LUÍS VILLALOBOS
Combater a pobreza e a economia informal e diversificar as fontes de criação de riqueza são os maiores desafios económicos do país
Mário Machungo, ex-primeiro-
"O desenvolvimento da agricultura, o sector dos transportes e comunicações, o sector mineiro e o turismo" são, nas palavras de Machungo, gestor e deputado da Frelimo, as "áreas que já atraem a atenção do investimento estrangeiro" e que continuarão a crescer nos próximos anos, afirmou ao PÚBLICO em declarações escritas.
Para já, ainda há muito trabalho por fazer na distribuição de riqueza. O salário mínimo em Moçambique, aplicado no ano passado em nove sectores de actividade, tem um valor máximo de 2136 meticais por mês (51,5 euros, ao câmbio actual). No entanto, como realça um estudo recente da OCDE, esta quantia "não cobre os custos dos bens alimentares de base", estimados em 3500 meticais. Este organismo internacional sublinha que 35 por cento das famílias moçambicanas são afectadas por insegurança alimentar crónica.
Moçambique tem crescido economicamente desde o fim da guerra, em 1992, mas partiu de uma base muito baixa e subiu à custa de grandes projectos de capital intensivo. Investimentos como a fábrica de alumínio da Mozal, que contam com benefícios fiscais, acabam por não criar muitos empregos, embora dinamizem sectores de actividade como os serviços e a construção. O PIB de Moçambique subiu a uma média superior a oito por cento na última década, com um abrandamento em 2008 e este ano, mas esse crescimento, como sustenta a OCDE, "continua a ser suportado pelas actividades de exportação, dominadas por megaprojectos de capital intensivo".
Em 2007, este tipo de empreendimentos subiu o seu peso nas exportações para 76,4 por cento do total, vincando a necessidade de diversificação e dinamização de reformas estruturais. A dependência destas empresas faz com que o país esteja também mais vulnerável aos choques económicos.
Ajudas dos doadores
Há dois anos, mesmo antes da crise, o investimento directo estrangeiro teve um peso no PIB de apenas 1,5 por cento, além de estar muito concentrado na área dos recursos naturais e no turismo (mesmo assim, houve uma certa descentralizaçã
Por outro lado, a economia continua a ser muito suportada pelas ajudas dos países doadores. Um relatório do BPI de Junho destaca que os donativos internacionais representam cerca de metade do Orçamento do Estado. O que, em parte, é explicado pelo facto de cerca de 80 por cento das actividades económicas serem informais.
O Estado quer simplificar a constituição de empresas e a obtenção de licenças para exercer actividade económica, bem como avançar com mecanismos ágeis para tributar os pequenos comerciantes, mas as iniciativas tardam em concretizar-
Segundo a OCDE, as empresas locais continuam a encontrar dificuldades para "aceder à electricidade, obter crédito e licenças, e a suportar os elevados impostos". O país tem um grande potencial de recursos naturais, como o carvão e gás natural, mas é fundamental que diversifique as suas fontes de riqueza e, caso se comprove a existência de petróleo, que as receitas sejam bem aplicadas em projectos como a melhoria das infra-estruturas, transportes, educação e saúde. Estão em curso programas de recuperação de estradas e de melhoria dos principais portos, o que, como destaca a OCDE, é necessário para uma melhor integração das zonas agrícolas do Norte. Na produção de electricidade, Moçambique pode assumir-se como um importante abastecedor local, principalmente da África do Sul, e está a desenvolver novos projectos como a hidroeléctrica de M"panda Ncua, mas falta electrificar o país.
Classe média
Mário Machungo afirma que os investimentos nos sectores com mais potencial só terão impacto na criação da riqueza nacional e na redução da pobreza se se promover o crescimento de PME "que criem mais e novos postos de trabalho, alarguem o consumo doméstico e criem uma classe média que seja o esteio a um desenvolvimento sustentável da economia".
Para isso, diz, é necessário que se alarguem as acções de formação dos recursos humanos, "sobretudo a formação técnico-profissional que estimule o espírito empresarial e a iniciativa privada, domínios em que os parceiros estrangeiros podem desempenhar um papel importante".
Channing Arndt, professor de Economia da Universidade de Copenhaga, afirmou ao PÚBLICO, com base num texto, The promise of Mozambique, que irá publicar no The Oxford Companion to the Economics of Africa, que existem cinco grandes prioridades para Moçambique: criação de emprego (estabelecimento de empresas exportadoras com mão-de-obra intensiva, podendo concorrer com outros mercados através do baixo custo do trabalho); novas infra-estruturas públicas (em vez de apenas reabilitar as obras feitas no passado); população (maior controlo do crescimento)
Na agricultura, o Presidente Armando Guebuza tem apostado na "revolução verde", com o objectivo de eliminar o défice dos principais produtos alimentares do país, como milho, arroz, gado de corte e pescado, e desenvolver culturas como o trigo e produção em larga escala de mandioca. A ideia, como afirmou à revista da KPMG, é aumentar a produção agrícola, "canalizando-
A pobreza é, sem dúvida, o alvo a abater nos próximos anos, mas para isso será necessário agir de forma concertada em várias frentes.
PÚBLICO – 28.10.2009