MARCO DO CORREIO
Por Machado da Graça
Olá amigo Jerónimo
Como estás de saúde? Eu estou bem.
Estou-te a escrever ao mesmo tempo que ouço, na rádio, uma entrevista com uma responsável do Ministério da Educação, sobre os maus resultados que se estão a registar nos presentes exames escolares.
E, antes de entrar directamente nos vários temas abordados, gostava de te chamar a atenção para uma coisa. Seja qual for o dirigente daquele ministério
que seja entrevistado, sejam quais forem os resultados escolares, não ouvimos uma única autocrítica, não ouvimos ninguém a admitir que as coisas estão mal e
é necessário arrepiar caminho.
E mesmo quando se volta para trás numa decisão, isso é feito quase em segredo.
Dou-te o exemplo da correcção automática dos exames da 12ª. Classe.
Foi introduzida com tambores e trombetas a anunciar que ia ser uma enorme melhoria. Correu muito mal. Pode-se dizer que foi um autêntico desastre.
Agora o sistema foi abandonado mas sem nenhum dos tambores ou trombetas. Uma notícia simples e seca e passemos adiante.
Quanto terá custado ao país, em termos de preço de equipamentos e em termos de alunos formados, este falhanço? Isso ninguém nos diz. São assuntos varridos para baixo do tapete.
Agora temos a questão das passagens automáticas de classe. E os resultados são, novamente, de pôr os cabelos em pé. Crianças que chegam à 5ª. Classe sem saberem ler nem escrever o seu próprio nome.
Mas, sempre que são confrontados com essa realidade, os dirigentes da Educação continuam a refugiar-se em frases vazias de significado, do tipo:
Estamos a trabalhar nessa questão, estamos a fazer um esforço, o assunto está a ser tratado.
E logo surgem desculpas, tais como referir que o mesmo método é também usado em outros países, mesmo entre os mais desenvolvidos.
O que se esquecem de dizer é que, nesses países, as turmas têm 30 alunos, em vez dos nossos 80. Que os professores têm boa formação e boas condições de vida, em vez dos nossos sem condições na escola e muito menos em casa.
Os dirigentes da Educação negam sempre que todas estas medidas sejam apenas para engordar as estatísticas, mas a verdade é que salta à vista que não é outro o objectivo.
Já ouvi um deles a dizer que levar os alunos para as escolas é para respeitar um dos seus direitos humanos. Mas que respeito é esse se eles vão para a escola e nada aprendem enquanto lá estão?
Alguém comentava que mais grave do que não lhes ensinar a ler e escrever é não lhes ensinar sequer a pensar. E eu concordo com isso.
E outra coisa que nos deve preocupar e saber quais as consequências disto tudo no futuro do nosso país. Qual vai ser a contribuição destes milhões de alunos pessimamente preparados, quando chegarem ao mercado de trabalho ou a níveis mais altos do ensino.
Porque não se julgue que se pode recuperar, no secundário, um aluno que lá chega sem saber ler nem escrever. Sem saber nada de nada.
Não consegue. E, se se lhe consegue transmitir alguma coisa e fazê-lo avançar, classe a classe, vai ser um aluno com um mau ensino secundário que, talvez, um dia vai bater às portas do ensino superior.
E o problema da má qualidade vai subindo por aí acima, tornando-se num cancro que corrói todo o sistema e, consequentemente, todo o país.
Consciente ou inconscientemente, é para aí que estamos a ser empurrados, embora ninguém o queira reconhecer.
E isso, como podes imaginar, vai-se pagar muito caro num futuro já não muito distante.
Quando, de forma generalizada, tivermos maus médicos, maus operários, maus académicos, maus agrónomos, maus advogados, maus isto e maus aquilo.
Quando as coisas deixarem de funcionar ou funcionarem deficientemente, iremos chamar nomes a estes dirigentes da Educação de hoje, mas já será tarde. O mal estará feito e vai levar gerações a emendar.
Tudo isso porque hoje, com falta de modéstia, nos recusamos a aceitar que as coisas não estão nada bem e precisam de ser, urgentemente, corrigidas.
Um abraço para ti do
Machado da Graça