João Manuel Rocha
A reeleição do Presidente Armando Guebuza e a vitória da Frelimo, que governa o país desde a independência, são os cenários mais prováveis. Mas as eleições de hoje em Moçambique permitirão também perceber se os partidos tradicionais resistem ao desgaste e avaliar as possibilidades de afirmação de alternativas.
Os 9,8 milhões de eleitores são chamados a votar nas presidenciais, legislativas e provinciais e a generalidade dos observadores não equaciona uma derrota dos candidatos do partido do Governo nas eleições gerais - as quartas desde que, em 1994, foi instaurada a democracia pluripartidária, dois anos depois dos acordos de paz entre Frelimo e Renamo.
A alternativa que parecia desenhar-se com o aparecimento do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), liderado pelo prestigiado presidente da Câmara da Beira, e também candidato presidencial, Daviz Simango, ficou condicionada pela exclusão desse partido, e de 13 outras forças, da maior parte dos círculos nas legislativas. No fim, tudo como dantes: só Frelimo e Renamo se apresentam a todos os eleitores, o que reforça as possibilidades de vitória do partido governamental, face ao principal concorrente, que parece afectado pelo aparecimento do novo partido.
Criado depois da expulsão de Simango da Renamo, após uma recandidatura na Beira contra o candidato oficial do partido, o MDM, que atraiu figuras anteriormente ligadas à principal força da oposição, e tem um discurso apostado em conquistar o eleitorado jovem, chegou a ser visto como um real concorrente dos dois maiores partidos, apesar de ter pouco mais de meio ano de existência.
Mas o facto de as suas candidaturas só terem sido aceites em quatro círculos, por alegadas irregularidades formais, impede que as eleições de hoje, acompanhadas por mais de cem observadores da União Europeia, sejam um verdadeiro teste. "Os partidos não vão participar em pé de igualdade", disse ao PÚBLICO o analista moçambicano Custódio Duma.
Ciente de que, nas legislativas, com a rejeição de candidaturas na maior parte dos círculos, a tarefa do MDM se complicou, Simango, 45 anos, estabeleceu a meta de "chegar à Presidência". Esse objectivo parece distante, mas entre os cenários que se discutem em Maputo está a possibilidade de a sua candidatura obrigar a uma inédita segunda volta entre Guebuza, 66 anos, que há cinco anos obteve 63,74 por cento dos votos expressos, e Afonso Dhlakama, 56, que recolheu 31,74.
Parlamento mais plural
A possibilidade de o novo partido eleger deputados para um Parlamento até aqui inteiramente dominado por Frelimo, actualmente com 160 deputados, e Renamo, com 90, seria, por si só, um dado relevante. Uma novidade aprovada na anterior legislatura, que pode também contribuir para uma assembleia mais plural, é a eliminação da barreira de cinco por cento de votos necessários para eleger deputados.
A dimensão da abstenção é outra das incógnitas e não deixará de ter leituras políticas - se aumentar face aos 36 por cento de 2004 poderá ser vista como um indicador de descontentamento face às políticas seguidas nos últimos cinco anos num país que ocupa o 172.º lugar no índice de desenvolvimento humano das Nações Unidas e em que a esmagadora maioria da população permanece mergulhada na pobreza. A Frelimo sofre alguma erosão ou, beneficiando da debilidade do seu principal concorrente e da ausência de alternativas reais, consegue reforçar a sua implantação? A resposta cabe aos eleitores e só deve ser conhecida em meados de Novembro, quando forem oficialmente divulgados os resultados.
Para a Renamo, o que está em jogo não é menos importante. Nas três eleições anteriores, a antiga oposição armada não conseguiu nas urnas o apoio necessário para chegar ao poder. Falta agora saber como resiste ao "fenómeno MDM", depois dos 29,7 por cento das últimas legislativas. No ano passado, o partido de Dhlakama foi varrido da paisagem autárquica nas eleições municipais, perdendo as cinco câmaras que controlava, e o próprio líder, candidato à Presidência pela quarta vez consecutiva, parece consciente de que o seu tempo político pode estar a acabar. Numa acção de campanha prometeu que, em caso de derrota, não volta a concorrer e pediu aos eleitores para não votarem nele em 2014 se faltar à palavra.
Quer para Guebuza, que só poderia recandidatar-
PÚBLICO – 28.10.2009