conhecendo também a identidade e os proprietários da empresa a quem a sorte foi
bater à porta. E com este estado de coisas não fiquemos surpreendidos se um dia
viermos a descobrir que a empresa que forneceu esse equipamento pertence a um
dos candidatos, coisa que deveria ser expressamente proibida por lei.
Não se tem memória de alguma auditoria
pública e independente ter sido realizada em relação ao referido equipamento e
respectivo software, não se sabendo se este é de fabrico caseiro ou seja o que
for.
Pelo que fomos acompanhando ao longo da
última actualização do recenseamento eleitoral, esse processo foi um fiasco,
não se sabendo se propositado ou por falhas técnicas genuínas, típicas de um equipamento
de qualidade e origem duvidosas.
Mesmo assim, e para serem consequentes
para com a sua atitude de despreocupação total em relação a processos onde
deveriam prestar uma atenção especial, nenhum dos partidos políticos veio a
público questionar o STAE, quando este órgão afirma ter atingido, e em alguns
casos até ultrapassado, a meta projectada para a actualização do recenseamento
recentemente concluído.
É no meio de toda esta nebulosidade que
nos preparamos para as eleições de 28 de Outubro, que não se duvida que serão
livres. Mas terão sido também justas, íntegras e transparentes? É duvidoso!
SAVAVA – 14.08.2009