Quer dizer, Mendes vive na lua, ou perto do satélite da terra. Um major do exército vivendo na lua A casa onde mora é uma autêntica homenagem à arquitectura, feita pelas suas próprias mãos, seguindo as indicações dos espíritos. Desenhou-a e dirigiu a sua construção, como mestre de obra e como pedreiro, pegando ele também o fio-de-prumo, as pás para amassar o cimento e erguendo a obra bloco a bloco. Hoje está ali uma construção de bom nível, espaçosa e arejada.
Quando perguntámos a Mendes quem tinha feito a planta da sua casa, que faz inveja a quem quer que seja, ele desenhou nos lábios um sorriso matreiro e respondeu: “Fui eu, porquê?”. E nós apenas lhe contra-respondemos dizendo que é pelo facto de ela ser bonita. Bem conseguida. “Isto não é nada”, prosseguia Mendes. “Se eu vos levar a verem outros sítios, outras casas projectadas e construídas por mim, vocês não vão acreditar”.
“Fui eu que fiz esta escultura”. É uma obra-prima, que merece ser vista em galerias outras. “Eu não vendo os meus trabalhos ao desbarato, ou a singulares. Eles têm que ser contemplados em lugares públicos. Uma obra de arte não pode ficar fechada em paredes pequenas”. E talvez será por isso que Mendes mantém aquele “monstro” na varanda, para que todos os seus visitantes o sintam. Fernando Mendes é um militar que está no exército desde os finais de 1974, logo depois dos Acordos de Lusaka. Esteve em Boane, onde foi afecto à Secção das Artes, por terem descoberto nele talento para isso.
“Enquanto eu fazia desenhos técnicos para o exército, fui descobrindo outras habilidades que já existiam em mim, como, por exemplo, as artes plásticas, que venho abraçando até hoje, com muito amor e carinho”. Chegámos à casa de Fernando Mendes numa manhã de quinta-feira e, para além deste lado introduziu-nos na sua sala de visitas, onde, nas paredes, tem duas cabeças embalsamadas, de animais bravios. Uma delas é de um enorme e assustador cudo. “Também sou caçador. Aprendi a caçar com os macondes, e foi bom porque me sinto homem de verdade, quando vou à caça trago carne para os militares e agora para a minha família. Tenho licença para o efeito”.
Aliás, segundo a tradição dos macondes, um homem que nunca foi à caça, não é homem, não é nada. Mas o que nos vai espantar mais ainda é a preparação de Mendes para embalsamar animais. “Aprendi com Augusto Cabral, um homem que deixou em mim marcas muito fortes na minha trajectória. Cabral tinha uma grande capacidade de trabalho e um carácter muito forte. Aprendi muito com ele”.
EXPOSIÇÃO PARA O “ 25”
Fernando Mendes pegou nas suas obras e protagonizou uma exposição na semana passada, na cidade de Maputo. Será uma espécie de retrospectiva de um percurso também registado por várias mostras nos quartéis e em alguns lugares públicos. Foi um evento concorrido - para além do público em geral - por militares e altas patentes do exército. “Estou bastante honrado por ter mostrado, uma vez mais, aquilo que faço com as minhas mãos e com a minha mente.
Tudo o que é bonito é para ser visto e eu tento mostrar aquilo que de bonito existe em mim”. Recorde-se que Fernando Mendes, no primeiro aniversário do @Verdade, celebrado no mês de Agosto, ofereceu um quadro ao nosso jornal, representado pelo director-geral, Erick Charas, a que deu o nome “A Verdade”, com uma imagem simbolizando a mulher.
“Eu ofereci-vos este quadro antes de estar emoldurado. Agora já está e levei-o à exposição. Veja só que muitos queriam comprá-lo e eu recusei a proposta porque o valor daquela obra não está no dinheiro, mas no seu significado. É o apoio moral que dou a um semanário que, sem dúvida, é do povo, para o povo”. E este é Fernando Mendes, ou uma parte do Fernando Mendes, um homem que vive na lua!
Alexandre Chaúque - @VERDADE – 24.09.2009