No artigo anterior Robert Mugabe – Trajecto político (I) escrevi sobre o percurso político de Robert Mugabe até à sua ascensão ao cargo de 1º Ministro da República do Zimbabué, proclamada em 18 de Abril de 1980.
Mugabe ascendeu já ao poder.
Vamos continuar a observar a sua caminhada política.
1980 (continuação)
Roberto Mugabe acordara com o Reino Unido a manutenção de um sistema parlamentar multipartidário, pelo menos durante 10 anos, e uma maioria de 80% necessária para poder proceder a reformas/emendas à Constituição.
Dá mostras claras de pragmatismo político:
- Mantém como chefe do exército o general Peter Walls, ele que o tinha combatido, a fim de se fazer a integração dos guerrilheiros nas Forças Armadas do Zimbabué, caracterizadas pela sua diversidade étnica.
Peter Walls mantém o cargo até Agosto, do qual se demite, concluído que dá o processo.
- É substituído por um outro oficial britânico, ou de origem britânica.
Ciente das realidades porque passaram outros países africanos, que expulsaram/hostilizaram os cidadãos de origem europeia, procurou salvaguardar a sua permanência no país – incluiu mesmo alguns brancos no seu governo de coligação.
O reconhecimento da competência, a patente eficiência das explorações agro-industriais, o interesse em atrair mais capital estrangeiro, a multi-etnicidade do país, o respeito pela propriedade privada, estancaram a emigração dos cidadãos de origem britânica/outros, que diminuiu acentuadamente.
Em contraponto, entrou em colisão com alguns ministros do governo de coligação, entre eles Joshua Nkomo, seu antigo aliado na guerra de guerrilha, ZAPU.
A FP (Frente Patriótica) junção da ZAPU com a ZANU, que tinha mostrado bons resultados durante a guerra contra o regime de Ian Smith, estava posta em causa.
Estes partidos tinham resolvido concorrer separadamente às eleições de Fevereiro, cujos resultados tinham dado a maioria absoluta à ZANU de Mugabe, com a obtenção de 57 dos 80 lugares no Parlamento, isto é, com 62,9% dos votos.
À postura cuidadosa, realista, tolerante com os cidadãos de origem britânica,
Mugabe empenha-se numa política étnico/tribalista, como forma de assegurar/conquistar uma sólida base de poder entre os cidadãos negros.
Estava criado o fosso entre a maioria Shona, e a minoria Ndebele (cerca de 16% da população, com origem Zulu, chegados ao Zimbabué no sec XIX), e base de sustentação da ZAPU de Joshua Nkomo, ele próprio um Ndebele.
1981
Rebentam combates em Bulawayo, Fevereiro 1981, entre as tropas de Mugabe e Nkomo.
1982
Abril, Joshua Nkomo é destituído de ministro sem pasta, função a que sido rebaixado por Mugabe, em Janeiro de 1981, rompendo-se a coligação até então existente.
A guerra civil aumenta de intensidade, e generaliza-se quando a ZAPU resolve abandonar as FAZ (Forças Armadas do Zimbabué), e se acantonam na Matabelelândia, seu bastião étnico, recorrendo a uma guerra de guerrilha.
1983
Mugabe responde com várias ofensivas de peso em fins 1983.
E desencadeia a tristemente célebre operação Gukurahundi, assim baptizada por ele, que em sua própria língua, Shona, se traduz - as primeiras chuvas que limpam os vestígios de milho antes de uma nova colheita.
Estava dado o mote.
Segue-se a repressão impiedosa, agora assumida pela V brigada do ZANLA (Zimbabwe African National Liberation Army), integrada exclusivamente por soldados Shona, da ZAPU, treinada e enquadrada por soldados/oficiais da Coreia do Norte, que dirigem e procedem ao arrasamento de centenas de povoações, com vítimas mortais na ordem dos
1987
Os massacres acabaram apenas em 22 Dezembro 1987, quando Mugabe e Nkomo, que capitulou, chefes do ZANU e ZAPU, respectivamente, assinaram o Acordo de União, e fundem os partidos no ZANU-PF, que passou a ser dominado integralmente por Mugabe – assumindo assim o acalentado partido único, com cunho cariz marcadamente autoritário, centrado nele próprio.
Baseado nos resultados eleitorais para o parlamento, 1 Julho 1985, em que a ZANU obtivera 64 lugares, e a ZAPU 15, e também no referendo de 19 Agosto 1987 cujos resultados apontaram para a supressão dos 20 lugares consagrados à minoria de origem britânica, Mugabe consegue, deste modo, a obtenção da maioria suficiente para moldar a Constituição à sua imagem, com emendas datadas de 21 Setembro.
Em 29 Setembro é instaurado o regime republicano presidencialista.
Estão assim reunidas todas as condições para a entronização de Mugabe, que em 31 Dezembro de 1987, sem oposição, sem contestação, é escolhido para presidente do Zimbabué, agora já com plenos poderes executivos, em substituição de Canaan Banana, que apenas tivera poderes meramente simbólicos, como já vimos no capítulo anterior, enquanto Mugabe fora 1º Ministro.
Mugabe procede à abolição do posto de 1º Ministro, e fica ainda com a prerrogativa de eleger 12 dos 150 assentos do sucedâneo Parlamento.
A concentração de poder nas suas mãos é um facto irrefutável, com um cariz vincadamente fascista.
Umbhalane – 23.10.2009